Só 5%. A popularidade do presidente Michel Temer atingiu seu nível mais baixo em julho, segundo a pesquisa Ibope de avaliação do governo. Em dezembro, 13% dos entrevistados consideravam o governo Temer ótimo ou bom. Em março, 10% e agora, apenas cinco a cada 100 pessoas têm coragem de defender o peemedebista. O irônico é que muitas delas estavam ontem na Câmara dos Deputados, eleitas pela população, porém contrariando seus anseios.
Os números chamam atenção e são ótimos para compreender a distorção representativa que existe no Congresso Nacional. Na última quarta-feira (2), o plenário da Câmara rejeitou por 263 votos a 227 a denúncia contra Temer. Salvaram a pele de um presidente que cometeu, ao autorizar a compra do silêncio de Eduardo Cunha, o mais grave crime da história da República feito por um chefe de Estado. Essa é a opinião do historiador Lincoln Secco, colunista da Revista Brasileiros:
“Nem Collor, nem Dilma caíram por um crime deste nível, gravado. Talvez seja comparável ao caso das cartas falsas atribuídas ao presidente Artur Bernardes na República Velha e que provocaram uma crise militar e o início do movimento tenentista. Mas elas eram falsas”, afirmou em junho, na mesma semana do vazamento dos áudios. o professor do Departamento de História da Universidade de São Paulo (USP).
A denúncia sem precedentes que se abriu com a divulgação dos áudios, ainda antes do recesso parlamentar de julho, no entanto, foi neutralizada. Bem como no livro de Gabriel García Márquez, Crônica de uma Morte Anunciada, todos nós sabíamos que o período da noite reservaria um assassinato: mais uma morte da esperança que os brasileiros tinham em livrar-se de um governo que não foi submetido às eleições e que leva todos os dias o País ao caminho do desemprego, dos cortes, do desespero.
A obra de García Márquez conta, na forma de uma reconstrução jornalística, a história do assassinato de Santiago Nasar pelos irmãos Vicário. Acusado por Ângela Vicário de tê-la desonrado, o jovem Nasar foi morto a facadas pelos irmãos de Ângela, os gêmeos Pedro e Pablo. Toda a vizinhança fica sabendo antes da vingança, mas nada salva Santiago do trágico destino, anunciado logo na primeira linha do romance.
Um romance, uma ficção. Foi isso que aconteceu a cada depoimento proferido pelos deputados que negaram a admissibilidade da investigação contra Temer. O incrível trabalho de fact-checking que a Agência Lupa fez em tempo real no Twitter deu conta de desnudar algumas mentiras. Enquanto acontecia a votação de arquivamento da denúncia de Temer, a cada voto proferido, a Lupa postou o valor liberado por Temer em emendas para o parlamentar.
A língua portuguesa ainda não deu conta de definir o sentimento que é não ter esperanças, nem expectativas, e mesmo assim ficar decepcionado. Mais de 40% dos votos em Temer foram feitos por parlamentares investigados pelo Supremo Tribunal Federal (STF). É por isso que todos já sabiam: as cartas estavam marcadas, as emendas acertadas e o nosso futuro, negociado.
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