O conhecimento mais profundo das funções do cérebro e do modo como as suas diversas áreas se comunicam e trabalham em conjunto é um dos campos de maior interesse da ciência. Nessa busca por desvendar os mistérios do cérebro, um dos maiores desafios enfrentados pelos neurocientistas era desvendar a arquitetura do córtex, a parte mais externa do órgão. É uma região muito rica em neurônios e um local de processamento de informações altamente sofisticado, mas com anatomia muito semelhante, o que confundia os pesquisadores na tarefa de compreender as suas subdivisões.
Nesta quarta-feira (20), essa limitação foi finalmente superada pela ciência. O feito é de um grupo de neurocientistas das universidades de Washington em Saint Louis, nos Estados Unidos; de Oxford, no Reino Unido e Nijmegen, na Holanda. Em artigo publicado na renomada revista Nature, eles anunciaram a descoberta de mais de 180 módulos cerebrais até então desconhecidos. Cada hemisfério cerebral concentra cerca de 97 deles, segundo o trabalho publicado. O trabalho também confirmou a localização de 83 áreas já identificadas anteriormente.
O avanço foi possível por causa de um novo conceito que associa três critérios para examinar o córtex – a sua microarquitetura, a conectividade e a funcionalidade das áreas. A partir dessa ideia, os pesquisadores desenvolveram um software para guiar exames de ressonância magnética funcional (fMRI) feitos com aparelhos de última geração reunidos pelo Projeto Conectoma Humano, iniciativa financiada pelo governo americano por meio do National Institutes of Mental Health (NIMH). Segundo os cientistas, durante os exames, os algoritmos inseridos no software permitiram mapear até mesmo áreas localizadas de maneira atípica em alguns indivíduos.
Até então, a maioria dos estudos usava apenas uma medida por vez e, em geral, para observar o tecido cerebral retirado de doadores já mortos. Por isso, os processos de investigação levavam, por vezes, a uma dificuldade para confirmar os achados científicos em razão da variabilidade dos dados a serem comparados.
“A situação é análoga à da astronomia, em que telescópios terrestres produziam imagens relativamente obscuras do céu antes do advento da óptica adaptativa e telescópios espaciais”, disse Matthew Glasser, da Universidade de Washington em Saint Louis, o principal autor do estudo.
Para testar o novo método, os pesquisadores submeteram 210 voluntários saudáveis ao exame. Os dados obtidos foram confirmados em outro grupo de 210 pacientes, também livres de doenças.
Impacto na cirurgia e na pesquisa
O novo mapa do córtex reúne informações preciosas. Mostra, por exemplo, as variações individuais e a atividade das diversas áreas envolvidas no processamento da informação visual. Entre muitos achados, o estudo localizou também uma área ligada à linguagem até agora ignorada.
Os pesquisadores afirmam que a descoberta terá um papel importante na neurocirurgia, para o estudo e tratamento de doenças e sequelas neurológicas e ajudará também a investigação sobre a evolução da mente humana.”Essas novas percepções e ferramentas devem ajudar a explicar como nosso córtex evoluiu e os papéis de suas áreas especializadas na saúde e na doença. Podem ser uma promessa sem precedentes para diagnósticos clínicos e cirurgias cerebrais”, disse Bruce Cuthbert, Ph. D., diretor interino do Instituto Nacional do NIH de Saúde Mental (NIMH). E mais: à luz dos novos dados, os cientistas acreditam que podem existir ainda mais subdivisões.
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