Sua casa, assim como a da maioria dos brasileiros, está repleta de embalagens plásticas. Uma estimativa da Datamark para 2015 calcula que cada um de nós consumirá, em média, 16 quilos de plástico durante o ano, um total 47% superior ao consumo registrado em 2007.
Plásticos se tornaram presença constante na Europa e nos Estados Unidos após a Segunda Guerra Mundial e, nas casas brasileiras, especialmente a partir dos anos 1980. Foram razões econômicas e industriais (eles eram mais leves e mais fáceis de produzir) que o tornaram uma opção popular para a embalagem de alimentos.
Desde então, o consumo de plástico tornou-se sinônimo de desenvolvimento econômico e a presença do material nos lares não parou de crescer. Nem tudo, porém, são boas notícias. Por trás da versatilidade e do baixo custo que catapultaram seu uso, pairam ainda incertezas sobre a segurança do plástico para os seres humanos.
Suspeita-se que várias das partículas que fazem parte da composição dos plásticos atuem como desreguladores endócrinos, substâncias capazes de interagir com o organismo e que podem causar doenças.
“Os desreguladores endócrinos imitam os hormônios que naturalmente controlam o funcionamento do nosso corpo. E há indícios de que essas substâncias químicas possam agir por outros mecanismos”, alertou em entrevista a Saúde!Brasileiros Teresa Attina, pesquisadora da Universidade de Nova Iorque que há vários anos dedica-se aos efeitos dos plásticos sobre a saúde. “Alguns dos efeitos adversos sobre a saúde que podem ter relação com a ação dessas substâncias são o declínio no número de espermas, obesidade e diabetes”, diz Teresa.
Onde mora a dúvida
Quando se fala em incerteza sobre a segurança no uso dos plásticos, o composto mais lembrado, certamente, é o bisfenol A (BPA). Você provavelmente vai se lembrar das manchetes alertando para a proibição pela ANVISA da venda de mamadeiras contendo esse composto, em 2011, seguindo medidas semelhantes adotadas na União Europeia e nos Estados Unidos.
A decisão foi tomada após pressão social em vários países, originada pela divulgação de estudos que colocaram em cheque a segurança do material para humanos. Pelo sim, pelo não, optou-se por banir o composto dos produtos infantis.
Recentemente, o mesmo componente voltou a gerar manchetes na Europa. Desta vez, por seu uso nos comprovantes de compra no supermercado. O alerta foi dado pela Anses, espécie de Anvisa francesa. De acordo com o órgão, a presença do composto nas notinhas de compra pode expor os funcionários dos caixas a doses maiores que o recomendado de bisfenol. A França também iniciou neste ano o banimento do uso do bisfenol A de todas as embalagens e utensílios de consumo, não apenas aqueles destinados ao público infantil.
Após o alerta francês, a Agência Europeia para Químicos (ECHA, na sigla em inglês), órgão da União Europeia dedicado a avaliar os componentes químicos, estuda agora uma recomendação para toda a União Europeia sobre o uso de bisfenol nas notas de supermercado, semelhante ao que foi feito com as mamadeiras. A decisão está prevista para dezembro deste ano.
Tudo isso ocorreu poucos meses depois que a Entidade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA, na sigla em inglês), publicou uma reavaliação sobre o bisfenol A declarando serem seguros os níveis médios aos quais estamos atualmente expostos. Na mesma nota, porém, a EFSA recomendou uma redução do limite máximo usado para calcular a ingestão diária de BPA. O total passou de 50 microgramas por quilo de massa corporal (µg/kg) para 4 µg/kg.
“É preciso lembrar que o bisfenol não está só no plástico. Em alimentos enlatados, o verniz interno que cobre a lata também tem bisfenol. A água também pode ter bisfenol. Alguns papéis térmicos também podem conter bisfenol. Por isso, deve-se ter muito cuidado ao determinar uma dose mínima de exposição para as embalagens, porque as vias de contaminação são múltiplas”, alerta a médica Tânia Aparecida Sanchez Bachega, que preside uma comissão sobre desreguladores endócrinos na Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (leia entrevista completa aqui).
Nem tão seguro
Além do bisfenol, outros compostos dos plásticos também estão “em observação” no mundo científico, sob suspeita de que façam muito mais do que embalar os alimentos ou servir de matéria-prima para a produção de brinquedos e outros utensílios. Os ftalatos, por exemplo, assim como o BPA, são considerados desreguladores endócrinos. Um dos usos comuns deste componente é no popular filme PVC usado para embalar alimentos.
Recentemente, Teresa Attina esteve envolvida em uma análise sobre a segurança dos compostos DINP e DIDP, ftalatos usados como substitutos para o DEHP, outro ftalato atualmente considerado perigoso para a saúde humana. A pesquisa, publicada em julho, observou que quanto mais altas as concentrações de DINP e DIDP no corpo, maiores eram as chances de as pessoas apresentarem aumento da pressão sanguínea.
No grupo mais exposto foram encontrados 2,2% mais casos de pré hipertensão. É preciso notar que a metodologia da pesquisa permite observar que as duas coisas ocorreram concomitantemente, sem, no entanto, estabelecer uma relação de causa-efeito entre elas.
Para Attina, ainda assim os resultados são importantes, uma vez que indicam que as “opções seguras” podem não ser assim tão seguras quanto imaginado. “As evidências que já temos, incluindo nosso estudo, mostram a necessidade de se testar a toxicidade dessas substâncias antes de seu uso tornar-se generalizado”, fala a pesquisadora.
Na Europa, a ECHA estabeleceu uma concentração máxima de DINP e DIDP em produtos destinados a crianças que podem ser levados à boca. Os compostos não podem representar mais que 0,1% do peso total do brinquedo. A mesma restrição foi determinada no Brasil em 2007, pelo Inmetro.
“A grande dificuldade, não só do Brasil, mas de todas as agências regulatórias, é estabelecer esse limite de exposição segura”, explica Tânia Bachega. “Naturalmente, nosso corpo produz pequenas doses dos hormônios de que necessita para controlar e regular o metabolismo. No caso dos desreguladores endócrinos, estudos em laboratório mostram que ocorre o mesmo. Ainda que em pequenas doses, eles produzem efeito”, diz a médica.
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