A garota prodígio das artes

Venho de uma família sem interesse algum por arte. Meu pai era fazendeiro e, quando fiz 10 anos, o presente de aniversário que pedi a ele foi que me matriculasse em uma escola de artes. A paixão foi aumentando e entrei na Faap, com 18 anos, para estudar artes plásticas. Lá me formei, mas, durante o curso, comecei a trabalhar como arte-educadora, e morei um ano em Paris. Fiquei encantada com os museus de lá, repletos de crianças em visitações de escolas. Como trabalho de final de curso, nosso grupo propôs a criação de um projeto educativo para o MAC USP, e conseguimos implantá-lo – baseados no projeto da Pinacoteca, assinado pelo Paulo Portella Filho, nosso grande mestre. Trabalhei também para a Bienal, como monitora, e fiquei cinco anos no MAC, na ocasião em que a Aracy Amaral era a diretora. Tive a sorte de estar perto de grandes mestres, como a Aracy e o Walter Zanini, e vivenciar um grande momento da Faap. Cansada de trabalhar para museus e para a Bienal, fui pedir emprego na Raquel Arnaud, que era a galeria de que eu mais gostava. Trabalhei com ela por aproximadamente seis anos, e fui aprendendo como funcionava o mundo do mercado da arte, até que, no começo dos anos 1990, decidi começar uma carreira independente. Saí da Raquel, e fui trabalhar sozinha, fazendo minhas primeiras negociações, orientando colecionadores e realizando parcerias com artistas.

Em 1997, trabalhava em parceria com o Fabio Cimino. Fizemos juntos algumas compras e vendas, e decidimos abrir a Galeria Brito Cimino, com nossos quatro primeiros artistas, Nelson Leirner, Regina Silveira, Ana Tavares e Mônica Nador – todos colegas de Faap, Nelson e Regina, professores, Ana e Mônica alunas como eu. Assim começou a galeria: com esses artistas maravilhosos, muito trabalho, uma pequena carteira de clientes, alguma experiência de vendas, e bastante vontade de que a coisa desse certo. Nossa primeira exposição foi com a Rochelle Costi e o Leonilson. Depois, passamos a representar o Caio Reisewitz, o Eder Santos, o Geraldo de Barros e o Waldemar Cordeiro. Em 2000, foi necessário mudarmos para um espaço maior, e fizemos um belo projeto para essa nova galeria, assinado pelo José Armênio de Brito Cruz, do escritório Piratininga. Foi muito legal, pois, logo após a inauguração, várias galerias passaram a chamar arquitetos para assinar projetos e adequar seus espaços. Antes mesmo dessa mudança de sede, já em nossos primeiros dias, em 1997 e em 1998, começamos a participar de feiras internacionais. Fomos à ARCO, à Art Basel e à Miami Art Basel, e foi uma experiência muito rica de aprendizado. Entramos nesse mercado com o Nelson Leirner, a Regina Silveira, o Geraldo de Barros e a Ana Tavares. Houve um boom de feiras nesse período, e participamos de muitas delas. Isso também nos permitiu trazer artistas internacionais para a galeria, como os argentinos Liliana Porter e Leandro Erlich, o americano Allan McCollum, e agora, mais recentemente, a iugoslava Marina Abramovic.
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Há dois anos, eu e Fábio nos separamos e a galeria ganhou meu nome, mas temos ainda os mesmos artistas e o mesmo perfil de atuação. Representamos artistas que são pesquisadores e professores, e o galerista também precisa pesquisar o tempo todo. Há sempre o que descobrir. Acabei de conhecer na Bienal o artista da Turquia Kutlug Ataman, que tem um trabalho muito bom. A Bienal está belíssima e demonstrou grande capacidade de renascimento. A quantidade de público internacional que tem prestigiado a Bienal comprova que a arte brasileira vive um momento importante. O público brasileiro também têm sido muito expressivo. Prova maior são as escolas, que invadiram a Bienal. Acho ótimo. Temos mais é que levar nossas crianças. É a educação deles e a formação de público das novas gerações que estão em jogo. O Brasil tem uma produção maravilhosa, e o galerista tem o compromisso de defender a arte brasileira. Esse, talvez, é seu principal desafio como “arte-educador”. Não só vender arte, mas também mostrar ao público a força dessa linguagem universal. Essa é uma profissão apaixonante e, se pensarmos que os museus internacionais quase não têm obras de artistas brasileiros, que só agora os colecionadores estão começando a comprar obras de artistas brasileiros, é fato que temos muito a fazer. Em termos de história da arte mundial, começamos a engatinhar com a divulgação da arte brasileira. Há muito chão pela frente, e isso é algo muito legal e estimulante de se pensar. As próximas gerações de galeristas, curadores e editores vêm por aí com a sorte e o desafio de ter muito a fazer por nossa arte.


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