Fotos Luiza Sigulem
Um retrato de casamento, um álbum de fotos de uma viagem, uma câmera que registrou momentos felizes da história de alguém. Objetos que um dia tiveram valor inestimável hoje terminam esquecidos em mercados de pulgas, a espera de um comprador que os reavivem e que os tornem novamente importantes na vida de uma pessoa.
Esse é o papel de Rosângela Rennó, artista brasileira que há mais de duas décadas se dedica a adquirir objetos “esquecidos” ao redor do mundo para restaurá-los e revendê-los. Foi a partir desta ideia que a artista mineira criou, junto da Editora Cosac Naify, o projeto Menos-valia [leilão], uma seleção de 73 peças que foram expostas e posteriormente leiloadas na 29ª Bienal de São Paulo, realizada em 2010.
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O valor arrecadado com as obras permitiu que Rosângela concluísse o projeto com o lançamento do livro e “dividisse o bolo” como todos os que têm interesse no trabalho e não apenas com os que adquiriram as peças. A obra foi lançada em um evento realizado pela Cosac Naify na tarde do último sábado, dia 2, na Galeria Vermelho, em São Paulo.
“Eu concordo com [Marcel] Duchamp de que a obra de arte só se completa com o espectador. Eu faço apenas o gesto inicial”, explicou ela, em bate-papo que contou com a presença do crítico e historiador mexicano Cuauhtémoc Medica e do curador e crítico brasileiro Moacir dos Anjos, responsável pela realização do leilão das obras de Rosângela na 29ª Bienal de São Paulo.
“Eu queria que o livro fosse o fechamento do leilão, o momento em que o bolo fosse repartido com todos, e não apenas com aqueles que adquiriram as obras”, completou a artista, deixando claro que o novo livro é peça chave no processo de criação iniciado para a ocasião da 29ª Bienal. A obra chega em duas edições: uma versão comercial e uma edição limitada a apenas 300 exemplares que vem acompanhados de dois compactos de vinil com gravações do leilão das peças.
“Cada objeto que Rosângela colocou no projeto pertenceu a um ser, teve uma história. Os mercados de pulga são onde essas histórias acabam. O projeto é uma forma de impedir que estes objetos e momentos sejam esquecidos para sempre”, disse Cuauhtémoc no bate-papo que atraiu diversos admiradores e pesquisadores de arte contemporânea à galeria de arte paulistana.
Para Moacir dos Anjos, o trabalho de Rosângela resgata o costume de manter estes objetos e desperta nos colecionadores a atenção para a história por trás de cada obra. “Há uma desistência de guardar as fotos de forma analógica, pois o digital tornou-as obsoletas’, explica ele. “O desejo pelo objeto esquecido faz reativar o desejo de tê-lo. O leilão das obras agrega valor ao desejo que os objetos possuem.”
Com intensa participação do público, o debate suscitou questões diversas sobre o projeto, o leilão e o papel da arte no espectro mercantil. Ao falar sobre a verba arrecada com a venda dos objetos, Rosângela revelou ter aplicado parte considerável da quantia na produção do livro. “A grande satisfação que eu tenho como artista é que hoje eu sou uma fabricante de livros”, disse a artista durante o debate. “Meu leilão é pop porque os objetos são pop”, explicou.
Parte dos objetos leiloados foram adquiridos pela própria Galeria Vermelho, que agora exibe a exposição Menos-valia [leilão] até o dia 16 de fevereiro. O espaço funciona de terça a sexta das 10h às 19h e aos sábados das 11h às 17h.
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