Caravaggio e seus seguidores

Medusa, de Caravaggio, inspirou o brasileiro Vik Muniz a interpretar uma das obras mestes do grande artista renascentista

Com investimentos de R$ 3,5 milhões e dois anos de planejamento, chega ao Brasil a primeira exposição com obras do artista plástico italiano Michelangelo Merisi da Caravaggio (1571-1610), no MASP de 26/7 a 23/9, depois de passar por Belo Horizonte. Idealizada por Rossella Vodret, especialista em Caravaggio na Itália e chefe da Superintendência Especial para o Patrimônio Histórico, Artístico e Etnoantropológico e para o Polo Museológico da Cidade de Roma, a mostra traz sete importantes obras do artista e um conjunto expressivo de trabalhos de seus seguidores, na segunda metade do século XVI e início do século XVII, como Artemisia Gentileschi (1593-1653), Bartolomeo Cavarozzi (1587-1625), Giovanni Baglione (c.1566-1643), Giovanni Battista Caracciolo (1578-1635) e Hendrick van Somer (1615-1684/85), entre outros.

Ainda que seja uma pequena amostragem dos quadros de Caravaggio, o público terá a oportunidade rara de conhecer períodos diversos de sua produção e confrontá-los com as ressonâncias técnicas e temáticas em criadores do mesmo período, testemunhando sua influência e o diálogo artístico intenso que provocou na história da arte ocidental a partir do uso do chiaroscuro, recurso que explora o jogo entre luzes e sombras na tela para realçar os aspectos trágicos da cena.

Um dos artistas brasileiros mais influenciados pela obra de Caravaggio foi o catarinense Schwanke. À direita a Deposição de Cristo, 1604, óleo sobre tela, foi incorporado em uma de suas instalações

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Entre as obras de Caravaggio presentes na exposição e que já fazem parte do imaginário estético das gerações de seu tempo até os dias de hoje, estão São Jerônimo que Escreve (San Girolano che Scrive), óleo sobre tela de 112 cm x 157 cm, e escudo com Cabeça de Medusa (Medusa Murtola), óleo sobre tela de linho sobre um escudo de madeira de álamo, com 44,68 cm de diâmetro. Não resta dúvida de que a Medusa é uma das peças que mais causam releituras dos artistas plásticos da atualidade, inclusive brasileiros, por sua composição densa e sintética, carregada de violência e horror, no olhar paralisado da morte, o arranjo simétrico e o modo como as cores reproduzem o reflexo da besta que contempla a si mesma.

Destacam-se entre os seguidores de Caravaggio presentes na mostra o impressionante quadro Madalena Desmaiada (Maddalena Svenuta), óleo sobre tela de Artemisia Gentileschi, que retrata a figura feminina com os seios desnudos, cabeça arqueada para trás, segurando uma caveira na altura do púbis. A imagem é forte e tem um conteúdo erótico surpreendente e provocador, especialmente se considerado o momento em que foi produzida. Ecce Homo (Cristo Escarnecido ou Homem das Dores), óleo sobre tela de Giovanni Baglione, datado do início do século XVII, também exemplifica como a técnica do chiaroscuro imprime dramaticidade ao desenho, enfatizando o sofrimento de Jesus, entre a fragilidade humana e o traço de divindade.

A curadoria da exposição no Brasil é do crítico de arte Fabio Magalhães, que ressalta a criativa apropriação do legado de Caravaggio por artistas brasileiros, como Vik Muniz, cuja versão da Medusa em grandes dimensões e com utilização de sucata se tornou um marco em sua trajetória; Alex Flemming, com referência à figura de Narciso; Gilberto Salvador, também recorrendo à imagem mitológica da Medusa; e as obras de Luiz Henrique Schwanke (1951-1992), que na opinião do curador: “Foi o que melhor trabalhou os temas caravaggistas e o problema da luz”.

Giorgio Leone, responsável pela curadoria da exposição na Itália, explica que o conjunto de quadros de Caravaggio que estão no Brasil representa “uma oportunidade ímpar, pois das obras produzidas pelo grande mestre italiano durante seus 39 anos de vida, apenas 62 chegaram aos nossos dias, portanto, os visitantes apreciarão dez por cento da produção do artista”.

A vinda da exposição Caravaggio e seus Seguidores ao Brasil foi patrocinada pela Casa Fiat de Cultura e Bradesco. Segundo José Eduardo de Lima Pereira, presidente da Casa Fiat: “Dos grandes nomes da arte italiana, Caravaggio talvez seja aquele em que paira a mais densa aura de mistério, não apenas pelas peripécias que marcaram sua vida, mas também pelo destino trágico da maior parte da sua obra, desaparecida”. Pereira se refere à vida tumultuada, repleta de brigas e problemas financeiros de Caravaggio, conhecido por seu temperamento explosivo, tendo sido, inclusive, acusado de matar um jovem. O fato o obrigou a fugir de Roma e peregrinar por cidades italianas como Nápoles, Malta e Sicília, locais em que novamente se envolveu em novas confusões. A vida breve e tumultuada, porém, não o impediu de realizar uma obra inovadora e que, ao longo do tempo, permanece como referência estética para artistas, críticos e público.

Estão previstas atividades paralelas à exposição, como aconteceu em Belo Horizonte, como palestras, visitas monitoradas e exibição de filmes, propiciando uma discussão mais ampla sobre o alcance da renovação estética trazida por Caravaggio. Também será editado, na Itália, o catálogo da exposição, trazendo 25 artigos, inéditos no Brasil, escritos por especialistas sobre as obras de Caravaggio e seus seguidores.

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