O debate sobre coleções latino-americanas desperta novo interesse no momento em que obras ganham espaço no mercado de arte. Traz à baila algumas questões de fundo, fazendo lembrar a tardia compreensão do legado artístico da América Latina. Como se sabe, os pintores latino-americanos só passam a ser reconhecidos de acordo com coordenadas da arte ocidental moderna, à medida que participam de movimentos de vanguarda do Hemisfério Norte – de certo modo permeáveis às características de “outras” culturas.
Há sempre muito a dizer sobre a atribuição de valor estético, que alicerça o processo de criação artística e o entendimento sobre domínios da arte nacional e internacional. Caberia destacar o aparecimento de poéticas modernas de âmbito local e até mesmo certa irradiação continental, como se poderia falar em relação à pintura muralista ou da versão latino-americana do movimento construtivista. Para o que concorre a crítica sobre como atuam os museus nacionais no apuro da participação de artistas na formação de histórias da arte, ampliando a visibilidade dos contemporâneos. Mas, afinal, o que aproxima as obras de artistas do continente americano? Que critérios identificam artistas entre pares e obras latino-americanas? O que possuem em comum, se é que possuem? Desde quando passam a ser colecionadas em conjunto enquanto tal, ou passam a pertencer aos acervos internacionais?
Alguns fatos ajudam a nortear esta conversa sobre a tardia formação de coleções latino-americanas que só passam a atuar na esfera pública neste século. O Museu de Arte Latino-Americana de Buenos Aires (MALBA) surge no início de século XXI, obra da sensibilidade do empresário argentino Eduardo Costantini, que reuniu coleção de artistas da América Latina a partir de expressões da modernidade do século XX. Sua iniciativa de criar uma fundação e constituir um acervo público permitiu que pudessem ser reunidas e apreciadas lado a lado obras como Abaporu, de Tarsila do Amaral, e de outros artistas, como Torres-Garcia e Xul Solar.
Outro fato relevante, mais recente, foi a criação da Coleção Latino-Americana no Museum of Fine Art, Houston por Mari Carmen Ramírez, desenvolvido juntamente com o projeto Documentos sobre Arte na América Latina e Arte Latina nas Américas, coordenado por ela dentro do departamento latino-americano da instituição, com a colaboração de especialistas de diversos países. Importante ainda são iniciativas como a exposição Paisagem nas Américas: Pinturas da Terra do Fogo ao Ártico, atualmente em cartaz na Pinacoteca de São Paulo e que reúne obras de grandes artistas do continente americano, como os brasileiros Tarsila do Amaral e Pedro Américo, os americanos Frederic Church e Georgia O’Keeffe, os mexicanos José Maria Velasco e Gerardo Murillo, o Dr. Atl, os canadenses Lawrren Harris e David Milne, o venezuelano Armando Reverón e o uruguaio Pedro Figari, entre outros. Projetos como esses, apontam valores que emergem da história do continente, sob diferentes ângulos estéticos.
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