“Precisamos combater o discurso do medo e ocupar a cidade”, disse Baixo Ribeiro na última sexta (7/4), durante o encontro final do Talks, ciclo de palestras organizado pela Sp-Arte em parceria com a ARTE!Brasileiros. Com a temática da arte urbana, a mesa que encerrou os debates também reuniu o filósofo Nelson Brissac, a jornalista Gabriela Longman e o editor Fernando Serapião, que fez a mediação.
Fundador da Choque Cultural, galeria pioneira na divulgação da arte urbana no país, Ribeiro afirmou que o tema do crescimento da população em áreas urbanas é incontornável. “Nos próximos anos, as cidades incharão ainda mais. Quase a totalidade da população da Terra viverá nos centros urbanos até o final desse século. As gerações mais novas já sacaram que herdarão um grande problema e começaram a se mexer”, afirma.
Para o curador, um dos principais impasses das metrópoles brasileiras é o “discurso do medo”, que leva as pessoas a permanecerem ilhadas dentro dos espaços privados. Essa lógica se manifesta nos limites entre o público e o privado, povoados por câmeras de segurança, grades e veículos blindados. “A verdade é que temos, em São Paulo, um urbanismo de bolha, tudo acontece em lugares fechados. No seu momento de lazer, as pessoas vão do carro para o shopping e só”, afirma.
Como contraponto, Ribeiro apresentou várias intervenções que estimulam uma relação mais amigável com a cidade. “Há especialmente um movimento de poesia urbana que me interessa muito. Eles criam roteiros e vão espalhando frases irônicas pelo espaço público, que brincam com as placas e sinalizações”. Como exemplo, ele mostra cartazes com dizeres como “Mais Brechet, menos Odebrechet”, “Não pise nos outros” ou ainda “Calma, porra!”.
O tema da arte pública também foi abordado por Nelson Brissac. O filósofo é o fundador do projeto Arte/Cidade, que, desde 1994, promove intervenções no centro e nas áreas periféricas de São Paulo. Artistas como Eder Santos, Carmela Gross, Regina Silveira e Guto Lacaz já participaram do projeto.
Brissac defende que, ao criar no espaço público, os artistas saem da sua zona de conforto. “Espaços institucionais, como museus e galerias, estabelecem padrões de percepção, com os quais nos acostumamos facilmente. Quando as produções são deslocadas para a cidade, somos estimulados a rever nossos parâmetros, estabelecendo novas formas de olhar e interagir com os trabalhos”.
Essa mudança, segundo o filósofo, pode estimular artistas a repensarem seus procedimentos. “A questão formal é essencial. Quando um artista se posiciona politicamente, não pode ser apenas um discurso, isso precisa estar na obra também, o que é bem mais difícil. A maioria dos artistas foge desse embate. Mas claro que há exceções. Regina Silveira, por exemplo, poderia estar aproveitando o seu sucesso em Paris, mas decidiu trabalhar conosco na Zona Leste”, afirma.
A relação entre a arte e a cidade também foi abordada por Longman. A jornalista falou sobre o livro Labirintos do Olhar, que lançou junto com seu pai, o fotógrafo Eduardo Logman. A publicação reúne fotografias de grafites em três cidades: São Paulo, Nova York e Berlim.
A jornalista defendeu que o grafite é uma das principais fontes para se entender a dinâmica das cidades no mundo contemporâneo. Para Longman, a arte urbana tem um papel tão importante hoje quanto foi o do jazz no século XX. “Os dois nasceram da técnica e do improviso, sendo expressões fortemente associadas às populações marginalizadas. Ambos têm um viés irônico e, ao mesmo tempo, uma representação do sofrimento. E, assim como o grafite hoje, o jazz já foi visto como um estilo menor”.
Longman também comentou sobre o processo de institucionalização do grafite. “Um dos marcos dessa virada foi o ano de 2007, quando a Tate Modern convidou artistas para grafitarem sua fachada. É um tema polêmico que ainda renderá muitas discussões. Seja no museu ou em outro lugar, o essencial é que o grafite dialogue com a cidade”.
Como um mau exemplo, ela cita os painéis de Wynwood em Miami, EUA. “São painéis lindos, mas que claramente foram feitos para valorizar a área. Soa artificial”, afirma a jornalista.
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