No vídeo La Physique Général, de Vinicius Duarte, um explorador europeu do século XIX caminha pelas matas da Amazônia. Sua voz em off narra detalhes da viagem e principalmente o encontro com os nativos. Em certo ponto do vídeo, há uma mudança de protagonismo: o papel de narrador passa a pertencer a um dos índios e não mais ao europeu.
Com curadoria de Gabriel Bogossian, a exposição Resistir, Reexistir (em cartaz no Galpão Videobrasil, em São Paulo) reúne doze obras que, assim como a de Duarte, abordam as disputas por território e também pelas narrativas. Participam da mostra artistas como Luis Roque, Letícia Ramos, Cao Guimarães e Edgard Navarro.
Em entrevista à ARTE!Brasileiros, o curador conta que o conjunto de trabalhos faz reflexão sobre conflitos tanto no espaço rural quanto no urbano.
“Exite um personagem arquetípico da história do Brasil. Ele teve várias encarnações desde o bandeirante e o latifundiário até os gestores tecnocratas. E, nesses vários momentos da história, ele repetiu os mesmos procedimentos de apropriação e dominação. É por isso que há uma continuidade entre as disputas no campo e na cidade”, afirma o curador.
A questão indígena é um dos temas recorrentes na exposição. No documentário Sangue da Terra, por exemplo, o diretor Aurélio Michiles retrata a batalha jurídica travada pela tribo Sateré Mawé contra a petrolífera francesa Elf Aquitaine entre 1982 e 1983.
“O que se critica em relação aos povos indígenas é sempre o mesmo: por que deixar tantas terras na mão de pessoas que não produzem nada? Esse tipo de pensamento é muito presente hoje, assim como foi no século XIX”, conta Bogossian.
A lógica do progresso e da produtividade também é questionada em outras obras, que retratam o espaço urbano. No vídeo A Idade da Pedra, de Ana Vaz, o público se confronta com a representação de uma Brasília abandonada e em escombros, “ruína dos projetos modernos”, como pontua o curador.
A falência do ideal de progresso também aparece na obra do colombiano Luis F. Ramírez Celis. O vídeo retrata a implosão do conjunto habitacional Pruitt-Igoe, em St. Louis, nos EUA. Considerado um marco da arquitetura modernista, o Pruitt-Igoe foi inaugurado em 1954 como solução para o problema da habitação popular na cidade, mas se tornou instrumento para segregação racial e social.
A mostra também reúne um conjunto de documentos sobre a luta dos movimentos sociais e da imprensa independente durante a ditadura militar no Brasil. Além disso, o público pode assistir a quatro entrevistas realizadas com pesquisadores e ativistas, como o arquiteto Paulo Tavares, que falam sobre conflitos contemporâneos.
Juntos, esses diversos materiais propõem um olhar sobre as mudanças e permanências do tempo histórico. “Os documentos nas mesas retratam as disputas políticas do passado. Já as obras em vídeo falam sobre a melancolia do presente, dos projetos que não deram certo. Por fim, as entrevistas apontam para o futuro e as lutas por vir. Como podemos fazer política hoje?”, questiona Bogossian.
Serviço – Resistir, Reexistir
Até 18/3
Galpão Videobrasil
Avenida Imperatriz Leopoldina, 1.150, São Paulo, SP
11- 3645-0516
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