O Itaú Cultural celebrará seus 30 anos em grande estilo. A exposição comemorativa pensada originalmente para o espaço do instituto na avenida Paulista acabou transbordando e adquirindo uma fisionomia monumental. Serão cerca de mil obras selecionadas nas várias coleções corporativas do Itaú que ocuparão integralmente o prédio da Oca, no Ibirapuera, por um período de três meses. Trata-se de uma mostra complexa, que combina um olhar atento aos momentos-chave da arte brasileira com o desejo de dar visibilidade às múltiplas ações da instituição. A estratégia adotada por Paulo Herkenhoff, curador convidado para assumir essa tarefa, foi a de criar pequenos núcleos, estabelecendo nexos temáticos ou formais que ajudem a iluminar aspectos instigantes da arte brasileira.
O primeiro passo do trabalho foi analisar de perto os bastidores do maior acervo corporativo da América Latina – também o décimo maior do mundo, com 15 mil itens espalhados em diferentes segmentos – para então identificar narrativas possíveis. “Percebi que, desde sempre, há um cuidado muito grande com a arte de São Paulo”, conta Herkenhoff, que decidiu dedicar o andar térreo à discussão em torno da cidade. Lá estarão desde referências à fundação de São Paulo até um interessante bloco dedicado à relação entre Tarsila do Amaral e seus maridos. Merece destaque a escultura de Ascânio MMM, reconstruída para substituir o trabalho do artista que havia sido instalado na Praça da Sé e que desapareceu quando foi retirada para revisão. A peça será reinstalada no seu lugar original após o término da exposição, retomando sua vocação pública.
O subsolo do prédio projetado por Oscar Niemeyer abriga um interessante diálogo entre a arte pop e a xilogravura, e também um conjunto importante de trabalhos que lidam com a questão da memória, da subjetividade e da escrita como forma de expressão plástica, bem como o núcleo dedicado à teoria dos valores, com obras que refletem e problematizam aspectos ligados ao capital, à riqueza e aos valores materiais. Subindo ao primeiro andar, o espectador se deparará com um amplo segmento dedicado à cor e, em seguida, no último piso, com os blocos dedicados ao barroco e à arte afro-brasileira.
“Há uma inversão, porque a arte afro-brasileira vai ficar no topo. Aquilo que era base na estruturação social se inverte e é coroado, com Aleijadinho e Machado de Assis”, sublinha Herkenhoff. São várias gerações de artistas contemplados. Lá estão Rubem Valentim, “que tira o candomblé da ideia de questão de polícia, de superstição, de feitiçaria, de folclore, e o lança como um conjunto de valores espirituais”; Emanoel Araújo, “aquele que volta à África”; bem como as gerações mais jovens, como Rosana Paulino e Ayrson Heráclito.
A imensa maioria dos trabalhos pertence à coleção. Apenas empréstimos pontuais foram feitos. Vale destacar, no entanto, que uma série de obras foi comprada para completar algumas lacunas. “Estamos sempre fazendo aquisições, mas foi possível aproveitar agora esse olhar mais cuidadoso lançado pela curadoria”, explica Eduardo Saron, diretor do Itaú Cultural.
O projeto arquitetônico, a cargo de Álvaro Razuk (responsável pela bem-sucedida museografia da 32ª Bienal de São Paulo), foi cuidadosamente pensado. “A gente procurou deixar a Oca livre para o espectador entender o espaço, usufruir do volume, do vazio, das articulações. Não se verá nenhum painel do outro andar”, explica o curador. Outro ponto importante destacado por ele é a importância dada à articulação entre as obras e a visibilidade que se quer dar às várias estruturas do Itaú Cultural. “Uma segunda exposição que está dentro desta é aquela que busca colocar à luz a própria ação do instituto, a enciclopédia, o projeto Rumos, o núcleo de restauração…”, cita o curador, ressaltando que talvez essa tenha sido a exposição mais complexa, em termos estruturais, que ele já tenha curado.
Para ele, o mais desafiante é discutir tudo isso por meio da arte. “O Itaú talvez seja a instituição brasileira de arte mais bem estruturada do País. Ela é muito normatizada, tem seus processos, seus prazos, sua maneira de conduzir as coisas. Eu acho que é uma demonstração de que a racionalização precisa estar no trabalho, com a arte. A racionalidade não tem que estar dentro da arte, mas ela é necessária à revelação da arte”, sintetiza.
Modos de Ver o Brasil: Itaú Cultural 30 anos
De 25 de maio a 13 de agosto
OCA
Avenida Pedro Álvares Cabral, Portão 3 – Parque Ibirapuera
11 3105 6118
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