A “bienalização” das feiras de arte é um fato tão evidente quanto a “feiralização” das bienais, dois fenômenos que estiveram no foco dos comentários críticos que circularam a propósito da abertura da Bienal de Veneza e da Art Basel. Assim também se aplica à arteBA, já que a feira portenha não foge a essa lógica de época que foi deslocando para uma zona ambígua as peculiaridades de cada uma.
Pela segunda vez, a mostra Dixit, que no ano passado foi patrocinada pela Petrobras e curada pela historiadora Andrea Giunta, foi um dos eixos centrais da feira. À frente da Dixit esteve Julieta González, a curadora venezuelana que atualmente dirige o museu Jumex, do México. Ela se inspirou em um dos diagramas do artista britânico Stephen Willats, que propõe um mundo de transformação e pela auto-organização. O Mundo Tal Como É e o Mundo Como Poderia Ser é o título que ocupou um generoso espaço com instalações, registros de ações, performances e oficinas que tiveram como dado comum diferentes motivações utópicas ou iniciativas comunitárias geradas a partir do campo da arte.
Assim, incluiu registros de ações históricas, como O Parthenon de Livros, de Marta Minujin, uma intervenção de 1983 que celebrou no espaço público o retorno da democracia; ações do Grupo Escombros e Noemí Escandell, dos anos 1960; a instalação Vida Revolucionária (2014), de Magdalena Jitrik, que se refere à correspondência entre Victor Serge e León Trotsky; trabalhos da Oficina de Serigrafia Popular e da cooperativa Eloísa Cartonera, duas experiências que deram à luz a crise de 2001; como também performances mais recentes de Ana Gallardo e Amalia Pica. Na tradição libertária que se iniciou no século XIX, a seleção buscou vincular os conceitualismos políticos dos anos 1960 e estratégias mais recentes, que poderiam se aproximar do que Bourriaud definiu como estética relacional. A propósito, o teórico francês foi uma das figuras que monopolizou a atenção do público do Auditório, e não como parte do programa oficial, mas para apresentar a edição em espanhol de seu último livro A Exforma, que Adriana Hidalgo editou.
O curioso é que, salvo poucas exceções, grande porcentagem das obras que integraram Dixit foi deliberadamente concebida para circular por fora do mercado, que agora recupera seus registros e os comercializa. Entre as mais beneficiadas por esse interesse, que tem encorajado as duas versões de Dixit nas últimas edições, têm sido Henrique Faría e Document Art, duas galerias surgidas recentemente em Buenos Aires. Enquanto Faría foca seu portfólio nos conceitualismos da América Latina com artistas como Minujin, Leandro Katz, Osvaldo Romberg, Horacio Zabala, Paulo Bruscky e Artur Barrio, a Document Art, por outro lado, tem se dedicado muito seriamente à recuperação da documentação das ações e intervenções políticas dos anos 1960 e 1970. Foi justamente em seu espaço que o comitê de compras do Malba escolheu O Tesouro Marginal de Mamablanca – Grupo de Família, obra de Graciela Gutiérrez Marx. Trata-se do registro de uma ação de arte correio que a artista de La Plata realizou na casa de sua família em 1980.
Em conjunto com a realização da primeira Bienal de Performance (BP15), a arteBA incluiu uma grande variedade de performances, um gênero ao qual o mercado não está acostumado mas que, ainda assim, encontrou boa recepção no colecionismo local. Os maiores sucessos que a feira destacou, ao menos em termos de difusão, tiveram a ver com as compras das instituições, locais e estrangeiras. Algumas incentivadas pelo programa Matching Fund. O museu Franklin Rawson da Província de San Juan adquiriu uma obra de Martín Legón e o Museu de Belas Artes de Neuquén um dos tantos Stupía que levou Mara la Ruche. Ambos participaram da Bienal de São Paulo de 2012, curada por Pérez Oramas. O Museu de Arte Moderna da cidade somou a seu acervo duas obras de Fernanda Laguna da Galeria Nora Fisch. Enquanto isso, El MAR, de Mar del Plata, deu início à coleção própria com uma obra de grande porte de Luciana Lamothe, que adquiriu junto a Ruth Benzacar. A Tate Modern, o Guggenheim de Nova York, o Mali de Lima, o Centro de Arte 2 de Maio (CA2M) de Madrid e o Los Angeles County Museum também foram às compras, mas cautelosos. Seus anúncios sempre ficam sujeitos à aprovação de seus respectivos boards.
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