Há dois anos Gilvan Barreto lançava seu livro Moscouzinho, recontando a história da cidade que teve o primeiro prefeito comunista do Brasil – daí o apelido. A obra é um pequeno relicário no qual o fotógrafo pernambucano procura reencontrar sua infância e homenagear seu pai. Fundado em 1593, o povoado de Jaboatão, foi palco de grandes batalhas contra a ocupação holandesa. Em 1873 ganhou status de cidade e em 1989 passou a ser conhecido como Jaboatão dos Guararapes.
Com uma intensa formação política, Gilvan Barreto nos apresenta agora um novo trabalho: Postcards from Brazil – cicatrizes na paisagem, em que faz uma crítica contundente ao governo militar brasileiro, ocorrido entre 1964 a 1985. Paradoxalmente, ele nos apresenta lugares de magnificiência natural, como as cataratas do Iguaçu e o sertão baiano, onde aconteceram os maiores crimes impetrados pela ditadura militar, lugares de tortura e ocultamento de cadáveres. “A natureza se tornou palco e inspiração da violência”, diz Gilvan. A pesquisa da qual resultou esse trabalho foi iniciada há dois anos e se inspirou em um verso de um hino brasileiro: “nossos bosques tem mais vida”. A partir daí, Barreto pesquisou o relatório da Comissão Nacional da Verdade para identificar lugares onde vítimas da ditadura militar foram executadas ou tiveram seus corpos ocultados.
Palmo a palmo ele reconstruiu esta cartografia soturna, que ao retomar a estética dos antigos postais, nos chama a atenção para um imaginário criado que enfatiza a “beleza” do Brasil, um exotismo pelo qual somos conhecidos e reconhecidos ainda hoje. A ironia de Gilvan Barreto é contundente, o postal que reafirma uma beleza natural do Brasil também esconde seus mortos: “uma beleza que esconde o horror”. Em cenários paradisíacos, ele insere com uma tarjeta branca que simboliza o ocultamento, a tortura, a violência. Trata-se de um trabalho político, um ensaio que pretende discutir a imagem do País. A escolha do formato e estética do cartão postal também é política. É uma imagem edulcorada, ideológica que tenta por “belas imagens” convencer o espectador de uma existência natural e exótica de um país tropical. Neste, que é seu mais recente trabalho, não à toa subintitulado “cicatrizes na paisagem”, o fotógrafo revela que em meio a uma natureza exuberante, vários crimes foram cometidos e que um olhar mais atento deve ir além da “beleza” representada, pois esta pode esconder diversas histórias que não temos o direito de esquecer.
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