“Inhotim não é um museu”

“Inhotim é um estado de espírito”, defende Bernardo Paz, o empresário que criou o instituto, hoje a melhor referência para a arte contemporânea no País. Não há museu brasileiro que consiga expor Cildo Meireles, Hélio Oiticica, Tunga ou Lygia Pape, para citar alguns, nem perto da excelência que a instituição mineira alcançou.

Paz colocou Brumadinho, a cidade onde se localiza o Instituto Inhotim, no cenário das artes mundiais, e, como todo feito de grandes proporções enfrenta desconfianças. O mais recente rumor foi o de que Inhotim iria fechar. No ano passado, Inhotim demitiu quase um terço de seus funcionários: de 1.400 caiu para mil. Mineiro, o empresário apenas admite ter sido rápido: “Agimos um ano antes dos outros, porque pressentimos a crise”.

Em uma breve entrevista em Inhotim, em julho passado, Paz contou à ARTE!Brasileiros como o instituto está fortalecido e vai comemorar em outubro 2 milhões de visitantes, não só reorganizando as mostras temporárias, mas abrindo o novo pavilhão dedicado a Claudia Andujar, o maior de Inhotim, tudo com apoio de empresas como Itaú Unibanco e Santander. Afinal, admite o empresário. “Não sou milionário, dependo de terceiros”.

ARTE!Brasileiros — Bernardo, estão dizendo que Inhotim vai fechar, está em crise. É verdade?
Bernardo Paz – Ah, isso é piada. Inhotim é um compromisso do Brasil, nem é meu mais, é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) que não me pertence, pertence ao público. E o público já tomou conhecimento desse processo e tenho recebido muita doação de artistas do mundo inteiro, como Anish Kapoor, Robert Irwin, Yayoi Kusama. Ou seja, ele está se fortalecendo cada vez mais e se firmando no cenário mundial, não só nacional. Aqui, ele está consolidado. Faltam ainda hotéis, teatros, mas tudo isso está a caminho. Minha preocupação maior era consolidar Inhotim como estado de espírito e não como um museu. Inhotim não é um museu. A pessoa vem aqui e se esquece do mundo, essa é minha preocupação maior. Como não sou milionário, dependo da ajuda de terceiros, de grandes empresas e estou bem-sucedido. O governo de Minas Gerais está me ajudando. Como nós temos uma área de educação bastante consolidada, eles estão dando apoio. O BID, que é um banco interamericano de fomento, que só trabalha por intermédio de governo, pela primeira vez passou a trabalhar direto conosco, em um projeto de médio prazo: por cinco anos vai dar US$ 2 milhões anualmente e, no último, US$ 10 milhões. O BNDES também já está aprovando o anfiteatro e um empresário paulista está doando outros R$ 19 milhões para a construção do teatro projetado por Ingo Maurer. O Deutsche Bank doou uma obra de Anish Kapoor. O problema é que temos dificuldades fiscais quando um artista doa um trabalho, porque não faz sentido pagar imposto sobre doação. Então tenho advogados vendo o que se pode fazer.

No caso da Yayoi Kusama, o espaço dedicado a ela vai ser inaugurado logo?
São duas obras, duas salas, uma é Infinity e outra com as bolas coloridas. Ambas são fáceis de instalar, construções baratas, mas depende da curadoria. Tem também outro pavilhão simples, com 12 obras de Gerhard Richter, que ele fez para cá e desenhou o espaço, mas, assim que for resolvido o problema na área fiscal, a gente arruma.

E o hotel?
Eu estava construindo sozinho, mas ele se tornou tão sofisticado, mas tão sofisticado que começou a ficar muito caro para bancar. Então, fiz um acordo com umas pessoas que considero muito, donos do Txai, aquele hotel da Bahia, um dos melhores do Brasil, e eles vão acabar o hotel, com minha arquiteta, a Freusa Zechmeister, que é uma das melhores que conheço, mas doida. Doida para o bem. Terminaremos o primeiro hotel até o começo do ano que vem e vai ser o melhor do mundo. Um lobby de 5 mil m2 e quartos de 200 m2. Mas a ideia é construir mais quatro hotéis, com quartos pequenos, feitos pelos artistas, como Olafur Eliasson, Jorge Pardo e o próprio Anish Kapoor. Cada um bola um e construímos em série. Como temos 15 hectares, isso vai desaparecer aqui.

Com que dinheiro?
Ah, hoje não dá mais para se construir com dinheiro próprio. A euforia pela qual o Brasil passou acabou e não volta nos próximos dez anos. Esquece. Como ninguém mais tem dinheiro sobrando, é preciso buscar fundos. Investidores de fundos são sérios. Eles serão nossos parceiros. Uma rua de comércio e os melhores shows que vierem ao Brasil vão estar nesses teatros.

Agora, teve demissão por aqui, não?
É preciso tomar muito cuidado em períodos de euforia porque você avança o sinal, é preciso ter muita parcimônia. Em meu caso, é ainda mais grave porque há uma crise internacional no valor de minério de ferro, nem é brasileira. Mas ajustei os custos, tiramos os excessos. Inhotim agora tem uma excelência absoluta: onde você vai é recebido com carinho, a comida é sempre elogiada. Inhotim é muito melhor agora com um diretor do que quando tinha dez.

E qual foi o corte geral?
Inhotim tinha 1.400 funcionários e hoje tem mil, mas eram 400 que jogavam dinheiro para o alto. Na hora da crise, se você não age rápido, antes dos outros, fica difícil. Nós agimos um ano antes dos outros, porque pressentimos a crise. Quem não fez isso está em falência. E nossa situação é espetacular, porque regularizamos a situação das mineradoras, que me ajudam a sustentar isso aqui. Regularizamos a situação de Inhotim e a de captação pela Lei Rouanet. Temos hoje a Ernst Young, que faz auditoria. Somos exemplo no Ministério da Cultura em prestação de contas.

O orçamento anual continua em R$ 42 milhões?
Sim, e com a lei de patrocínio já conseguimos R$ 24 milhões. Sabe o que acontece? Como Inhotim tem fama de um MoMA ou de uma Tate, os empresários perceberam que o instituto faz parte da imagem brasileira e todos querem estar presentes. Mesmo em um período de crise, eles querem estar presentes, por conta da seriedade.

Qual é o público anual?
Quando começamos em 2007, vinha muito menos gente, mas agora em 2015 comemoramos 2 milhões de pessoas. Vamos ter uma grande festa, que vai contar com inaugurações de galerias. Mas, na verdade, só estamos considerando pagantes. Se formos considerar escolas integradas, isso sobe para três milhões, e se somar ainda os projetos sociais, com as comunidades da região, isso sobe para 3,8 milhões. É muita gente para um lugar a uma hora e meia de uma capital. Agora, não posso deixar de falar do governador Pimentel, que é um estadista. Desde o início da gestão, ele me dá apoio total. Mas isso também porque ele foi ao BID pedir dinheiro para a Cultura e eles disseram que teria que ser via Inhotim. De qualquer forma, ele é um homem extraordinário. É o único estadista que considero no PT.

E o pavilhão de Claudia Andujar?
Esse eu inauguro em novembro. É o maior pavilhão que vamos abrir. Para você ter uma ideia, ele é do tamanho da área expositiva da Pinacoteca, com 500 fotos, com as imagens que ela ajudou a escolher nos últimos três anos. Então, falar que Inhotim vai acabar só me ajuda a fazer mais propaganda, porque o público vai querer vir logo.


Comentários

2 respostas para ““Inhotim não é um museu””

  1. Já fui a Inhotim duas vezes e voltarei mais. É Imperdível. E eu sou museóloga.

  2. Avatar de Cristina Cavoto
    Cristina Cavoto

    Como e’ inspirador ver o trabalho de gente que nao tem tempo para reclamar.

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