À época de sua construção e inauguração, Brasília atraiu diversos fotógrafos, arquitetos, cineastas e curiosos dispostos a retratar ou observar a nova capital, que se erguia em meio à euforia dos chamados “anos dourados”, vividos pelo Brasil àquele momento. O fascínio gerado pela arquitetura de Oscar Niemeyer hipnotizou especialmente os fotógrafos estrangeiros, como Marcel Gautherot (1910-1996) e Peter Scheier (1908-1979), mas para o húngaro de nascimento radicado no Brasil Thomaz Farkas, o que atraiu seu olhar foi o povo.
“É essa atenção voltada para as pessoas, os candangos, os bairros periféricos, em um momento em que o foco de Brasília era a sua arquitetura, que faz de Thomaz Farkas um subversivo. Ele, com sensibilidade e beleza, celebra e torna a vida protagonista de seu trabalho, sem ser panfletário ou sensacionalista”, explica Eder Chiodetto, organizador do livro e da exposição que esteve em cartaz até 21 de outubro no Museu da Imagem e do Som, em São Paulo, ao elucidar a utilização dos termos “subversivo e elegante” no título do lançamento.
A Coleção Ipsis, totalmente voltada à fotografia documental, encontrou para este volume dedicado a Farkas duas belas séries do artista que são seu maior feito nesse campo. A primeira, realizada entre 1958 e 1960, mostra Brasília em dois momentos, sua construção e sua inauguração. Mais que isso: traz à luz todo um tecido social que, ao mesmo tempo que construía e trabalhava na cidade, era sistematicamente excluído da mesma, sendo relegado a bairros longínquos e cidades satélites. A segunda série, realizada por um Farkas já em idade avançada, entre 1998 e 2000, surgiu a partir de uma encomenda do jornal O Correio Braziliense e permaneceu até então praticamente inédita. No entanto, se comparada com a primeira, 40 anos mais antiga, é praticamente indistinguível. Ambas retratam o cotidiano das pessoas mais humildes com a mesma profundidade e sensibilidade. A própria arquitetura, como salienta Chiodetto, sempre é retratada com pessoas a seu redor. A crítica é muito evidente. A pouca diferença no cotidiano dos mais pobres, bem como sua exclusão da cidade idealizada por Niemeyer, mostra, e o próprio Farkas denunciou, que a vida desses pouco mudou nas quatro décadas que separam um ensaio do outro.
Com um arsenal de fotografias inéditas, o título da Coleção Ipsis homenageia não apenas um fotógrafo de alta qualidade estética, mas também um importante olhar social, que, com beleza, trouxe à tona a dimensão humana de uma cidade criada para escondê-la.
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