A premiação da artista plástica Abigail de Andrade (1864-1890) na 26ª Exposição Geral de Belas Artes, em 1884, no Rio de Janeiro, e o ano de 1930 delimitam o período escolhido pelas curadoras Ana Paula Simioni e Elaine Dias para falar da inserção da mulher no universo da arte brasileira, assim como sua consolidação na profissão, na mostra Mulheres Artistas: As Pioneiras (1880-1930), em cartaz até o início de setembro na Pinacoteca do Estado de São Paulo. “Abigail foi a primeira mulher brasileira a receber uma medalha de ouro numa exposição organizada pela Academia Imperial de Belas Artes, antes mesmo de a instituição abrir suas portas para as mulheres serem alunas, o que ocorreu a partir de 1892”, ressalta Simioni.
Na outra ponta, a década de 1930 é marcada pela “rotinização” do modernismo, uma expressão de Antonio Candido, como lembra a curadora. “(O modernismo se torna) cânone, especialmente com o apoio oficial da primeira Era Vargas, a partir de 1937. No entanto, gostaríamos de mostrar que as práticas acadêmicas permanecem em vigor ao longo dos anos 1920 e 1930, ou seja, elas possuem uma longa duração, o que assinala que a ideia recorrente de que, com o modernismo, o academismo teria ‘morrido’ não é verdadeira. Ao contrário, temos múltiplas temporalidades artísticas no Brasil durante aquelas décadas, e as práticas acadêmicas são capazes de assimilar inovações. Isso é perceptível nos cadernos de desenho de Anita Malfatti, por exemplo, feitos em Paris durante a década de 1920”, diz Simioni, cujo trabalho teve acompanhamento de Fernanda Pitta, da Pinacoteca.
A mostra apresenta cerca de 50 obras – entre papéis, pinturas, esculturas, aquarelas e um biombo – e se divide da seguinte forma: no primeiro espaço expositivo, a curadoria destacou as práticas acadêmicas que fizeram parte da formação das artistas, entre elas o estudo do desenho dos corpos feminino e masculino, e a imitação dos mestres. No segundo, o foco são as variedades de estilos apresentados pelas mulheres entre o fim do século XIX e as três primeiras décadas do XX.
A curadoria destaca a importância histórica de se ressaltar o profissionalismo daquelas mulheres, tidas como amadoras: “Um rótulo perigoso com o qual as mulheres eram julgadas ao longo do século XIX”. “Em parte, isso derivava da realidade institucional, posto que apenas em 1892 as mulheres puderam acessar o sistema acadêmico como alunas. Mas era também um modo com que os críticos, homens de seu tempo, tendiam a julgar toda a produção feminina. O termo era impreciso, e dizia respeito à maneira com que as mulheres eram então compreendidas, como seres sensíveis, delicados, cujas aptidões intelectuais eram por natureza distintas, e inferiores, às dos homens, considerados potencialmente criativos e geniais.” Um exemplo disso, cita Simioni, é a utilização dos termos “vigoroso” ou “másculo”, para se referir a obras femininas que se destacavam pela ousadia.
O levantamento das obras de Mulheres Artistas: As Pioneiras reservou boas surpresas. Simioni conta que a coleção de desenhos realizados por alunos e alunas da ENBA era “maravilhosa” e trazê-los ao público foi “algo incrível”. “Entrar nas reservas do Museu Nacional de Belas Artes e me deparar com a escultura Mocidade em Flor, de Julieta de França, foi algo inesquecível. Além disso, as visitas aos colecionadores trouxe momentos de descoberta muito importantes, obras que também nós não conhecíamos, foi realmente um prazer e uma descoberta. A possibilidade de colocar dois nus de Tarsila, de sua fase inicial, um ao lado do outro, foi algo que nos trouxe muita alegria.”
Serviço – Mulheres Artistas: As Pioneiras (1880-1930)
Até 6 de setembro
Pinacoteca do Estado de São Paulo –
Praça da Luz, 2 – São Paulo/SP
(11) 3324.1000
pinacoteca.org.br
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