Ruptura entre o real e o imaginário

Mary Ellen Mark tem um olhar profundo. Ela te fixa e te estuda, isto durante a entrevista concedida com exclusividade para ARTE!Brasileiros. Reconhecida no mundo todo por seus trabalhos e inúmeros livros, há quatro décadas se insere dentro da escola humanista de fotografia. O mundo se desvela por meio do seu olhar. Veio ao Brasil em abril para um workshop em São Paulo, a convite do SP Photo Fest e para participar como jurada do Pictures of the Year International, o POY, um dos mais importantes prêmios de fotojornalismo, criado em 1944 pela University of Missouri Columbia, e que neste ano foi realizado em Fortaleza, organizado pela rede de fotojornalistas ibero-americano Nuestra Mirada e com a coordenação de Tiago Santana e Silas de Paula.

Mary Ellen Mark começou a fotografar na metade dos anos 1960 em Nova York, registrando as manifestações contra a Guerra do Vietnã e as profundas transformações culturais que ocorrem nesta década e que dariam uma nova face ao mundo. Seu olhar se voltou para as margens da sociedade, as pessoas não visíveis, os outsiders tão comuns nesta época. Também se interessou por cinema e foi fotógrafa de stills de fiImes, como Apocalipse Now, de Francis Ford Coppola, ou Satyricon, de Federico Fellini, por exemplo. Tem mestrado em fotojornalismo e em suas imagens humanistas retrata, ou melhor, retratava as questões sociais norte-americanas.

Há tempos seu caminho é outro. Ela não acredita mais no fotojornalismo, aliás, ela decreta que ele acabou: “Não existe mais. Nunca fiz fotos de tragédias, catástrofes, estas continuam existindo, mas reportagens de pessoas, histórias não encontram mais lugar na imprensa. Muita foto de arte, muito photoshop, este fotojornalismo acabou. É tudo decoração. Não há mais tempo para elaborar um bom trabalho”.

Realmente, se compararmos com a época em que ela começou a fotografar, foi na época de ouro de fotojornalismo: “Tive muita sorte quando comecei, as revistas precisavam do fotógrafos. Isso não acontece agora”. Fala com conhecimento de causa, pois colaborou para revistas como Life, Rolling Stones, Vanity Fair. Mesmo assim, continua fotografando e acreditando na fotografia: “Adoro fotografia e vejo imagens fabulosas por aí”.

Fez retratos belíssimos do fotógrafo Ansel Adams, dos cineastas Woody Allen e Tim Burton, só para dar alguns exemplos. Geniais são seus trabalhos documentais, como o do circo ou o dos gêmeos. Muitas vezes seu trabalho é comparado ao trabalho da também norte-americana Diane Arbus (1923-1971), semelhança essa que ela rejeita com uma larga risada: “Todos me perguntam isso, provavelmente porque somos mulheres, mas acho os dois trabalhos tão diferentes”.

E continua: “Fui mais influenciada por outros fotógrafos como Cartier-Bresson, Irving Penn e Richard Avedon, o movimento Farm Security Administration e mesmo Lisette Model”. Sim, são estilos diferentes, mas Lisette Model foi a mentora de Diane Arbus. E a busca pelas pessoas que vivem ou viviam à margem é a mesma. Mas sua estética é mais social do que a da Diane Arbus, uma fotógrafa com um trabalho incrível e que começou fotografando moda. “Eu gosto da foto realidade”, completa. Não é sua primeira vez que vem ao Brasil, esteve por aqui no final dos anos 1980, no Rio de Janeiro, fotografando os morros cariocas.

Claro que não podia escapar da pergunta se conhecia algo da fotografia brasileira: “Não muito é bem verdade. Só Sebastião Salgado e Miguel Rio Branco, mas espero ter a oportunidade de conhecer mais agora nesta viagem”.


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