Examinando o “caráter expandido, instrumental e descentralizado da gráfica contemporânea e seu avanço a uma pós-gráfica”, segue em cartaz até 28 de fevereiro de 2016 a 4a edição da Trienal Poli/Gráfica de San Juan: América Latina e Caribe, na capital de Porto Rico. A citação é de seu curador, o cubano Gerardo Mosquera, que divide a organização da Trienal com a chilena Alexia Tala e a porto-riquenha Vanessa Hernández Gracia.
Há 45 anos, San Juan organiza uma mostra de caráter bienal. Por 13 edições, entre 1970 e 2002, ela sediou a Bienal Americana de Artes Gráficas, que, a partir de 2004, foi reformulada pela curadora porto-riquenha Mari Carmem Ramírez, diretora do Museu de Belas Artes de Houston, como uma exposição que se desdobra além de uma única linguagem, passando a denominar-se Poli/Gráfica.
Com isso, em cada uma de suas edições recentes, seus curadores abordaram questões que partem desse conceito. Em 2009, por exemplo, a 2a Trienal, a cargo de Adriano Pedrosa, concentrou-se em apresentar trabalhos de artistas que tratam do desenho gráfico e na produção de livros de artista. “A Trienal não pode esquecer que é filha de uma Bienal e deve ser sensível à forte tradição gráfica da ilha”, escreve Mosquera, no catálogo da atual edição.
A 4a Trienal foi inaugurada em situação um tanto caótica, devido ao atraso na liberação das verbas para sua organização, por conta da grave crise econômica que o país atravessa – o evento é bancado por dinheiro público. Por isso, uma semana antes da abertura, muitas obras selecionadas ainda não tinham sido enviadas, o que motivou Rosângela Rennó a cancelar sua participação. Dos 55 artistas convidados, contudo, a brasileira foi a única a sair da exposição.
Mesmo assim, como era esperado, as obras de muitos artistas não foram instaladas a tempo da abertura oficial, em 24 de outubro, caso de Mônica Nador e Lucia Koch, entre outros. Com isso, uma segunda abertura foi agendada para 18 de novembro.
Uma das novidades desta edição foi o uso de espaços expositivos de museus espalhados por toda a ilha. “Todos os locais que procuramos foram receptivos à nossa proposta de descentralizar a exposição e com isso ocupamos outros oito museus, além do Antigo Arsenal”, explica Mosquera, que no Brasil foi o responsável pelo Panorama da Arte Brasileira do MAM, em 2003.
Três artistas ganharam amplas retrospectivas de sua obra, caso do cubano Carlos Garaicoa, que tem expostos 26 trabalhos realizados entre 1993 e 2014, um dos destaques da abertura. Esses trabalhos são compostos de dípticos, em geral uma imagem de Cuba e depois uma leitura poética dessa imagem. Ganharam ainda retrospectivas o peruano Fernando Bryce e a gravurista porto-riquenha Myrna Báez.
A Trienal também ocupa espaços públicos e entre os destaques estão os outdoors do cubano Félix González Torres (1957-1996). “É a primeira vez que eles são exibidos aqui. Félix nasceu em Cuba, mas passou sua adolescência e iniciou sua formação em arte em Porto Rico”, diz o curador.
Outro trabalho que ocupa as ruas da parte velha de Porto Rico é o coletivo Grabadores por Grabadores. O grupo já costuma fazer intervenções públicas, em geral lambe-lambes retratando pessoas em tamanho real nas fachadas das construções. Para a Trienal, os 21 artistas do coletivo prestam homenagem a artistas que usaram a gravura como suporte, caso de Andy Warhol e Liliana Porter, entre outros.
De fato, esse acaba sendo um dos poucos momentos que a Trienal se relaciona realmente com o contexto. Com o título Imagens Fora do Lugar/Imagens no Espaço, a exposição apresenta em sua maior parte obras que tratam de questões vinculadas à arte, em uma exposição um tanto formal. Uma mostra que trata de um tema tão atual como a massificação na produção de imagens que rompeu monopólios, entre eles o da própria arte, poderia ter sido mais ousada.
Essa questão, entretanto, foi amplamente discutida em um seminário sobre A Imagem Contemporânea: do Espaço Simbólico como Hegemonia ao Espaço Simbólico como Problematização, com excelentes intervenções do chileno Alfredo Jaar e do mexicano Cuauthémoc Medina. Jaar, por exemplo, além de apontar como sua obra busca repensar o uso da imagem de forma ética, mostrou como a foto do menino imigrante sírio Aylan Kurd acabou provocando uma reviravolta na maneira de os europeus encararem o problema migratório. Mesmo em um mundo com imagens em abundância, algumas ainda têm capacidade de chocar.
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