“A classe baixa exige qualidade”

Fotos Luiza Sigulem

Nesta sexta-feira, dia 26, acontece no Centro de Convenções Rebouças, o Seminário “Inovação: Novas Forças do Mercado Brasileiro”. O encontro, realizado pela Seminários Brasileiros em parceria com a Plano CDE, tem o objetivo de mostrar e discutir exemplos criativos e sustentáveis de soluções para atender às necessidades dos novos consumidores.

A palestra de abertura do evento foi “Modelos de negócios inovadores e com impacto social na América Latina”, do gerente de Oportunidades para a Maioria do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Luiz Ros. Ao iniciar sua explanação, Ros chamou a atenção para a importância de eventos como este da Brasileiros para pensar novos modelos de relacionamento comercial com os consumidores das classes D e E. “Ter um sócio estratégico como a revista Brasileiros que promova este debate no Brasil todo o ano é muito importante. O Brasil tem uma base da pirâmide importante e temos que atentar para isso”, disse.

Luiz Ros

De acordo com ele, o BID percebeu, em 2005, a necessidade e a oportunidade de unir-se ao setor privado para ajudar as empresas dos países latino-americanos a inovar e criar modelos de negócios para atender a base da pirâmide. Juntamente com essa necessidade, o Banco observou que as grandes diferenças entre as classes baixas nesses países pedia soluções locais. “As pessoas não entendem o potencial e não sabem como chegar nesse mercado. A gente tende a olhar para uma pessoas de baixa renda e pensar que eles são iguais, têm as mesmas necessidades em todos os lugares. Mas eles são diferentes. Em termos de educação, saúde e transporte, moradia e consumo, essas populações são diferentes no Brasil, na Argentina, no Chile, na Bolívia, em Honduras, na Guatemala ou Colômbia. Se olhar onde essas pessoas gastam seus recursos, se nota muita diferença”, afirmou.

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Para Luiz Ros, este setor da sociedade tem sido negligenciado e, além de não ser atendido adequadamente, ainda é subestimado pelas empresas. “A classe baixa exige qualidade. Ela é mais exigente que a classe média e que a classe alta porque ela não pode errar. E eles pesquisam e perguntam e têm suas formas de trocar experiências para não errar. Não podem desperdiçar dinheiro”, disse.

Falando sobre projetos exemplares que uniram a iniciativa privada e o BID, Ros citou o case do Colégios Peruanos, no Peru. Segundo ele, o Grupo Interbank, uma grande empresa peruana que tem se dedicado a atender a classe emergente, resolveu construir uma escola de grande qualidade e com preços acessíveis. “As escolas têm belíssima infraestrutura, são bilíngues – tem aulas de espanhol e inglês -, e têm computadores. São escolas privadas instaladas nas áreas periféricas de Lima para atender o grupo dos mais pobres”. E, provocando a plateia perguntou: “quanto vocês acham que custa a mensalidade em uma escola dessas? A mensalidade é 100 dólares”, contou. “Eles querem construir 70 escolas na periferia de Lima. É um projeto inovador e 100% privado”, disse.

Outro exemplo apresentado foi o projeto feito pela empresa mexicana Cemex, uma das líderes do mercado de concreto e cimento no país. A Cemex criou, junto ao BID, um projeto que visava pavimentar ruas de comunidades pobres do país com a participação da população local. A empresa entrou com 50% do custo e dividiu com a população de uma região. “As famílias pegaram empréstimos para financiar os outros 50% dos custos. Para a empresa é bom porque ela cria oportunidade para fazer mais negócios e é bom para a comunidade também. A empresa assume o risco porque essas famílias podem não ter dinheiro para honrar o financiamento”, disse.

Questionado se este não seria uma intromissão da iniciativa privada ao trabalho do Estado, ele afirma que é possível criar modelos privados que resolvam problemas urgentes aos quais o serviço público não tem condições de atender. “A discussão é que o público e o privado tem que trabalhar juntos. Não existe um mundo ideal onde o Estado vai conseguir dar conta de atender a todas as demandas do público de baixa renda. Se for esperar pelo Estado para pavimentar ruas em vilas, pode demorar 10 anos”, disse.

Sobre o início do projeto, Ros conta que quando foi proposto à diretoria do BID houve resistência porque o banco trabalha com o setor público pensando no benefício das populações. “Nós sempre tratamos com o setor público. Tratar da base da pirâmide junto ao setor privado causava agonia ao banco. ‘Será que o setor privado não vai explorar o pobre?, questionavam-me. E eu respondi ‘vamos parar de falar e construir um plano e trabalhar”, contou. A estratégia teve tanto sucesso que hoje o setor de Oportunidades para a Maioria tem 40 projetos aprovados e atende 18 países. “Hoje é uma realidade bem-sucedida”, comemora.

Terminando sua explanação, Ros salientou que o projeto do BID não pretende fazer assistencialismo. “Estamos aqui para gerar modelos de negócios que tragam benefícios para a iniciativa privada. Tem que ser um projeto inovador, emblemático e que sirva a esse segmento da sociedade (as classes D e E). Não é caridade, não queremos volume, queremos resultados concretos para poder alavancar a participação do setor público nesse mercado”, disse.

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