A esquerda contemporânea “não tem projeto” e o ajuste fiscal adotado pelo governo brasileiro “não funcionou em todo o mundo”. A análise, que poderia ser atribuída à oposição, é de um ministro da presidente Dilma Rousseff, o chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger. Sob os olhares dos ex-ministros da Fazenda Luiz Carlos Bresser Pereira (1987) e Antônio Delfim Netto (1967-1974), Unger palestrou nesta quarta-feira (26) na Fundação Getulio Vargas (FGV), em São Paulo, sobre suas teses para “uma nova estratégia de desenvolvimento nacional”.
Para o ministro e teórico social, a esquerda contemporânea há muito tempo desistiu da tese marxista de que o Estado é quem deve apresentar soluções para desenvolver o país e seu povo. Em lugar disso, adotou a receita de desenvolvimento dos adversários. “A esquerda não sabe o que fazer. Não tem visão estrutural, um projeto. Seu projeto é o projeto de seus adversários conservadores, mas com um desconto. Ela aparece condenada a humanizar os projetos de seus adversários, dourando a pílula econômica com benesses sociais.”
E a maior evidência disso seria a adoção do ajuste fiscal pelo atual governo. Embora o pacote tenha sido escolhido parar ganhar a confiança do mercado, atrair investimento e crescimento, “essa contração expansionista nunca funcionou em todo o mundo. A Europa é o exemplo”. O ministro sugere o oposto: “um ajuste que assegure ao País um projeto rebelde de desenvolvimento nacional independente dos mercados”.
Unger acredita que o ajuste perfeito para o Brasil deveria centrar-se menos no controle do custo do dinheiro e mais no aumento da produção nacional. “O que não pode é o governo entrar em pânico e ceder aos bancos.” Para o pensador, “a América Latina foi convencida ao longo do tempo a abandonar poupança interna, adotar juros altos e moeda cara”. A consequência é a dependência do capital externo. “Nos comprometemos a uma servidão nacional.”
Educação e Defesa
Além de um ajuste fiscal ineficiente, essa postura teria trazido duas consequências imediatas para o Brasil: as salas de aula estariam presas ao século 19 e o sistema de defesa do País teria sido terceirizada para os Estados Unidos. “Hoje o Brasil é um protetorado americano. As Forças Armadas foram reduzidas à força policial. O Brasil é um dos mais pacíficos entre os grandes países modernos, mas não queremos viver em um mundo em que os meigos estão desarmados e os beligerantes estão armados até os dentes.”
Já o sistema educacional estaria preso ao passado. “Nosso método de ensino é uma cópia degenerada da educação francesa do século 19. Nosso objetivo é transformar brasileiros do século 21 em franceses do século 19”. O método é a “decoreba” e o “autoritarismo” em sala de aula.
Aparentemente surpresos com o que ouviram, Bresser e Delfim Netto usaram suas falas para comentar a palestra de Unger. O primeiro elogiou a análise, mas frisou que é preciso se adaptar à realidade. O segundo concordou com as teses do pensador, mas reservou uma alfinetada a presidente Dilma: “Até 2013, não se tinha grandes problemas. No ano seguinte, ela destruiu as finanças publicas para conseguir a reeleição.”
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