A agência de vigilância sanitária havia iniciado em maio de 2014 a discussão sobre a possibilidade da reclassificação do canabidiol (CBD) em maio de 2014. Na época, não houve decisão terminativa sobre a questão. Desde então, o órgão vinha autorizando a liberação de importação da substância em caráter excepcional.
Diretores da Anvisa ressaltaram que não há relatos de dependência relacionada ao uso de canabidiol, além de uma série de indícios registrados na literatura científica de que a substância auxilia no tratamento de enfermidades como a epilepsia grave.
Além de permitir que famílias ajam na legalidade ao comprar o medicamento para o tratamento de casos de epilepsia, a reclassificação é uma forma de incentivar pesquisas científicas sobre o tema.
Em entrevista, Rafael Guimarães dos Santos, Doutor em Farmacologia e Pós-doutorando no Departamento de Neurociências e Ciências do Comportamento da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP (FMRP-USP), fala sobre a vocação do canabidiol como medicamento e da sua aplicação para tratar enfermidades como a Doença de Parkinson.
Em estudo recente, pesquisadores do departamento mostraram os efeitos positivos do CBD em pacientes com Parkinson. Um grupo de voluntários que ingeriu cápsulas contendo canabidiol apresentou melhoras na qualidade de vida e no bem-estar.
O estudo foi publicado em outubro último na revista “Journal of Psycopharmacology”, da Associação Britânica de Farmacologia. Segundo os cientistas, o CBD possui estrutura química com grande potencial terapêutico neurológico e ação ansiolítica. A seguir confira a entrevista com Rafael Guimarães dos Santos.
iNOVA!Br – Quando falamos do uso do canabidiol para fins medicinais, há doses que poderiam prejudicar o seu usuário? Haveria reações adversas em caso de superdose?
R. Santos – Estudos em animais envolvendo a administração aguda e crônica de várias doses de CBD sugerem que este canabinóide não produz efeitos adversos significativos. Estudos em voluntários saudáveis e em pacientes com transtornos psiquiátricos também sugerem que o CBD é seguro, produzindo apenas sonolência em alguns casos. Entretanto, mais estudos são necessários para se avaliar as melhores doses de CBD para o tratamento de cada doença específica.
iNOVA!Br – O uso da substância tem sido alvo de estudos que envolvem desde o controle de ansiedade a distúrbios com sono e Parkinson. O que faz do canabidiol tão versátil para o estudo dessas condições?
R. Santos – Ao atuar em diversos sistemas neurais além do sistema endocanabinóide (serotonina, glutamato, GABA etc.), o CBD exerce uma ampla variedade de efeitos farmacológicos.
iNOVA!Br – Pela primeira vez em humanos, o estudo com canabidiol mostrou eficácia para melhorar a qualidade de vida em pacientes com Doença de Parkinson. Como a substância age nesses pacientes?
R. Santos – Neste estudo de 2014, não encontramos efeitos significativos nos sintomas motores, apenas na qualidade de vida. Os mecanismos de ação do CBD são complexos e ainda não compreendemos totalmente como este composto produz seus efeitos terapêuticos, inclusive em pacientes com Parkinson. Estudos em animais realizados por nosso grupo mostram que o CBD atua no sistema endocanabinóide e também em outros sistemas neurais, como o da serotonina. Também encontramos evidências de que o CBD pode agir como um antioxidante, anti-inflamatório e neuroprotetor. Mais pesquisas são necessárias para desvendar a farmacologia do CBD.
iNOVA!Br – Como o estudo foi conduzido?
R. Santos – O CBD foi administrado a 21 pacientes, que receberam placebo ou CBD por 6 semanas nas doses de 75 ou 300 mg/dia, embora apenas a dose de 300 mg tenha produzido efeitos significativos.
iNOVA!Br – Quais são as próximas etapas da pesquisa envolvendo o canabidiol para fins de controle do Parkinson?
R. Santos – Administrar o CBD para uma amostra maior de pacientes, para tentar replicar os resultados recém publicados.
iNOVA!Br – Como o CBD se diferencia de outros medicamentos disponíveis até então?
R. Santos – Além de não serem eficazes para uma parcela significativa de pacientes, os medicamentos atuais podem produzir uma série de efeitos adversos. Ademais de possuir maior eficácia terapêutica, estudos indicam que o CBD não produz efeitos subjetivos ou fisiológicos significantes, o que sugere baixa toxicidade e um bom perfil de segurança. Embora não se saiba exatamente como o CBD produz seus efeitos terapêuticos, este composto parece não produzir efeitos significativos nos sistema dopaminérgico, pois não produz euforia ou efeitos motores. Os efeitos antioxidantes, anti-inflamatórios e neuroprotetores do CBD poderiam explicar ao menos parte de seus efeitos benéficos. Entretanto, mais estudos são necessários para elucidar os mecanismos de ação do CBD.
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