Em Sobral, a 240 km de Fortaleza, as nuvens carregadas passam, mas não param. Castigada pelas secas, baixas colheitas e poucas oportunidades de trabalho, metade da população vive com menos de R$ 310 mensais. Ainda assim, virou referência em ensino. Das 178 escolas públicas de excelência no Brasil, 21 estão lá. As duas piores escolas da rede municipal ficaram com nota 15% maior do que a meta brasileira para 2021.
Mas o cenário nem sempre foi assim. A atual diretora do colégio Gerardo Rodrigues, Maria do Socorro Aguiar, conta que no início de sua carreira, há cerca de 30 anos, boa parte dos professores do município ainda assinava com a impressão digital, por não saber ler ou escrever. Eram os chamados professores leigos, que ministravam aulas nas escolas ou nos quintais das casas.
Hoje, nenhum professor da cidade pode dar aulas sem ter uma graduação no mínimo. Muitos deles, aliás, já têm cursos de especialização e mestrado. A mudança começou em 2001, quando uma avaliação estadual mostrou que 48% das crianças entre 9 e 10 anos de Sobral não sabia ler nem escrever, e, ainda assim, avançava nas séries, criando uma bola de neve de deficiência na aprendizagem. “Percebemos que dentro das escolas estávamos produzindo analfabetos”, conta o secretário municipal Julio César da Costa Alexandre.
Para isso, o Estado articulou uma grande reforma na política educacional focada na produção de materiais didáticos, formação de professores, e planejamento pedagógico. “A ideia é deixar o professor tranquilo e preparado enquanto estiver na sala de aula, sabendo quem são seus alunos, qual o nível da sua turma e o que precisa fazer para avançar. Assim, ele consegue aproveitar de fato as 3 horas e 20 minutos em que estiver dentro da sala”, explica Julio.
O investimento municipal em educação tem sido recompensado e hoje o índice de leitores alfabetizados na idade certa chega a 97% dos alunos. Dentre eles, todos conseguem ler textos com ritmo, entonação e, principalmente, compreensão das informações.
Para Julio, um dos segredos é ensinar português e matemática com excelência. “É claro que um currículo diversificado é muito interessante, mas se o aluno não souber ler e compreender o que está lendo, ele não vai tirar proveito das outras disciplinas e nem continuar avançando”, afirma. Para garantir assiduidade, um funcionário da escola Gerardo Rodrigues vai de moto buscar alunos em casa após três faltas seguidas:
“Analisamos os resultados de provas e quem vai mal tem reforço. O acompanhamento é diário e nenhum aluno fica para trás”, explica Maria do Socorro. Segundo o Secretário, é preciso entender a realidade do aluno que chega na escola pública hoje e pensar em políticas específicas para ele, sem necessariamente seguir a próxima moda da Educação. “O que o aluno do sertão precisa hoje é muito diferente do que o aluno da Finlândia precisa. O aluno que chega na escola pública de Sobral vem de uma formação cultural muito frágil. Precisamos, antes de tudo, cuidar do básico para que ele consiga avançar”, complementa.
*Título e olho da redação em reportagem de Gabriela Portilho para a revista Super Interessante.
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