Há 14 dias estudantes de Goiás ocupam escolas públicas em protesto contra a decisão do governo estadual de, a partir do próximo ano, transferir a gestão das escolas para organizações sociais (entidades privadas filantrópicas). A previsão é que os manifestantes permaneçam nas escolas nas últimas semanas do ano.
Segundo o movimento, foram ocupadas 23 unidades. Para os alunos, a mudança na administração significa uma privatização do ensino público. O governo diz que o novo modelo visa dar agilidade na resposta às demandas da sociedade pelo acesso à uma educação pública de qualidade.
Para reverter as ocupações, o governo de Marconi Perillo ingressou, na Justiça de Goiás, com pedido de liminar de reintegração de posse e por danos ao patrimônio. Mas o Tribunal de Justiça do estado negou o pedido argumentando que a ocupação é um movimento de protesto.
Água cortada
De acordo com os estudantes, em represália, o fornecimento de água, em algumas escolas, foi cortado. Os manifestantes criaram uma página na rede social Facebook para divulgar informações sobre o protesto e postaram vídeos mostrando a suspensão do abastecimento.
Na mesma rede social, o grupo promove campanhas para arrecadação de alimentos e produtos de limpeza para ajudar a manter as escolas ocupadas. Segundo a Ordem dos Advogados do Brasil no estado (OAB-GO), algumas unidades continuam com o fornecimento de água suspenso. Com isso, a instituição protocolou, na última sexta-feira, uma ação cautelar e um mandado de segurança para garantir o direito de manifestação.
“Nossa comissão está acompanhando desde a ocupação da primeira. Temos ido aos colégios e conversado com estudantes. A posição da OAB não é contra ou a favor das OSs [organizações sociais], mas pelo direito ao protesto. A medida é para garantir o direito de manifestação e evitar qualquer tipo de abuso”, disse o presidente da Comissão dos Direitos da Criança e do Adolescente da OAB, André Vinícius Dias Carneiro.
Ainda não há um posicionamento da Justiça Federal sobre o pedido, mas Dias Carneiro acredita que o Tribunal Regional Federal deve se pronunciar nos próximos dias, mesmo no recesso, por se tratar de uma “situação de urgência”. O representante da OAB acrescentou que não houve qualquer ato de violência ou de abuso registrado. O único registro mais grave foi o de um policial que “se exaltou com dois estudantes, mas não passou disto”. Ainda assim, segundo o jurista, a suspensão do abastecimento de água pode ser considerada um tipo de abuso.
“Além de desmobilizar os estudantes, pode configurar como tortura. O governo do estado pediu reintegração de posse na Justiça, que foi negada. O juiz entendeu que não estão se apoderando do colégio, e se governo corta água, energia está impedindo o movimento. Pelo que vimos não há degradação. Os estudantes estão cuidando das escolas”.
Críticas
Em novo manifesto, os alunos reforçam as críticas à decisão do governo. Para os estudantes, a mudança na gestão das escolas significa uma terceirização e privatização do ensino público. O movimento classifica as organizações sociais de serem “máquinas de lucro mascarado com o apoio do governo.”
“A constante precarização da educação pública do Estado de Goiás, o fechamento planejado de escolas estaduais, a exemplo do Colégio Estadual José Carlos de Almeida, sob argumento de baixa procura de vagas, surge a necessidade por parte dos estudantes secundaristas do estado de Goiás, aliados a toda sociedade civil, de intervir na política educacional do governo do nosso estado para transformá-la em defesa do fortalecimento da educação pública, de gestão pública, gratuita, e de qualidade”, destaca a nota.
Os estudantes reclamam da falta de diálogo sobre as novas medidas. Segundo eles, a decisão foi tomada sem qualquer consulta ao movimento estudantil, aos trabalhadores da educação e qualquer outro segmento envolvido com o assunto.
Governo de Goiás
A Secretaria de Estado de Educação, Cultura e Esporte (Seduce) confirmou que o projeto de gestão compartilhada será iniciado no primeiro semestre de 2016, em 23 unidades educacionais da cidade de Anápolis (cerca de 60 quilômetros da capital Goiânia). “A Seduce ressalta, mais uma vez, que a escola estadual permanecerá pública e gratuita, sem cobrança de taxas ou contribuições e que os alunos não perderão o seu direito de disputar vagas nas instituições públicas de ensino superior por meio das políticas de cotas destinadas aos estudantes da rede pública”, disse em nota à Agência Brasil.
Conforme o governo, a transferência de gestão significará uma economia de 10% nas despesas de custeio. Hoje, o gasto mensal para manter um aluno na rede estadual é R$ 388,90. Com a mudança, esse valor cairá para R$ 350. Esse é o teto. Já o custo mínimo foi fixado em R$ 250.
A Seduce afirmou ainda que “sempre esteve aberta ao diálogo”, citando entrevistas à imprensa concedidas pela secretária Raquel Teixeira e encontros “para esclarecer a sociedade sobre o novo modelo de gestão” . Segundo a assessoria da pasta, integrantes da Seduce têm visitado as unidades ocupadas e respondido questionamentos feitos nas redes sociais. Nas audiências, participaram representantes do Fórum Estadual de Educação, União Estadual dos Estudantes, Conselho Estadual de Educação, Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Goiás (Sintego), União Brasileira dos Estudantes Secundaristas, Faculdade de Letras e Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás.
A assessoria não se manifestou sobre o corte no abastecimento de água.
O movimento de ocupação começou no dia 9 deste mês, no Colégio José Carlos de Almeida, em Goiânia; e a última unidade ocupada foi o Colégio Estadual Costa e Silva, em São Luís de Montes Belo, no interior do estado.
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