Responsáveis por cerca de um terço das ações em bolsas de valores movimentadas no mundo, os fundos de pensões têm sido cada vez mais cobrados por uma presença proativa nas empresas onde estão representados, especialmente no que tange à sustentabilidade. Por isso, de acordo com especialistas, nos próximos anos, as entidades do setor tendem a reduzir os valores investidos em atividades de alto impacto ambiental, como indústrias siderúrgicas, petroquímicas e mineradoras.
Um exemplo emblemático da pressão exercida sobre os investidores institucionais é o caso do Fundo Global do Governo da Noruega. Uma das maiores entidades do gênero em todo o planeta, depois de muitas cobranças da sociedade civil norueguesa, o fundo impôs a todos os empreendimentos nos quais investe uma série de exigências nas áreas social e ambiental.
Em artigo publicado no ano passado, o responsável pela área atuarial da BDO, Thiago Luiz Vincoletto, afirma que, além de obedecer a padrões socioambientais progressivamente mais rígidos, para continuar recebendo apoio financeiro dos fundos de pensão, cada vez mais as empresas deverão manter plena transparência em seus demonstrativos anuais. “A publicação de relatórios de sustentabilidade, por exemplo, é uma prática que vem ganhando relevância no mundo todo”, diz.
Nos últimos anos, os fundos já vêm demonstrando uma preocupação crescente com os temas socioambientais. A Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp) já realizou duas edições de um evento intitulado “A Sustentabilidade e o Papel dos Fundos de Pensão no Brasil”. De acordo com a Abrapp, saber mais sobre essa temática, discutindo-a profundamente, é importante não apenas para o conjunto do sistema, mas também para cada fundo, já que a pressão da sociedade em favor de uma gestão que respeite as pessoas e o meio ambiente não permite a nenhuma entidade manter-se à margem dessa tendência mundial.
O diretor da Damicos Consultoria, Fábio Rocha, disse no evento que os fundos de pensão respondem por mais de 17% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro e, por isso, devem estar comprometidos com os princípios e as melhores práticas de responsabilidade social, contribuindo de forma efetiva e, ao mesmo tempo, servindo de exemplo para as empresas e os demais investidores. “A sustentabilidade veio para ficar, como uma nova variável nos negócios, na sociedade e na gestão”, afirma Rocha.
Discurso x prática
Segundo Carlos Eduardo Lessa Brandão, especialista em governança corporativa e sustentabilidade e vice-presidente do Conselho de Stakeholders da Global Reporting Initiative (GRI), os fundos podem contribuir para a sustentabilidade ao incrementarem seus sistemas de governança. “Um exemplo de iniciativa nesse sentido poderia ser um maior estímulo para que as empresas investidas elaborem relatórios corporativos mais abrangentes, incluindo informações não-financeiras segundo as diretrizes da GRI”, diz o especialista.
“Seria um excelente passo para que o tema governança corporativa e aspectos socioambientais sejam tratados de forma integrada e estratégica pelas empresas, aumentando a chance de serem obtidos resultados financeiros com maior qualidade, com benefícios para as empresas, seus acionistas e a sociedade como um todo”, acrescenta.
Apesar de a sustentabilidade ser tema recorrente entre os investidores na atualidade, nem todos os fundos de pensão põem em prática o discurso teórico adotado pelas principais entidades. De acordo com a 10ª Pesquisa Econômica para Fundos de Pensão, os fatores sociais e ambientais não têm, hoje, qualquer influência sobre as estratégias de investimentos dos fundos para os próximos dois anos. O estudo, realizado pela Mercer em março deste ano junto a 45 gestores do setor, aponta que, para 46% dos entrevistados, somente daqui a cinco anos os aspectos ligados à sustentabilidade poderão exercer alguma influência em suas decisões.
Mais da metade dos participantes do levantamento foi ainda mais pessimista: para 51% dos gestores, os fatores socioambientais só serão, de fato, relevantes para as decisões de investimentos daqui a uma década. Para completar, 3% dos entrevistados acreditam que o tema nunca será levado em conta nos processos e estratégias de investimento dos fundos.
Grandes fundos Diretrizes de negócios
Da mesma forma que acontece em outros países, pressionados por setores da sociedade civil, alguns principais fundos de pensão brasileiros já tomaram decisões drásticas acerca de suas políticas de investimento. A Previ (fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil), que é o maior fundo de pensão do País, anunciou sua intenção de não participar de indústrias tabagistas e bélicas. Ao mesmo tempo, deixa claro que empresas presentes no Índice de Sustentabilidade da Bovespa (ISE) ou com projetos que proporcionem benefícios ambientais ou gerem créditos de carbono têm maiores chances de obter recursos.
Nos primeiros meses de 2010, outro movimento realizado por fundos de pensão brasileiros chamou a atenção do mercado para a nova postura desse importante segmento. No momento em que eram formados os consórcios que disputariam o direito de construir a usina hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu (PA), antes de aceitarem entrar na concorrência, os fundos Previ, Petros e Funcef, que são os três maiores fundos do País – todos signatários do PRI – externaram grande preocupação com a sustentabilidade do projeto.
Esse três fundos mantêm políticas e normas internas voltadas à sustentabilidade em seus investimentos. A Previ conta com uma Política de Responsabilidade Socioambiental destinada a orientar o fundo em todas as suas atividades e relações. A entidade também dispõe de um Código de Ética, que visa a engajar todos os participantes em um processo que tenha como meta a coerência ética nas ações e relações com os diversos públicos com os quais a instituição interage. Já a Petros baseia sua atuação em uma Política Interna de Responsabilidade Social e sustentabilidade. O documento, criado em 2004, determina transparência no cumprimento das atribuições do fundo e respeito à Declaração Universal dos Direitos do Homem, da Organização das Nações Unidas (ONU). Com representantes no Conselho de Administração de 15 empresas brasileiras, a Petros acompanha a gestão da sustentabilidade dessas companhias, verificando a aplicação da governança, a manutenção do negócio e os impactos socioambientais.
A Funcef, por sua vez, aprovou em abril de 2010 a criação de uma Comissão da Política de Responsabilidade Socioempresarial. Entre os valores defendidos pelo fundo estão a transparência, a ética e a equidade, essenciais dentro do contexto da responsabilidade socioambiental.
Fundos pequenos e médios Só o começo
Ao contrário dos maiores fundos de pensão do País, as entidades de médio e pequeno porte ainda tratam da sustentabilidade de forma incipiente. Entre as medidas consideradas essenciais à gestão socioambiental adotadas por alguns desses fundos estão os relatórios sociais, peças usadas para a divulgação das ações que extrapolam os aspectos financeiros.
Neste ano, o Infraprev – 42º maior fundo nacional – apresentou seu Relatório Anual dividido em duas partes (Atividades e Social). O Relatório Social foi produzido com base nos indicadores do setor financeiro da Global Reporting Initiative (GRI). Até o ano anterior, o fundo apenas relatava as ações sustentáveis desenvolvidas, na mesma publicação onde eram mostrados os dados econômicos.
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