Já são dez dias na prisão. Fábio Hideki Harano, servidor público de São Paulo, foi classificado como black bloc pelo secretário de Segurança Pública, Fernando Grella.
Segundo a Polícia Civil de São Paulo, ele praticava atos de vandalismo e portava explosivos durante o protesto contra a Copa no dia 23 de junho. Grella afirmou também que ele estava “incitando os manifestantes contra os policiais” na capital paulista.
Após ser revistado, o manifestante apontado como líder de quebra-quebra foi preso na Estação Consolação, na Avenida Paulista.
O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), saudou a ação policial. “Foi positivo, tanto é que não houve incidente. A polícia tem o dever de agir.”
Alckmin, Grella e policiais civis do estado estão enganados, segundo centenas de militantes, colegas e amigos de Fábio Hideki.
Vídeos que circulam na internet mostram, em diferentes ângulos, que ele não carregava consigo qualquer artefato. E não incitava violência contra os policiais.
O padre Julio Lancellotti, membro da Pastoral de Rua da Arquidiocese de São Paulo, testemunhou o momento da prisão. “Os policiais reviraram as coisas da mochila e não tinha nenhum explosivo”, contou, em entrevista ao Brasil Post. “Havia máscara de gás e vinagre, para ele se proteger de gás lacrimogêneo, pacote de salgadinho, garrafinha de água.”
Militante dos direitos humanos há mais de 35 anos, o padre conhece Fábio Hideki de outros protestos nas ruas de São Paulo. “É completamente descabido dizer que ele era líder da tática black bloc. As acusações de que ele é de uma milícia armada são delirantes”, critica.
Os policiais civis prenderam Hideki em flagrante por associação criminosa,posse ilegal de explosivo, incitação ao crime, desobediência eresistência a prisão.
É um currículo criminoso que não combina em nada com a biografia do servidor e estudante da USP, como mostra esta galeria:
Provas forjadas
O professor da USP Pablo Ortellado, que acompanha o caso do colega da instituição, opina que a prisão em flagrante foi falsa. “O flagrante foi absolutamente forjado; por sorte, a revista do Hideki foi filmada e há testemunhas”, afirmou ao Brasil Post.
Após esse episódio, a ONG Human Rights Watch, que defende os direitos humanos, alertou o Brasil para investigar denúncias de que provas foram forjadas para a Polícia Civil efetuar prisões em flagrante. “Manifestantes que cometem atos de violência e vandalismo devem ser responsabilizados. Mas isso também vale para policiais que forjam provas e acusam manifestantes de crimes que sabem não terem cometido”, argumenta a diretora da Human Rights Watch no Brasil, Maria Laura Canineu.
“A prisão de Fábio, enquanto não for completamente esclarecida, afeta toda a democracia brasileira”, analisa o advogado Pedro Abramovay, blogueiro do Brasil Post em artigo publicado nesta quarta-feira (2). “Se governantes, com medo de manifestações violentas, podem prender cidadãos que não cometeram crimes para dar uma resposta política, o Brasil deixa de ser um Estado de direito.”
Hideki na cadeia
Fábio Hideki Harano passou o aniversário de 27 anos na cadeia. Reportagem do site Ponte mostra que ele está sendo bem tratado pelos funcionários e detentos do presídio de Tremembé (SP), a 140 quilômetros da capital paulista.
Ele redigiu uma carta em que diz estar de “consciência completamente limpa” por não ter portado explosivos. Afirma que não tinha o que esconder. “Participar de manifestações com itens de proteção individual, como capacete, roupa grossa, vinagre e máscara de gás nem de longe é crime”, escreveu. “Aliás, além de manifestantes e repórteres, tais itens também são usados por policiais.”
A mensagem tem tom semelhante às declarações dadas por Hideki ao irmão, Alexandre Harano, no dia 27 de junho, em visita ao Tremembé.
#liberdadeparahideki
Mais de 40 coletivos e movimentos sociais apoiam a rede de solidariedade a Fábio Hideki Harano, criada por colegas e amigos do servidor. “Declaramos nosso repúdio à prisão arbitrária dele”, diz documento da rede assinado por entidades como o Movimento Passe Livre (MPL), o Greenpeace Brazil e o Comitê Popular da Copa.
Na internet, está disponível o abaixo-assinado pela libertação imediata de Fábio Hideki. Assinaturas individuais estão sendo coletadas em petição do Avaaz. Grupos podem assinar o documento pelo e-mail contato@liberdadeparahideki.org.
Prisão preventiva
Até a publicação desta reportagem, a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo não respondeu às questões do Brasil Post sobre a prisão de Fábio Hideki Harano e também de Rafael Marques Lusvarghi, outro manifestante tachado de black bloc pelo secretário Grella e preso na semana passada.
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) converteu o flagrante em prisão preventiva de ambos, apesar de serem réus primários. Segundo despacho do juiz, “a ordem pública estaria ameaçada” com a liberdade deles. A Defensoria Pública do Estado de São Paulo afirma que o magistrado ignorou depoimentos e provas favoráveis aos manifestantes presos.
A Defensoria entrou com pedido de habeas-corpus no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para a soltura imediata de Lusvarghi e Hideki.
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