O documentarista Caio Ferraz está com novo projeto. Trata-se de Volume Vivo, uma série de pequenos documentários que buscam explicar as causas e as soluções da crise de água em São Paulo. O intuito do trabalho é conscientizar a população sobre o assunto, tão em pauta nesses últimos dias. Com dois teasers lançados, na última sexta-feira (7), o projeto conseguiu finalizar a campanha de financiamento coletivo após 3 meses, com R$ 34.409, ultrapassando assim o valor estipulado de R$ 32 mil.
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Esta é a segunda vez que Ferraz volta ao tema água. Em 2009, ele dirigiu o documentário Entre Rios (http://vimeo.com/14770270), que mostra o modo como os rios de São Paulo foram tratados ao longo do tempo – muitos deles canalizados ou soterrados. A seguir, Ferraz fala à Brasileiros, além de seu novo projeto, da importância de a população redescobrir os rios da cidade.
Brasileiros – Muitos rios de São Paulo foram canalizados ou soterrados. Qual o peso desse fator na crise de água?
Caio Ferraz: É um processo histórico, na verdade a ligação da questão do soterramento dos rios dá relevância à questão do modo como lidamos e pensamos a água. Há uma relação direta entre eles, que diz respeito ao modo como lidamos com a água, porque se trata da lógica de querer esconder os sistemas.
E como você avalia a forma como as autoridades e a sociedade lidam com a água em São Paulo?
Historicamente, a água é vista como um problema. Em São Paulo, as bacias, as águas, os rios e mesmo as represas sofrem de uma lógica perversa, que busca sempre transpor a água de outras bacias. É uma lógica industrial, o modo como gerenciam a água, principalmente porque não a querem dentro da cidade e o problema é jogado para outros lugares. É muito irresponsável essa lógica, de excluir e esconder os rios, de deixá-los cada vez mais distantes. Isso gera um desligamento que evidencia como são as relações com a água no Estado de São Paulo. Mas, apesar da engenharia e da arquitetura já discutirem os processos de canalização e soterramento de rios limpos, eles ainda são vistos por todo canto, como na região da zona norte de São Paulo e no litoral.
O paulistano não tem uma relação com os rios da cidade. O que deve ser feito para reverter essa situação de afastamento?
As pessoas precisam descobrir que os rios foram soterrados, mas existem. Portanto, primeiro, precisa ter um processo de a sociedade entender o que é um rio, de que se trata de uma área mais baixa, o que é o leito natural das águas, por aonde ele vai sempre correr, e é impossível tirar um rio do seu lugar. Mas para que haja sensibilização, é preciso ter acesso à informação. Já o segundo processo seria a despoluição, pois enquanto houver rios que são vistos como esgoto, vai ser difícil as pessoas se religarem a eles. Nós temos uma lógica, uma mentalidade desenvolvimentista, em que o homem consegue moldar tudo, só que existem coisas que o homem não consegue moldar, isso precisa ficar claro, e o rio é uma delas. Um dos desafios é a despoluição e, para isso, é necessário um sistema de tratamento de água e de esgoto que garanta que os rios fiquem limpos. Dessa forma, as pessoas podem deixar de ver o rio como esgoto.
À época do lançamento de “Entre Rios”, em 2009, a cidade de São Paulo não sofria uma crise hídrica.
A questão da crise é alertada há 15 anos, já existem estudos que colocam a situação de risco de São Paulo, pela quantidade de água que temos em estoque para o tamanho da população. A partir de 2009, foram lançados outros documentários e projetos que debatem a questão dos rios ocultos, das avenidas em fundos de vales… Apesar de ganhar espaço, o assunto ainda não é prioridade. Há muitos agentes na regulação da administração da água, é um jogo complexo, entretanto o mais importante é que a sociedade civil se imponha e cobre ações diante da situação crítica de escassez.
Como tem sido a recepção e o interesse pelo seu projeto intitulado Volume Vivo?
Num primeiro momento tive muita dificuldade porque poucos queriam tratar do assunto durante as últimas eleições. Isso atrasou a discussão. Mas agora surge um interesse maior. Foi lançada a Aliança pela Água, em São Paulo, projeto apoiado por ONGs e entidades. Mas com a chuva, há um grande risco das pessoas acharem que a situação da crise está estável. É o momento de discutir o assunto.
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