Integrantes do conselho de política penitenciária pedem renúncia coletiva

Fotos: Rodrigo Freitas / Fotos Públicas (23/10/2013)
Fotos: Rodrigo Freitas / Fotos Públicas (23/10/2013)

Sete integrantes do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), dentre eles o presidente do órgão, Alamiro Velludo Salvador Netto, enviaram nessa quarta-feira (25) um pedido de renúncia coletiva ao ministro da Justiça, Alexandre de Moraes. Com críticas à atuação do governo federal em relação à crise prisional deflagrada no país desde o início do ano, os especialistas na área reclamam que o conselho tem sido desprezado nos últimos meses e apontam “vícios de compreensão e caminhos equivocados” na condução do tema pelo governo.

Instalado em 1980, o CNPCP é responsável pela elaboração de políticas criminais e penitenciárias, por avaliar periodicamente o sistema prisional e estabelecer regras sobre a construção de estabelecimentos penais.

Em uma carta na qual se desligam do CNPC em caráter “definitivo e irretratável”, os conselheiros discordam da forma como foi apresentado o Plano Nacional de Segurança Pública, lançado pelo presidente Michel Temer no início do ano.

Eles afirmam que o ato que culminou com a decisão pela renúncia coletiva foi a publicação de uma portaria, assinada pelo ministro Alexandre de Moraes, aumentando o número de integrantes do conselho. De acordo com os conselheiros, as novas vagas são uma “nítida mensagem de desconfiança” e transformam o CNPCP em “espaço endossatário das políticas”.

Para o advogado criminalista e doutor em ciências penais pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Leonardo Yarochesky, um dos conselheiros que assinam a carta, a situação de “desrespeito completo vem desde o ano passado”. Segundo ele, a nomeação por critérios políticos faz com que o órgão perca sua autonomia. O conselho era composto por 18 integrantes e passou a ter 26 membros, após autorização do ministro.

“Esse papel de subserviência, é preciso dizer, não condiz com a história de quase quatro décadas do CNPCP e, principalmente, com a missão institucional que ocupa o mais antigo conselho do Ministério da Justiça. Não podemos, portanto, permanecer”, escreveram os conselheiros no documento entregue hoje ao Ministério da Justiça.

De acordo com Yarochesky, outra atitude que desagradou os conselheiros foi a destinação de verbas do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen) – que devem ser empregados exclusivamente em casas de detenção – para atividades de segurança e compra de armas, sem que o conselho fosse consultado.

Na carta de renúncia, os conselheiros criticam a confusão entre política penitenciária e segurança pública.

“Comete-se o equívoco de confundir, como se tratasse de algo único, política penitenciária e segurança pública. Planeja-se a destinação de recursos e efetivo das Forças Armadas para cuidar de um problema prisional e social que é fruto da incapacidade congênita do País em lidar com suas unidades penitenciárias e com as facções internas que surgem como subproduto do próprio caos penitenciário e que passaram a retroalimentar, sob as barbas do descaso estatal, o ciclo de exclusão, violência e encarceramento. Não se pode tratar jovens pobres e brasileiros como inimigos, por definição, do Estado”, registram ainda na carta de renúncia.

Assinam o documento, além de Alamiro Velludo Salvador Netto e Leonardo Yarochesky, os conselheiros Gabriel Sampaio, Hugo Leonardo, Leonardo Costa Bandeira, Marcellus de Albuquerque e Renato Campos Pinto de Vitto.

Governo

Por meio de nota à imprensa, o ministério agradeceu o trabalho dos sete membros que pediram desligamento e justificou o aumento na composição do órgão como necessidade de “equalizar” o número de suplentes com a quantidade de titulares.

De acordo com a pasta, o fundo penitenciário, que vinha sendo “alvo de sistemáticos contingenciamentos”, foi utilizado “rigorosamente dentro” do seu escopo, que é, segundo o ministério, construção e equipagem de presídios.

O comunicado critica ainda a condução da política penitenciária do governo anterior e promete a indicação de novos conselheiros.

“O grupo que ora se despede identificava-se com a gestão anterior. O conselho passará, ao natural, por renovação, o que proporcionará melhor compreensão do dramático cenário herdado. O descalabro penitenciário não é de hoje, não tem oito meses, mas décadas. Claro, sobretudo, foi acentuado nos últimos 14 anos. O conselho tem papel relevante no enfrentamento da situação e, agora, poderá aperfeiçoar sua contribuição, não apenas no diagnóstico da situação, mas, também, com medidas efetivas e corretivas”, afirmou a assessoria de imprensa da pasta.

Apoio ao ministro

À noite, cinco integrantes do CNPCP que permaneceram no órgão manifestaram publicamente apoio ao ministro Alexandre de Moraes. Em nota publicada no site do ministério, eles lamentam a saída dos colegas e criticam o que classificaram de tentativa de politização do conselho como resultado de “inconformismo com os novos rumos pelos quais o país vem se orientando”.

De acordo com os cinco conselheiros, a existência de dissidências e visões discrepantes são naturais em um colegiado plural e “sempre foi respeitada pelo ministério”. Em resposta às críticas dos colegas de que o aumento na composição do órgão foi uma tentativa de Alexandre de Moraes de nomear pessoas “subservientes” ao governo, eles afirmam que distorções foram corrigidas e que, com as mudanças, o CNPCP vai ampliar sua atuação.

“Expressam seu apoio ao Ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, ao Plano Nacional de Segurança, que pela primeira vez se mostra como um modelo de gestão de política penitenciária e de segurança pública, bem como à formulação do decreto de indulto de 2016, que trouxe maior rigor no tratamento dos presos perigosos e autores de crimes graves, enquanto tratou de forma pioneira a possibilidade de indulto aos casos de tráfico privilegiado e, pela primeira vez, consignou expressamente a necessidade de encaminhamento ao sistema de saúde dos beneficiados que estivessem cumprindo medida de segurança”, diz o comunicado assinado pelos conselheiros Aldovandro Fragoso Modesto Chaves, André Luiz de Almeida e Cunha, Fernando Pastorelo Kfouri, Roberto Teixeira Pinto Porto e Ulysses de Oliveira Gonçalves Júnior.

No texto, os cinco conselheiros também prometem “continuar lutando para a formulação de uma política criminal séria” que repreenda os que cometeram crimes graves e invista em políticas de desencarceramento para quem não representa “risco à ordem e à segurança pública”.


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