O ministro da Justiça ganhou dez dias de prazo para “explicar” como chegou ao seu conhecimento o conteúdo da Operação Lava-Jato que seria divulgado ao longo da semana. Não carece.Sabemos que o grupo em posse do poder Executivo não aguenta mais uma defecção – no sentido culto e no sentido escatológico do termo.
Portanto, a anunciada retratação nunca vai ocorrer e a mídia tradicional não vai cobrar uma explicação do atrapalhado ministro. Por uma razão muito simples: sua inconfidência, cometida numa reunião com apaniguados na cidade de Ribeirão Preto, vazou para as redes sociais por iniciativa de um operador da Agência Brasileira de Informação, mobilizado para dar um recado ao governo Temer. O recado é o seguinte: não mexam com a comunidade.
Acertados os termos da politica de não ingerência no ecossistema da bisbilhotagem – que, evidentemente, cumpre um papel essencial no Estado contemporâneo -, o ministro pode retomar seu papel de articulador entre o grupo que amarra o pacote chamado Lava-Jato e o consórcio que se apossou do Planalto.
Se tivesse que explicar alguma coisa, o ministro da Justiça teria dificuldades para dissimular as evidências de que há uma operação em curso para evitar que a cruzada contra a corrupção se aproxime dos corruptos aliados do atual governo.
Basta ler o noticiário, atentando para a sequência dos personagens que se apressaram em atestar a lisura das investigações e comparar com a lista dos acusados que nunca foram molestados pela força-tarefa da Lava-Jato.
Tudo isso está disponível para quem estiver disposto a fazer uma leitura crítica da mídia tradicional.
Mas sabemos que o midiota sofre um bloqueio mental que o impede de absorver tudo que possa contrariar suas convicções. E, como é público e notório, o sistema da Justiça parece considerar mais relevante cuidar de convicções do que de provas.
O que há por trás desse processo no qual uma estranha harmonia coloca em absoluta sintonia procuradores e julgadores, anulando o contraditório?
Por trás da crescente emasculação da advocacia, que não tem a menor chance de fazer valer seus argumentos e suas evidências, contra a convicção de acusadores e julgadores, o que há é a desconstrução do Direito.
Essa é a característica visceral do fascismo: a destruição das sutilezas, a imposição de uma visão homogênea das questões públicas, a construção de uma narrativa imune a contestações.
As instituições da República brasileira estão imersas nesse ambiente de insanidade, em que a política deixou de ser a alteridade, ou seja, a interação de contrastes, para se transformar na imposição do discurso e da ação monocórdica em favor do retrocesso.
Esse processo só se consolida com a omissão ou o ativismo de grandes parcelas da sociedade.
A mídia tradicional, operadora e controladora desse processo, estimulou o ativismo e as manifestações ruidosas quando lhe foi conveniente.
Agora, precisa que a legião dos midiotas volte a compor as minorias silenciosas, para que o assalto às conquistas democráticas se consolide.
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