Mercado interno faz o Brasil ascender entre as maiores economias

O terceiro painel do seminário Rumos da Economia Brasileira colocou em debate os caminhos que o Brasil terá que percorrer para alcançar a sonhada posição de quinta maior economia do mundo. O painel reuniu o economista e pesquisador Haroldo Torres, diretor da consultoria Plano CDE; o empresário Rogério Amato, presidente da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) e da Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo (Facesp); o executivo Rômulo de Mello Dias, diretor-presidente da administradora de cartões de crédito Cielo, e o professor Samuel Corrêa, sócio da Tendências Consultoria Integrada.
Estudos feitos pelo economista e demógrafo com doutorado na Unicamp e especialização em Harvard, Haroldo Torres, mostram que o Brasil passa por um momento de grande mobilidade social e distribuição de renda, com uma profunda redução de famílias das classes D e E com um crescimento na classe C e, em menor ritmo, na B.
Para fazer essa pesquisa, o economista tomou como base as informações da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad), de 1992 a 2009, elaborada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). “Hoje, a classe C tem praticamente um terço do dinheiro disponível para consumir”, exemplifica. Esse grupo, formado por 8,6 milhões de famílias em 1992, saltou para 20,1 milhões de famílias em 2009.

Em relação à renda, houve uma diminuição da participação da classe A, a partir de 1995, quando respondia por 35% do total da renda, para 30% em 2009. No mesmo período, a classe C cresceu de 26% para 31%. Esses dados mostram que houve uma melhor distribuição do dinheiro disponível na economia.
Para o longo prazo, enquanto o número de famílias deve subir de 58 milhões em 2009 para 65 milhões de famílias em 2015 e 69 milhões de famílias em 2020, a classe E vai perder participação e até mesmo ter queda no número absoluto de famílias, indo de 12,6 milhões de famílias em 2009 para 11,7 milhões de famílias em 2015, repetindo o número em 2020. Também a classe D deve perder quantidade absoluta no período, indo de 15,8 milhões de famílias em 2009 para 15,3 milhões de famílias em 2015, repetindo o número em 2020.

Já as das classes D e E deverão ficar quase estagnadas, indo de 29,1 milhões de famílias em 2004 para 28,4 milhões de famílias em 2009, prosseguindo a queda para 27,0 milhões de famílias em 2015, e enfim, estabilizando em 27,0 milhões de famílias nos cinco anos seguintes, até 2020.
Por sua vez, a classe C deverá ser catapultada de 20,1 milhões de famílias em 2009 para 25 milhões de famílias em 2015 e 28,7 milhões de famílias em 2020. A classe B também deverá, no período, ir de 6,5 milhões de famílias em 2009 para 8,5 milhões de famílias em 2015 e 9,1 milhões de famílias em 2020. Já a classe A cresce de 3,3 milhões de famílias em 2009 para 4,2 milhões de famílias em 2015 e 4,6 milhões de famílias em 2020.

Emprego formal induz expansão das classes B e C

HAROLDO TORRESEconomista e demógrafo com doutorado na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e especialização na Universidade de Harvard. Há 25 anos trabalha em projetos para o público da “base da pirâmide” junto a organismos internacionais, governos e empresas. No setor privado, desenvolveu projetos nas áreas de educação financeira, varejo, investimentos, cartões, construção, business to business (B2B) e bebidas. No setor público, junto ao Ipea, Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (UNDP), Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), Sabesp, Secretaria de Educação de São Paulo, Ministério da Educação, Ministério do Desenvolvimento Regional e Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI/BA).

Os números apresentados por Torres corroboram as previsões de que a mobilidade social tende a manter um movimento parecido com o atual, em que registra crescimento da classe C, estabilidade na base (classe D) e um pequeno acréscimo no topo (classes A e B). Segundo ele, o crescimento sistemático do emprego formal entre 2002 e 2009 induziu a rápida expansão das classes B e C.
A transformação da clássica massa de pobres do Brasil em um grupo minoritário em termos relativos, segundo Torres, se dá com nítida concentração regional e em camadas da população protegidas por políticas sociais. Porém, alerta, os grupos muito pobres e de baixa escolaridade terão cada vez menos chance de encontrar inserção produtiva, em função da maior sofisticação da economia e das maiores demandas educacionais por parte dos empregadores.
O pesquisador observa um fenômeno significativo: 40% dos jovens não estão concluindo o ensino médio no Brasil. “Essa é uma geração que não vai ter emprego nenhum no setor formal. É um pedaço da população brasileira que está ficando para trás. Faz sentido ter um olhar para esse grupo de jovens que não vai conseguir chegar lá. Por isso, é fundamental a presença de políticas sociais para dar alguma condição para esse grupo viver”, afirma.


A melhora na distribuição de renda também é uma tendência no longo prazo. Os estudos do economista mostram que, em 2030, o Brasil poderá ter um Coeficiente de Gini de 0,48%, próximo ao registrado pela Argentina em 2006. Em um cenário mais otimista, o coeficiente poderá ficar próximo do índice dos Estados Unidos, em 2000, que era de 0,408%. O Coeficiente de Gini é um indicador utilizado universalmente para medir a distribuição, e, no caso da renda, o número mais próximo de 1 indica maior concentração, e o mais próximo de zero indica distribuição mais justa com as classes de menor renda.


As consequências dessa evolução serão o crescimento da capacidade de consumo, principalmente pelas classes B e C, a aproximação do perfil de consumo brasileiro ao registrado em países desenvolvidos. O grupo de pobres brasileiros tende a ser minoritário, concentrado em regiões e protegido por políticas sociais. No entanto, a baixa escolaridade dificultará ainda mais o acesso ao mercado de trabalho em uma economia sofisticada e que exige níveis elevados de qualificação e educação.
A mobilidade social brasileira, segundo a análise de Haroldo Torres, resulta da combinação de cinco fatores: aumento do emprego formal; evolução modesta, embora contínua, dos indicadores educacionais; modernização da agricultura, com queda nos preços dos alimentos; ampliação das políticas sociais, com a transferência de renda; aumento real do salário mínimo; e redução da taxa de fecundidade, especialmente nas Regiões Norte e Nordeste. A significativa queda da fecundidade libera a mulher para o mercado de trabalho e permite às famílias investir mais na educação de cada filho, explica o economista.

 

Crédito é um fator de inclusão

RÔMULO DE MELLO DIASDiretor-presidente da Cielo S/A, desde junho de 2008. Formado em Economia pela Universidade Federal Fluminense, com MBA e pós-graduação em Desenvolvimento Gerencial Executivo pelo Ibmec. Foi diretor estatutário do Bradesco BBI e da Bradespar e atuou também como diretor executivo do Citibank, entre outras empresas. Foi sócio gerente da Albion Alliance Capital e membro do Conselho de Administração da Vale, Valepar, Escelsa, Enersul, Net, Americel, Telet, Iven, Visanet, Monteiro Aranha, Visa Vale e CPM.

Para o diretor-presidente da Cielo, Rômulo de Mello Dias, a expansão do crédito foi um dos principais fatores de expansão do aumento de consumo das famílias. O volume de crédito no Brasil, segundo ele, vem registrando uma expansão média de 21% ao ano desde 2002 e alcança atualmente 46,4% do PIB.
Se esse dado for desmembrado apenas para as pessoas físicas, a evolução média foi maior, 26% ao ano. Os meios eletrônicos de pagamento por meio de cartões foram responsáveis por 25% desse movimento. “O uso do cartão fomenta a inclusão social e reduz a informalidade” , afirma.
Mello Dias também apresenta uma projeção de crescimento do Brasil comparado com outros países e formula a hipótese de ascensão da economia brasileira para a quinta posição no cenário mundial. Mostra que o Brasil já evoluiu da 13ª posição em 2002 para a 7ª posição em 2010.
A expectativa é que o País assuma o quinto lugar no ranking mundial até 2015, bastando para isso que se confirme a tendência de ser o terceiro país com maior crescimento entre os maiores do mundo, mantendo uma taxa média de crescimento de 5,8% ao ano nesse período, ficando atrás apenas da China, com crescimento médio anual de 9,5% no período, e da Índia, com média de 8,1% ao ano.
Mas, se, por outro lado, o Brasil crescer a uma taxa média anual de 4% ou até mesmo 4,5% ao ano, vai continuar na mesma posição de hoje, e pode até mesmo cair para a oitava posição se for ultrapassado pela Índia, que vem apresentando crescimento superior ao da economia brasileira.

Benefício para população de menor renda resulta em equilíbrio político

SAMUEL PESSÔADoutor em Economia pela Universidade de São Paulo (USP), sócio da Tendências Consultoria Integrada em São Paulo, consultor do Centro de Crescimento Econômico do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas no Rio de Janeiro (IBRE/FGV), onde foi professor assistente da Escola de Pós-Graduação em Economia até março deste ano. Autor de diversos artigos acadêmicos sobre temas ligados ao desenvolvimento econômico, publicados em livros e revistas nacionais e internacionais.

Segundo o economista Samuel Pessôa, doutor em Economia pela Universidade de São Paulo (USP), ex-professor da Fundação Getulio Vargas, no Rio de Janeiro, e sócio da Tendências Consultoria Integrada, a renda das classes sociais desfavorecidas tem crescido a uma velocidade muito maior que o crescimento do PIB: “E é isso que faz com que haja um equilíbrio político. porque a maior parte da população está se beneficiando”.
Pessoa afirma que: “Nós estamos naquele período em que os demógrafos chamam de bônus demográfico, no qual a participação da população econômica em idade ativa da população total é máxima. É o período que tem menos crianças para cuidar e ainda não somos muito velhos. É um período propício para uma taxa de poupança máxima”.
Ele observa que outros países nessa situação têm taxa de poupança de 35% do PIB, e o Brasil só alcança 17%. “Uma economia que investe mais do que poupa gera uma demanda por serviços, e serviços não se consegue importar, só se consegue importar bens. Por isso, temos de absorver poupança externa, e só conseguimos absorver poupança externa na forma de bens”, explica.


Para o economista, o resultado das eleições de 2010 mostra que a sociedade não quer reduzir a carga tributária e opta por manter uma rede de bem estar social por meio da universalização da Saúde e Educação, da manutenção do sistema de Previdência e aumento do salário mínimo. “Não acho que o estado brasileiro seja perdulário. O que podemos discutir é a oportunidade ou a rubrica do gasto público, mas estamos perante um padrão de escolha social”, afirma.
Ele diz que quanto mais a classe C crescer menos pessoas terão necessidade de se abrigar no guarda-chuva do setor público. Mas indaga: como manter a competitividade internacional com uma carga tributária como a brasileira? Para o economista, perante as escolhas da sociedade, o que se pode fazer é simplificar a estrutura tributária e unificar a legislação de ICMS, por exemplo. “Muitos impostos indiretos geram um custo elevado de compliance.”

Pequenas e médias empresas são mais afetadas pela estrutura tributária

ROGERIO AMATOPresidente da Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo (Facesp) e da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), empossado em março deste ano. Foi secretário de Assistência e Desenvolvimento Social do Governo do Estado de São Paulo (2006-2009). É presidente do Conselho de Administração e sócio da Springer S/A; sócio e diretor da Otamar Empreendimentos Imobiliários e Participações Ltda.; membro do Conselho Consultivo da Ziemann Liess Máquinas e Equipamentos Ltda. É graduado em Administração de Empresas pela Fundação Getulio Vargas São Paulo, com vários cursos de extensão e especialização.

A estrutura tributária é uma forte preocupação do presidente da Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo (Facesp) e da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), Rogerio Amato. As pequenas empresas, que formam a maioria dos associados das duas entidades, ainda estão despreparadas para lidar com a competição internacional e até mesmo com a fiscalização tributária. “É inegável que as empresas brasileiras estão perdendo mercado. A Associação Comercial atende preferencialmente às pequenas e médias empresas. E elas estão em situação complicada.”
A antecipação tributária e a informatização obrigaram as empresas de pequeno porte cair em uma disputa de mercado sem a necessária preparação. “A indústria, hoje, está sentindo brutalmente a competição da China. A produtividade tem limite”, afirma.
Para o futuro, Amato considera essencial uma atenção à juventude, com o incremento de programas de educação para o trabalho. “As cidades brasileiras não estão preparadas. Avaliar esse cenário e elaborar um projeto conjunto com as empresas para que as pessoas tenham uma vida útil é uma das tarefas que levam o Brasil ao posto de quinta economia do mundo”, diz.


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