“O que a Dilma fez, o FHC fez e o Lula fez também”, diz Requião sobre ‘pedaladas’

Voz quase única no PMDB: "A Dilma da campanha me representava melhor" - Foto: EBC
Voz quase única no PMDB: “A Dilma da campanha me representava melhor” – Foto: EBC

O noticiário amanheceu na quinta-feira (8) estampando o parecer negativo do Tribunal de Contas da União (TCU) às chamadas “pedaladas fiscais” – o pretexto mais próximo da legalidade encontrado pela oposição para votar o impeachment da presidenta Dilma Rousseff. O que quase ninguém lembra é que as mesmas pedaladas foram dadas por Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva.

Quem explica à Brasileiros o que são essas pedaladas é uma daquelas raras exceções do PMDB, o senador Roberto Requião (PR):  “Pense em uma família que paga as contas em dia. De repente a filha do casal sofre um acidente e quebra a perna. Como os hospitais cobram caro, os pais optam por atrasar algumas contas para cuidar da filha. O governo não fez nada mais do que isso: Atrasou alguns pagamentos para investir em saúde, educação, infraestrutura.”

Mas para o mercado financeiro e para a oposição o que houve foi um crime. Dilma, no entanto, erra também, diz Requião. Errou ao fatiar o governo ao PMDB em sua reforma ministerial. “É o mercado persa funcionando na Câmara. São parlamentares que não gostaram de ver alguns de seus colegadas premiados com cargos na reforma ministerial.”

Mas, então, por que não deixar o partido? “Porque não há alternativa. Olha o que aconteceu com o PT.”

Leia, abaixo, a entrevista completa:

Revista Brasileiros – Qual a sua opinião sobre a obstrução do Eduardo Cunha à votação dos vetos da chamada “pauta-bomba” da presidenta?

Roberto Requião – É o mercado persa funcionando na Câmara. São parlamentares que não gostaram de ver alguns de seus colegadas, e não eles, premiados com cargos na reforma ministerial. Isso só ocorre na ausência do um projeto nacional.

É a falta desse projeto a razão da crise?

Falta um projeto nacional, mas a razão principal para a crise tem origem econômica. O ajuste fiscal causa desemprego brutal, fecha lojas, sobe preços. O resultado é que a Dilma perdeu o apoio de quem a elegeu. A política do [ministro da Fazenda Joaquim] Levy é uma estupidez, fracassou na Grécia, em Portugal, na Europa inteira.

E por que esse método é adotado no Brasil?

É por causa do domínio absoluto do capital financeiro, que se baseia em outro tipo de tripé: enfraquecimento do Estado, todo o poder aos técnicos do Banco Central e o fim da CLT [Consolidação das Leis do Trabalho]. Os políticos se tornaram prepostos das empresas. O que eles vêm tentando aprovar no Congresso é que os acordos firmados entre trabalhadores e empresários valham mais do que a lei. Estabelecer algo assim em tempos de demissão é uma covardia com o trabalhador.

O que está por trás desse desmonte estatal?

É o fim do estado social, que surgiu no mundo após a derrota do nazismo. Agora é o momento da reação do capital financeiro, no aviltamento do Estado. Isso começa com a “independência” dos bancos centrais.

O que senhor achou do parecer do TCU, contrário às chamadas “pedaladas fiscais”?

O que a Dilma fez, o FHC fez e o Lula fez também. O que aconteceu foi o seguinte: Nós temos uma meta de inflação fixada por lei. Ela é uma imposição do capital financeiro. Ao não atingi-la, o mercado restringe os empréstimos e aumenta os juros. Pense em uma família que paga as contas em dia. De repente a filha do casal sofre um acidente e quebra a perna. Como os hospitais cobram caro, os pais optam por atrasar algumas contas e cuidar da saúde da filha para, então, renegociar a dívida. O governo federal não fez nada mais do que isso. Atrasou os pagamentos para investir em saúde, educação, infraestrutura. Não houve nenhuma apropriação indébita de recursos. O que houve foi maquiagem na meta de superávit, um alarme colocado pelos bancos.

Como será o seu voto na sessão conjunta do Congresso?

Eu vou analisar com a perspectiva do interesse nacional. Não estou eximindo essas pessoas de suas responsabilidades, mas a medida não foi inapropriada para o momento.

O senhor acredita que a rejeição de contas pode disparar o impeachment?

Não. Não há esse interesse. O que existe é esse jogo do capital financeiro à custa da desgraça do Brasil. Na próxima terça-feira (13), no meu gabinete, um grupo de economistas vai apresentar um plano alternativo de crescimento.

E o que o senhor vem achando do comportamento da presidenta nessa crise?

Ela não está levando em conta nada disso. Não entendo o comportamento da vossa excelência. Gostaria de outra política econômica e de outra Dilma. A Dilma da campanha me representava melhor.

O senhor não acha que ela perdeu a chance de mudar o rumo do governo em sua recente reforma ministerial?

Ela perdeu, o Lula perdeu também. Perdemos a oportunidade de executar um projeto nacional.

A crise tem trazido de volta a discussão do projeto de lei do senador José Serra (PSDB) que pretende retirar da Petrobras a participação exclusiva no pré-sal. O que o senhor acha?

É o jogo da internacionalização iniciado nos anos 1990 pelo Fernando Henrique, que se sustenta na dependência aos países estrangeiros.

O PMDB vem sendo cada vez mais criticado por seu comportamento no Congresso.

O problema é que o PMDB absorveu gente de todos os partidos. Abriu mão de sua visão original. Ele era o partido das classes populares, das mulheres, dos trabalhadores, das minorias. Mas isso foi tirado de seu estatuto em um desses congressos que eu não participei. O PMDB se transformou em um cartório para registro de candidaturas. Ele se associa a qualquer um para manter influencia.

Então por que não sair dele?

Por que não há alternativa. Não existe outro. São todos iguais. Olha o que aconteceu com o PT. O melhor partido ainda é o velho MDB de guerra e sua capilaridade pelo País.


Comentários

Uma resposta para ““O que a Dilma fez, o FHC fez e o Lula fez também”, diz Requião sobre ‘pedaladas’”

  1. Avatar de Fatima Sales
    Fatima Sales

    Acredito que esses políticos nunca procuraram saber o que diz a lei. E se houve irregularidades é culpa do Congresso. Vai ver que ele deixou de cumprir a LRF no governo dele.

    Dos Restos a Pagar

    Art. 42. É vedado ao titular de Poder ou órgão referido no art. 20, nos últimos dois quadrimestres do seu mandato, contrair obrigação de despesa que não possa ser cumprida integralmente dentro dele, ou que tenha parcelas a serem pagas no exercício seguinte sem que haja suficiente disponibilidade de caixa para este efeito.

    Parágrafo único. Na determinação da disponibilidade de caixa serão considerados os encargos e despesas compromissadas a pagar até o final do exercicio.

    Art. 73-A. Qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato é parte legítima para denunciar ao respectivo Tribunal de Contas e ao órgão competente do Ministério Público o descumprimento das prescrições estabelecidas nesta Lei Complementar. (Incluído pela Lei Complementar nº 131, de 2009).

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