Em audiência pública na sede nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) nessa quarta-feira (14), o conselho federal da entidade, junto com representantes de institutos de direito previdenciário e conselhos de classe, criou a Frente em Defesa da Previdência, como contraponto à proposta de emenda à Constituição 287, que trata da reforma da Previdência.
Após quase 12 horas, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou na madrugada desta quinta-feira, por 31 votos a favor e 20 contra, o parecer do deputado Alceu Moreira (PMDB-RS) pela constitucionalidade da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287/16, que trata da reforma da Previdência. O governo teve dificuldades em aprovar a admissibilidade no colegiado. Durante a reunião, diversos partidos da base aliada se manifestaram contrários a pontos da proposta.
Além de representantes da OAB nos estados, participaram da reunião representantes da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Anfip) e da Confederação Brasileira de Aposentados, Pensionistas e Idosos (COBAP), entre outros convidados.
As entidades presentes definiram a criação de uma comissão técnica composta por advogados, economistas e atuários de diversos órgãos que devem redigir emendas para serem apresentadas a parlamentares e articular apoio no Congresso Nacional, na tentativa de frear alguns pontos da reforma nos moldes propostos pelo governo federal. Na avaliação do grupo, a proposta como está hoje atinge especialmente a população mais pobre.
Durante a reunião, o presidente da Anfip, Vilson Antonio Romero, disse que ao longo dos últimos 16 anos a entidade tem analisado as contas da Seguridade Social, que abrange Previdência, assistência e saúde, e defende que o governo está se baseando em um “suposto” déficit no sistema para promover a reforma. Ele destacou que em cerca de 80% das pequenas e médias cidades brasileiras, a economia local depende dos recursos da Previdência que são pagos à população.
“Não pode se tratar essa questão somente do ponto de vista atuarial, fiscal, orçamentário, porque isso interessa a 100 milhões de brasileiros”. Romero destacou que o fato de o brasileiro estar vivendo mais não é justificativa para adotar como exemplo a idade mínima fixada na Europa e em países escandinavos, que têm um índice de desenvolvimento humano muito superior ao Brasil.
“No Brasil, a gente sabe, por exemplo, que um trabalhador do sexo masculino no Pará tem a expectativa de vida de 64 anos. Portanto, com essa PEC condenaremos trabalhadores dessa região a morrerem antes de fazer jus ao benefício. O Brasil ainda é um país desigual.”, disse. O especialista defendeu avanços no que chamou de “o maior sistema de redistribuição de renda do país”, a seguridade social. Ele explicou que a proposta da Anfip e das centrais sindicais ao governo é que os ajustes necessários sejam feitos pela “coluna das receitas da Previdência Social”.
“Como o governo pode alegar que tem déficit um sistema que faz esmola com o chapéu alheio, que retira dos cofres para beneficiar o agroexportador, o pequeno e micro empresário, a filantropia. Só neste ano foram R$ 70 bilhões de setores da economia que pagam de forma diferenciada, que são isentos ou trocaram a contribuição da folha pela do faturamento.”, completou.
Posicionamento da OAB
Pela manhã, o presidente nacional da OAB, Claudio Lamachia, divulgou nota em que argumenta que a proposta de reforma da Previdência apresentada pelo governo preocupa a Ordem e aponta para sério retrocesso nas conquistas dos direitos sociais garantidos na Constituição de 1988.
“São muitas as controvérsias jurídicas em torno das mudanças sugeridas, como as polêmicas sobre a existência ou não de um déficit da Previdência, sobre a concessão de isenções e renúncias fiscais, sobre a gestão da dívida pública e a Desvinculação das Receitas da União (DRU)”, destacou.
Segundo Lamachia, não se pode criar regras “excessivamente duras e que reduzem as chances de o trabalhador usufruir do benefício pelo qual paga”. “Além das controvérsias no campo do direito, também existem divergências com relação à PEC nas áreas contábil e de gestão pública. Associações de auditores da Receita Federal, especialistas nos mecanismos de arrecadação e destinação da verba pública, têm alertado para inconsistências. Uma delas é que a arrecadação permite cobrir as despesas com as aposentadorias, mas o fato de o dinheiro ser desvinculado [aquele que não precisa ser obrigatoriamente gasto para a finalidade original] permite seu uso para outras despesas, como pagamento da dívida pública”, argumentou
Lamachia destacou que a OAB não nega a necessidade de mudanças no sistema previdenciário, mas defende que a sociedade seja esclarecida sobre as possíveis escolhas e as consequências de cada uma. “As instituições da República precisam cumprir o papel que a lei lhes atribui na fiscalização do correto cumprimento da Constituição. E as entidades civis precisam se envolver neste debate, de forma pacífica e democrática, para que, ao fim do processo, o país tenha um sistema mais justo e eficiente, não uma lei retrógrada.”, concluiu.
Durante a tarde, Claudio Lamachia foi à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), da Câmara dos Deputados, para requerer a suspensão da tramitação do projeto até que o tema seja melhor debatido.
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