Três dias após a terceira manifestação pedindo intervenção militar no Brasil, a prefeitura de São Paulo inaugurou, na tarde desta segunda-feira (8), o primeiro monumento do País em homenagem aos mortos e desaparecidos políticos da ditadura (1964-1985), em um evento em uma das entradas do Parque do Ibirapuera, onde está instalada a obra. Durante a cerimônia, que teve a presença de autoridades e familiares de vítimas do regime militar, a existência do desejo de retorno ao anos de chumbo foi um dos temas principais.
No momento mais emocionante do encontro, a ministra da Secretaria dos Direitos Humanos da Presidência, Ideli Salvatti, cantou trechos de duas músicas relacionadas ao período: Réquiem para Matraga, de Geraldo Vandré, e Pesadelo, de Maurício Tapajós e Paulo César Pinheiro. “Quando a gente acompanha o aparecimento de manifestações, palavras e atos pedindo a intervenção militar, ficamos sobressaltados, porque, podem ter desinformados, pessoas sem conhecimento do que foram aqueles anos, mas, com certeza, tem muita gente com intenções ruins querendo a volta da ditadura”, disse Ideli. “É preciso preservar a história para que as futuras gerações saibam o que foi e não voltem a cometer este erro”, completou ela.
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O prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, último a discursar no evento, também hostilizou os pedidos de intervenção militar das últimas manifestações. “Eu fico vendo as pessoas saindo às ruas e pedindo o retorno dos militares e eu, quando vejo o meu filho, que tem 22 anos, fico pensando o que essas pessoas estão reivindicando, porque ele tem os ideais libertários que eu tinha nesta idade e que mantenho até hoje, aos 51 anos. Então, fico pensando: o que seria da minha família se a gente perdesse o Frederico [filho de Haddad] por causa dos ideais dele. O que seria das nossas vidas? Hoje, portanto, eu tenho uma pálida noção do que foi a ditadura”.
O prefeito também recordou que os quartéis de repressão do regime ficavam em locais próximos ao que hoje está o monumento. “Esta obra está em um lugar estratégico para São Paulo, não apenas porque é visitado por gente de todos os bairros da cidade, mas também porque ele está próximo da Rua Abílio Soares, da Rua Tutoia, ou seja, dos quartéis onde a repressão se deu e muitas mortes aconteceram”.
O senador Eduardo Suplicy, a fundadora da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, Maria Amélia Teles, o cantor Celso Sim, o secretário municipal de Direitos Humanos, Rogério Sottili e o arquiteto Ricardo Ohtake, que desenhou a obra, também passaram pelo microfone do evento. Na plateia, entre familiares (como Clara Charf, viúva de Carlos Marighella e Ivo Hergoz, filho do jornalista Vladimir Herzog) e a imprensa, podia-se notar as presenças do jornalista Fernando Morais e dos vereadores Gilberto Natalini (PV), Orlando Silva (PCdoB) e Eliseu Gabriel (PSB), além de secretários e embaixadores.
Monumento
A obra instalada no portão 10 do Parque do Ibirapuera foi desenhada por Ricardo Ohtake e projetada pela arquiteta Anna Ferrari em parceria com a coordenadora de Políticas de Direito à Memória e Liberdade, Carla Borges. Tem seis metros de altura e é formado por chapas brancas com os nomes de 436 mortos e desaparecidos políticos de todo o país, segundo o registro dos familiares. Outras chapas disformes representam as diferentes trajetórias desses resistentes. “O processo começou em meados de 2013, quando o Ricardo Ohtake apresentou o projeto aos familiares pela primeira vez e, ali, eu tive o primeiro contato com a ideia do monumento. Fui convidada pela Carla Borges porque eles precisavam de um arquiteto que passasse por todo o processo de aprovação, viabilização da obra em termos plásticos, e aí começamos a realizar o projeto: locais para instalação, os órgãos necessários…”, conta Anna. “Ficamos um ano trabalhando em tudo e agora, nas duas últimas semanas, chegamos ao final quando passamos a instalar a obra no local”, finaliza.
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