A Secretaria Especial de Direitos Humanos publicou o relatório elaborado pelo Subcomitê das Nações Unidas para Prevenção à Tortura (ONU/SPT) sobre a inspeção feita em presídios de quatro estados brasileiros em outubro de 2015. As conclusões foram enviadas ao governo brasileiro em novembro do ano passado e tornadas públicas nesta semana pela secretaria.
No relatório, os peritos alertam sobre a superlotação no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), em Manaus, que, na época da visita internacional, abrigava 1.203 presos, quando a capacidade suportava apenas 450. O documento destaca que a superlotação aumenta o nível de estresse e leva à competição por espaço e recursos limitados.
De 19 a 30 de outubro de 2015, cinco peritos do subcomitê da ONU passaram por 22 delegacias, prisões, centros de detenção provisória, instalações para adolescentes, hospitais penitenciários e instituições forenses de Brasília, Pernambuco, Rio de Janeiro e Amazonas, onde uma série de rebeliões vitimou 60 pessoas no primeiro dia deste ano.
Os peritos da ONU citaram ainda um caso ocorrido no complexo em 2002, quando 12 presos foram mortos. Eles alertaram que a superlotação poderia levar a incidente similar a qualquer momento. Alguns meses depois do alerta, o presídio foi palco de vários motins e 56 pessoas morreram em menos de 24 horas.
A integrante do Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU, Margarida Pressburger, que foi representante do Subcomitê de Prevenção à Tortura no Brasil até o mês passado, confirma que a situação dos presídios do Amazonas já tinha sido destacada pelos peritos.
“O comentário que ouvi deles sobre Manaus, em 2015, foi sobre a falta de segurança nos presídios. E a questão da segurança é um dos pontos mais observados pelo subcomitê. Os presos também precisam de segurança e ninguém se preocupa com isso. A população carcerária é invisível e indesejável. E o que gera esse tipo de crise é o tratamento desumano, além da questão de facções rivais serem colocadas juntas. Aí é guerra, eles se matam mesmo”, disse Margarida.
“Essa desgraça que ocorreu no Amazonas e em Roraima estava prevista, assim como em outras unidades do país. A situação penitenciária do Brasil é muito preocupante. Primeiro, porque a população carcerária é muito grande, maior do que o número de habitantes de muitas cidades, e segundo, pela situação precária em que os detentos são mantidos”, afirmou Margarida.
O relatório diz ainda que a superlotação nos presídios continuou sendo um problema no país, apesar das recomendações feitas pela ONU ao governo brasileiro no relatório da visita anterior, ocorrida em 2011 nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Goiás.
“O relatório é praticamente idêntico ao de 2011. Nenhuma das medidas sugeridas pela ONU foi adotada pelo Brasil. O país ignorou as recomendações do subcomitê”, disse a integrante do Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU.
O resultado completo da inspeção de 2015 foi apresentado de forma confidencial pela ONU ao Brasil em 24 de novembro do ano passado. O secretário do Subcomitê da ONU em Genebra, Joao Nataf, informou à Agência Brasil que o país tem, a partir desta data, seis meses para responder ao relatório, prazo que expira em maio.
Em resposta, a Secretaria Especial de Direitos Humanos afirmou que não vai se pronunciar e que o assunto está sendo tratado internamente no âmbito do Ministério da Justiça e Cidadania, ao qual a secretaria está vinculada. As respostas às recomendações da ONU estão sendo elaboradas junto a outros órgãos do governo.
As visitas de órgãos independentes, internacionais e nacionais, a locais de privação de liberdade seguem os parâmetros do Protocolo Facultativo à Convenção da ONU contra a Tortura (OPCAT), do qual o Brasil é um dos 80 países signatários. O protocolo estabelece um sistema de visitas regulares com a intenção de prevenir a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes no sistema penitenciário.
Apesar das conclusões e recomendações das inspeções do subcomitê serem enviadas de forma sigilosa, o Estado-membro é incentivado a dar publicidade ao teor dos relatórios e, em seis meses depois de notificado, deve apresentar suas respostas às recomendações da ONU. Caso o país não responda no prazo estabelecido, ele pode ser expulso do Protocolo.
*Com reportagem da Agência Brasil
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