Protesto que parou Santaluz foi mesmo contra a homofobia?

Foto: Uoston Pereira
Foto: Uoston Pereira

A Bahia é o segundo Estado onde mais se mata homossexuais no Brasil em números absolutos. Só perde para São Paulo. Santaluz, a 260 km de Salvador, estampa agora um cenário atípico. A pequena cidade do sertão baiano, que foi palco na semana passada do brutal assassinato de dois professores homossexuais, também viveu a maior manifestação de seus 81 anos de história na última segunda-feira, 13.

Uma multidão de cerca de seis mil pessoas vestidas de branco, ou 20% de toda a população de 32 mil habitantes, saiu às ruas para protestar contra a violência praticada aos professores Edivaldo Silva de Oliveira e Jeovan Bandeira. Seus corpos foram encontrados carbonizados dentro do porta-malas de um carro incendiado em Santaluz, no dia anterior ao ataque à boate gay Pulse, em Orlando (EUA), que deixou 50 mortes, incluindo a do autor dos disparos em massa.

Apesar das suspeitas de que tenha sido mais um crime de homofobia, a manifestação não foi convocada pela comunidade LGBT. Curiosamente, o ato foi organizado por entidades como a Secretaria Municipal de Educação, igrejas evangélicas e católicas, centros espíritas e membros da maçonaria. “Santaluz tem uma população LGBT razoavelmente grande, o pessoal aprendeu a respeitar e tolerar. Não temos essa tradição da violência contra homossexuais, não tenho lembrança de nenhum crime cometido por homofobia”, afirma o jornalista Uoston Pereira, morador da cidade. “O protesto foi grande porque os professores eram muito queridos. O ato não foi motivado pela comunidade LGBT, embora tenha havido reações individuais nesse sentido.”

Com placas pedindo o fim da violência, os manifestantes saíram em passeata a partir do colégio municipal onde os professores davam aulas. Durante o trajeto, fizeram paradas em frente ao fórum, à delegacia, à casa da mãe de Edivaldo, e encerraram o ato na Câmara Municipal. O corpo de Edivaldo, mais conhecido como Nino, identificado pela arcada dentária, foi enterrado na terça-feira. Sob forte chuva e comoção, a população acompanhou o caixão até o cemitério municipal.

Foto: Uoston Pereira/Site Notícias de Santaluz
Foto: Uoston Pereira/Site Notícias de Santaluz

O outro corpo ainda não foi identificado. Passa por exames, mas familiares acreditam ser o de Jeovan por que ele está desaparecido. Segundo Pereira, a tese de que o crime tenha sido cometido por homofobia não foi descartada, mas tampouco confirmada pela Polícia Civil. O inquérito ainda está em andamento. Em entrevista ao site Notícias de Santaluz, o irmão de Jeovan, Sival Lima, disse que  a grande mídia e entidades de defesa dos direitos LGBT estão “antecipando o julgamento” da morte dos docentes: “Temos de conviver com conclusões arbitrárias de alguns aproveitadores em prol de ideologias que sou a favor, mas desde que sejam baseadas em veracidade. Minha família vive momentos de horror. É sabido que, além da homossexualidade, existem denúncias que envolvem Nino sobre venda de drogas em uma escola”.

O fato é que a brutalidade do crime em Sataluz chocou a cidade e o País. A Prefeitura decretou luto oficial de três dias e anunciou o cancelamento dos festejos juninos na rede pública municipal de ensino. Na quinta-feira, 16, à tarde, integrantes do Grupo Gay da Bahia acenderam 200 velas nas escadarias da Catedral da Sé, em Salvador – uma homenagem às vítimas do atentado de Orlando e aos professores carbonizados.

Marcelo Cerqueira, presidente da organização, afirma que a população de Santaluz não tem um movimento LGBT organizado. “Mesmo assim, a população saiu às ruas para pedir o fim da violência e cobrar que os culpados sejam punidos. Mas dá para dizer que existe um viés homofóbico no ato porque toda a cidade sabia que os professores eram homossexuais”. 

O Centro Educacional Nicanor Tiburcio dos Reis (Centir), a Escola Municipal Antonio Nolasco da Silva e o Colégio Estadual Necy Novaes, localizados no distrito de Pereira, a 65 km de Santaluz, estão programando nova passeata na segunda-feira, dia 20, para homenagear os professores. “Faremos um ato pela paz, contra a violência. Em seguida, um ato simbolizando o sepultamento de Jeovan, que tem familiares no Pereira e morava aqui”, disse a diretora do Centir, Égila Silva, em entrevista ao site Notícias de Santaluz


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