A promessa bem que provocou polêmica em 2009, quando o ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab (PSD) e o então governador e pré-candidato à presidência José Serra (PSDB) posaram ao lado de Silvio Santos no Teleton daquele ano. No programa, criado para arrecadar verba para a AACD (Associação de Assistência à Criança Deficiente), Serra e Kassab prometeram entregar os terrenos em que construiriam e manteriam dois ambulatórios para a entidade.
Em frente às câmeras, Kassab garantiu que a prefeitura iria “ceder os dois terrenos a AACD”. Serra completou dizendo que o governo do Estado iria construir as duas unidades. O ex-prefeito, então, arrematou: “A prefeitura vai custear esses dois equipamentos. […] A prefeitura vai reembolsar repassando o recurso para as duas [unidades].” Sob aplausos, Silvio brincou: “Quando o Gilberto Kassab fala, ele diz. Quando o José Serra fala, ele assina.”
A prefeitura de fato cedeu os terrenos e o governo subiu os prédios, mas o dinheiro da manutenção nunca chegou aos cofres da entidade, que funcionou por quatro anos com dinheiro próprio até que precisou fechar as portas no último dia 30 de setembro.
Previstas para 2010, as unidades – uma na zona norte (Santana), outra na zona sul (Campo Grande) – só foram inauguradas no dia 19 de setembro de 2011, quando Kassab reafirmou a parte da promessa que, segundo a AACD, não foi cumprida: “A partir de agora, por meio de convênios, a prefeitura vai oferecer recursos às unidades.” O valor gasto todo o mês com os equipamentos chegava a R$ 500 mil, verba que nunca chegou nos 48 meses em que os ambulatórios funcionaram. Esse dinheiro pagaria as contas de luz, água e manutenção de equipamentos.
Sem os repasses, as unidades fecharam e 300 pacientes com algum tipo de deficiência foram realocados para a Mooca e Ibirapuera. “Nós mantivemos enquanto conseguimos, mas agora não teve mais jeito”, lamenta Angelo Franzão, superintendente da AACD para captação de recursos. Ele explica que, além de menos espaço para todos, a principal dificuldade enfrentada pelos pacientes remanejados é de “locomoção”, uma vez que os deslocamentos aumentaram para quem morava perto dos antigos ambulatórios: “Uma pessoa com deficiência física exige muitos cuidados”.
Com um orçamento anual de R$ 240 milhões, a associação mantinha 15 centros pelo Brasil, cinco em São Paulo. “Agora são três em São Paulo e 13 no Brasil”, contabiliza Franzão. De todo esse valor, o Teleton cobre uma fração, R$ 31 milhões na edição de outubro último. Embora não tenha dívida, a entidade precisa tapar, todos os anos, um rombo de R$ 60 milhões. É quando as campanhas de arrecadação ganham importância.
Procurada pela reportagem, a assessoria do ex-prefeito e atual ministro das Cidades argumentou que a condição para os repasses – não explícita na televisão – era que a AACD se transformasse em uma Organização Social (OS). “O então prefeito cumpriu a sua promessa e cedeu as áreas para a construção das unidades e encaminhou a proposta para a prefeitura bancar o custeio das unidades para a área técnica da Secretaria Municipal de Saúde”, afirma em nota. “Tecnicamente, a diretoria da AACD teria de se credenciar como OS para ser homologada pelo município para poder receber pelos serviços, conforme legislação vigente. Não podemos informar, no entanto, porque isso não ocorreu.”
Questionada, a AACD respondeu afirmando que essa necessidade não foi acordada quando o anúncio foi feito em rede nacional. “Naquele período não havia essa condição para o repasse de verbas”. Além disso, a mudança não ocorreu porque implicaria em alterações no estatuto da entidade. “Em respeito aos 65 anos de atividades da Instituição, preferimos nos manter fiel à nossa história.”
Diante do ocorrido, o Ministério Público abriu uma Ação Civil Pública em que pede à prefeitura a indicação de unidades aptas a prestar atendimento semelhante ao prestado pela AACD.
A Secretaria Municipal de Saúde aguarda posicionamento da Secretaria Estadual de Saúde quanto à formalização da transferência das duas unidades e dos equipamentos para o município, uma vez que foram custeados com recursos do governo estadual.
De acordo com a prefeitura, a Secretaria de Saúde “implantará dois Centros Especializados em Reabilitação nestes espaços, mantendo seu objetivo de reabilitação na medida em que o espaço passará a atender outras deficiências e beneficiará todas as faixas etárias, não somente a população infantil e jovem”.
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