As manifestações de alunos contra a proposta de reorganização das escolas estaduais em São Paulo mostraram uma nova força do movimento estudantil secundarista e evidenciaram a violência policial contra os adolescentes. De acordo com Ariel de Castro Alves, advogado e coordenador estadual do Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), mais de 10 jovens foram apreendidos e agredidos ilegalmente. Na opinião do especialista, alguns deles chegaram a ser torturados.
Para a Secretaria de Segurança Pública (SSP) do estado, a ação de desbloqueio da avenida aconteceu porque os manifestantes “desrespeitaram a Constituição Federal, deixando de realizar o prévio aviso sobre os locais onde iriam atuar e bloqueando integralmente as grandes vias de acesso, de maneira a impedir o legítimo direito de ir e vir de estudantes e trabalhadores”, afirmou, em nota.
O artigo 178 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) impede que menores de idade acusados de cometer ato infracional sejam transportados em compartimento fechado de veículo policial em condições que atentem contra a dignidade ou impliquem risco à integridade física ou mental do indivíduo sob pena de responsabilidade. Contudo, registros audiovisuais nas mídias sociais e na imprensa mostram diversos adolescentes sendo levados em camburões pela PM e até mesmo sendo algemados.
O estudante Francisco Musatti Braga, de 16 anos, da Escola Técnica de São Paulo ( ETESP), foi apreendido por policiais, levado em uma viatura para a 23ª DP, em Perdizes, sozinho e relata seu tratamento pelas autoridades como “intimidador”. Ele disse que um homem que estava detido na mesma delegacia teve que levar pontos na cabeça por ter sido atingido com um cassetete.
“Tudo aconteceu num momento de confusão quando liberamos uma faixa para passagem de uma ambulância. Quando tentamos fechá-la novamente, a polícia não deixou. Eles foram algemar um menino no chão e eu tentei impedir”, conta. O rapaz afirma que um policial o atacou com um cassetete: “Fui imobilizado com o cassetete e arrastado até uma moto, onde me algemaram. Depois, fui encaminhado para a delegacia e fui intimidado. Dois outros jovens foram presos no mesmo momento e os policiais e o delegado nos ameaçavam”, completa. O jovem teve o apoio de seu pai, que foi à delegacia onde estava apreendido e de outros manifestantes. Para ele, a truculência só reforça o movimento e a união dos manifestantes.
A Súmula 11 do Supremo Tribunal Federal (STF) afirma que o uso de algemas só deve ocorrer em caso de resistência e receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia. O que, na opinião de Alves, passa longe do que aconteceu em São Paulo. “São jovens que não estavam comentendo crimes, mas se manifestando pacificamente em vez de traficar ou fazer atos de violência”, relata.
Segundo Alves, a atitude da polícia militar se configura como um crime com pena de detenção. “O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) afirma que crianças e adolescentes não podem ser submetidos a vexame ou constrangimento”, questiona.
Casos de tortura
O MNDH pretende recolher todos os casos de abuso policial contra jovens e levar as denúncias em bloco para a Ouvidoria da PM. “Nós vimos a atuação da polícia jogando bombas de gás lacrimogênio, espancando estudantes. Alguns casos podem se configurar, inclusive, práticas de tortura em adolescentes”, denuncia.
O advogado explica que a tortura ocorre quando alguém é submetido a um intenso sofrimento físico e psicológico. Sobre o ato dos jovens, Alves defende que os estudantes estão exercendo um direito de manifestação e protagonismo juvenil.
Confira a nota da SSP na íntegra:
“A PM interveio quando os manifestantes desrespeitaram a Constituição Federal, deixando de realizar o prévio aviso sobre os locais onde iriam atuar e bloqueando integralmente as grandes vias de acesso, de maneira a impedir o legítimo direito de ir e vir de estudantes e trabalhadores. A SSP atuou para impedir que haja dano ao patrimônio, seja público ou privado, incitação de crime ou tumultos e badernas nas ruas, que prejudicam o acesso de milhões de paulistas ao trabalho. A Polícia Militar acompanhou os protestos para resguardar a integridade física de todos os cidadãos e o direito à manifestação.”
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