Diário da política; paralelos entre Lava Jato e DOI-Codi

Ditadura 
À medida em que chegam notícias da Operação Lava Jato descubro mais paralelos entre seus métodos e os das operações clandestinas do DOI-Codi – Departamento de Operações Internas, sediado nas dependências do 2º Exército, em São Paulo – nos anos 1970.  O DOI-Codi também baseava suas investigações na delação premiada, apesar de não haver essa denominação. Os presos mais importantes, aqueles que teriam mais informações a dar, depois de bastante torturados por vários dias eram convidados pelos torturadores a “colaborar” ou seja, entregar seus companheiros ainda em liberdade e incriminar ainda mais os que já estavam presos. O cara que ficou preso comigo no X-5 da Rua Tutóia, importante dirigente da APML (Ação Popular Marxista-Leninista) recebeu e não topou o convite. Mas muitos toparam. Viraram “cachorros”. Levavam a polícia aos “pontos”. Entregavam “aparelhos”. Muitos foram presos, torturados e assassinados por causa dessas delações. Como prêmio os traidores recebiam regalias como a liberdade, pois estando livres poderiam ajudar a prender mais “subversivos”. Hoje, como naquela época, qualquer indício, por menor que fosse valia como a prova suprema. Minha prisão é um bom exemplo. Eu não era filiado a nenhum grupo subversivo, apesar de ser, é claro, contra o governo. Mesmo assim fui preso porque os meganhas estavam seguindo um amigo meu, cuja irmã era da ALN (Aliança Libertadora Nacional). Como eu andava muito com ele, passaram a me seguir também e assim descobriram meu endereço. Isso foi suficiente para, no começo da manhã de 4 de setembro de 1973, eles terem montado uma operação para me sequestrar de pijama e chinelos, desferindo socos no meu estômago e com duas metralhadoras apontadas para mim. Quando cheguei no DOI-Codi, o chefão disse que eu era o “Hippie da AP” e eles iriam provar isso no decorrer da minha estadia. As provas que eles tinham contra mim eram três publicações apreendidas na minha biblioteca: “Maravilhas do conto russo “ (coletânea de autores russos do tempo do tzar), um exemplar da Revista da Civilização Brasileira e um jornalzinho do DCE da USP. Com isso justificaram minha permanência naquele inferno por 45 dias, durante os quais não me torturaram por absoluta falta de tempo, pois as celas estavam lotadas com presos mais importantes do que eu. Também me arrisquei a escrever um bilhete para casa. Mas eu não tinha, como Marcelo Odebrecht papel e caneta. Tive que improvisar. Desenhei com o dedo no que restou de comida na vasilha de vidr que eu tinha recebido de casa duas palavras: “sou inocente”. Embrulhei a vasilha no jornal em que a recebera, torcendo para o carcereiro não desembrulhar e me pegar no pulo, e como castigo me mandar para o pau-de-arara. Ele não abriu. Meus pais leram a mensagem.


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