Quem já perdeu bagagem numa viagem internacional, e nunca mais recuperou o conteúdo, pode ir à Scottsboro, no Alabama. Essa cidadezinha insuspeitada, onde não há sequer um aeroporto de bom tamanho, recebe toda mala encontrada em aviões e cujos donos não são indentificados. Ali no meio do nada está o monumento Túmulo da Samsonite Desconhecida, ou como é chamado oficialmente: “The Unclaimed Baggage Center”. Alguém pode perguntar: “Mas porque escolheram Scottsboro, no Alabama?”. Ao que respondo: “Aquilo que chega a este local deve estar mesmo para lá de perdido”.
A não ser, é claro, se for um cara esperto. Os que fazem a peregrinação a esse fim de mundo podem comprar qualquer um dos objetos pessoais que já foram de outra pessoa. Isto porque o Unclaimed Baggage Center mantém uma super loja de 13.500 m2, onde se vendem desde aparelhos eletrônicos, até peças de arte e artigos dos mais inimagináveis. Por exemplo: recentemente um senhor arrematou uma armadura medieval. Como foi que alguém conseguiu perder uma lataria daquelas, do tamanho de um fusca? Foi para o depósito também, material altamente tecnológico que pertencia à NASA. Este, no entanto, voltou aos proprietários originais. Menos sorte recaiu sobre uma múmia humana, que ainda estava no mercado até o mês passado, mas foi mandada para um museu em Montgomery, a capital do Estado.
No fim do ano passado, uma mulher comprou uma boneca Barbie por US$ 5 e encontrou, escamoteados debaixo do vestidinho, US$ 500 em notas de US$ 100. Ou seja, o brinquedo tinha mais volume na calcinha que o terrorista da cueca. Logo depois dessa transação afortunada, um sujeito adquiriu um quadro pelo valor e US$ 60. Descobriria nos dias seguintes que a obra é avaliada em US$ 20.000. Foi o que bastou para transformar a pacata Scottsboro no ponto que mais atrai turistas no Alabama. Há uma corrida ao tesouro, com um milhão de novos artigos sendo acrescentados ao estoque a cada ano.
Fico tentado a dar um pulo naquelas plagas, só para ver se consigo encontrar uma mochila que perdi em 1994, voltando da República Dominicana. Dentro dela só tinha roupas sujas e uma agenda eletrônica Casio. Valoroso mesmo eram dois números de telefone que nunca mais obtive. Um deles era o do secretário particular do Papa João Paulo II. Com a morte de Sua Santidade, essa relíquia já era. Mas o outro era da atriz Isabella Rossellini, em Paris, onde ela ainda mantém o mesmo apartamento. E este, eu fico furioso de ter deixado para trás. Não que fosse dar uma ligada para la bela Isabella e a convidar para uma birita no Le Fumoir ( 6 rue de L’Amiral Coligny), o café parisiense mais maravilhoso. Meu temor é que algum redneck (caipira americano) encontre o precioso número e fique aporrinhando a pobre madame. Além do mais, ninguém que eu conhecia tinha esse telefone à disposição na caderneta.
Assim que sobrar um dinheirinho, vou para Scottsboro. Talvez ainda encontre a Casio perdida. E, num lance de ousadia, ligue para a Rossellini. Caso isso não seja possível, pelo menos posso procurar grana debaixo dos vestidos das Barbies e, com sorte, comprar uma múmia em bom estado de conservação.
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