Foto: Reprodução |
Osmar/Flash Gordon e seu companheiro, o Dr. Alexis Zarkov |
Imagine-se uma caixa de fusíveis num circuito elétrico caseiro. Com alavanquinhas metálicas que ligam a corrente. Adicione na parte baixa desse conjunto, uma barra de ferro do tamanho de um taco de beisebol. Agora, aumente as dimensões dessa máquina para níveis semelhantes aos de uma cabine que acomode uma privada em estação rodoviária. Como porta, coloque cortinas encardidas. Sobre tudo isso, estará uma lâmpada externa, voltada para cima. Aí se tem a geringonça que serve de compartimento de votação, e urna de sufrágios, nas eleições americanas de meu distrito, o 28º, em Nova York.
Ao reclamar meu direito cívico nestas eleições, novamente senti a sensação de ter entrado como extra num seriado do Flash Gordon, nos anos 1950. Ambos os candidatos falam do “futuro”, de “modernidades tecnológicas”, mas a cabine eleitoral aponta para um passado com mecânica quase vitoriana. O eleitor americano, pelo menos aqui no norte do Bronx – residência de classe média alta, quase um subúrbio endinheirado -, entra numa máquina do tempo para decidir sobre questões do século XXI.
Votei em Barack Obama pela manhã e saí para fazer a cobertura das eleições presidenciais. Confesso que me senti numa pauta sobre as votações numa república africana de 20 anos atrás. Meu candidato promete uma revolução tecnológica capaz de colocar combustível no motor da economia americana. É bom começar pela reforma do processo que escolherá seu sucessor. Na Flórida – vi pela televisão -, uma senhora de 100 anos esperou oito horas numa fila para votar adiantado, anteontem. “As pessoas foram muito gentilíssimas: me trouxeram uma cadeira”, disse a anciã.
O restante dos eleitores do distrito cumpriu a missão em pé. Aquelas pessoas perderam algo em torno de US$ 800, cada, nessa tarefa – se calcularmos uma média de US$ 10 por hora de trabalho que deixaram de lado. Ou seja: trata-se de um imposto sobre a votação. Igualzinho àquele do início da democracia americana, quando só quem tinha dinheiro poderia escolher seu governante. No sul do país, essa taxa eleitoral continuou até meados dos anos 1960, como esquema racista para afastar negros que tinham direito ao pé da letra, mas não de fato.
As fraudes e maracutaias para afastar a tigrada das urnas continuam a todo vapor (e por vapor imagine-se as máquinas de votação, mesmo as eletrônicas, que devem funcionar à lenha). Dos estimados 130 milhões de eleitores neste dia 4 de novembro de 2008, garanto que, por baixo, 5% ficará a ver navios. Não se sabe se o ex-presidente Carter – que gosta de observar condutas eleitorais em outros países – estará de olho nas juntas americanas. Caso esteja – o que duvido – poderia recomendar aos compatriotas que fossem dar uma espiada nos pleitos brasileiros. Os jornais daqui gostam de mostrar urnas sendo transportadas via canoa pelo Rio Amazonas. Dão fotos de índios indo depositar cédulas em caixas de madeira acomodadas em casas sobre paliçadas nos rios. Mas o fato é: a maioria dos brasucas cumpre seu dever cívico em máquinas de votação que parecem fliperamas. Ignorantes incluídos. Não se sabe de grandes escândalos de fraudes – ainda que, imagino, existam. Mas no final das contas, o Brasil faz eleições, com primeiro turno e returno, de modo muito civilizado.
Aqui, nação que mandou homens à lua e máquinas aos mais distantes cantões do Universo, a gente vota em geringonças imaginadas por Júlio Verne.
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