Quando desembarquei pela primeira vez em Nova York, em 1978, um copo de café custava 50 centavos. É verdade que não era como o cafezinho brasileiro, mas sim uma infusão aguada contendo um resquício de rubiácia e bastante chicória (aquela planta mais amarga do que flagrar a mãe na zona). Era quase impossível de se achar um expresso do bom. Mas, em compensação, servia-se um balde da beberagem nativa. Morei na cidade no início dos anos 1980, e o preço do produto permaneceu inalterado. Hoje em dia, a coisa virou do avesso: uma xícara – servida a conta gotas – sai por, no mínimo, US$ 1.25. Um “doppio” (que deveria ser “simplíssimo”) vai para US$ 2.20, e há quem cobre US$ 4.00 por dosagem que pode ser consumida em dois goles. É verdade que não é chafé, o líquido vem tão grosso que dá para comer de colher, e o serviço agora é feito todo em um dialeto italiano. Essa mudança pode ser creditada à cadeia Starbucks, que brotou no mundo como cogumelos depois da chuva.

Após ter saturado o mercado com cafezinhos ao preço de champanhe, a empresa originária de Seattle, no Estado de Washington, agora parte para a ocupação dos lares americanos – e quem sabe, do mundo. Estão lançando um café solúvel que juram ter o mesmo gosto daquilo que servem nas lojas pretensiosas. Duvido disso, mas acho uma boa essa jogada. Afinal, quem faz um cafezinho em casa não tem de ir à loja da Starbucks falar obscuro dialeto italiano. É capaz de que a onda force o fechamento das 18 bilhões de lojas da marca na ilha de Manhattan. Seria bom caminhar pelas ruas e ver novamente vitrines de sapateiros, alargadores de gravata, fabricantes de armadilha para caçar baratas e outros estabelecimentos que marcavam o cenário de uma cidade que era uma autêntica colcha de retalhos culturais. Com a invasão das cafeterias de Seattle, esse panorama mudou.

Outro benefício agregado nesse lançamento do faça-você-mesmo será o despejo daqueles ociosos que ficam o dia todo nos Starbucks com seus computadores, navegando na internet em busca sabe-se lá de quê. O freguês entra na casa, pede um “Vente latte, macchiato, que-me-ne-frego, porca pipa, skin milk with little foam”. Depois de todo esse latim, tenta sentar-se para consumir a obra bizantina, e… não tem uma única cadeira para sentar. Estão ocupadas por desocupados. Tem muita gente que faz dali a sua sala de estar, convidando familiares e amigos para tertúlias intermináveis. Outros, dispensam as bibliotecas ou escritórios caseiros, e vão fingir que estudam, num boteco apinhado de gente hipercafeinada. Está mais do que na hora do despejo dessa escumalha.

O Starbucks que vi no Brasil tinha segurança na porta. Um tremendo leão-de-chácara, de terno preto, e olhando feio. Um amigo me explicou: “É que aqui é chic tomar café neste lugar. Só vem gente fina, metida a grã-fina. Aí vira chamariz para assaltos. Por isso colocaram segurança”. Esse esquema elitista, pelo menos, deixava grande sobra de assentos. O lugar estava às moscas, exceto por duas peruas com bolsas Vuitton falsificadas. Mesmo assim, fomos tomar nossas médias na padaria, que, com dois pães com manteiga na chapa, saíram por 1/3 de um “doppio”.


Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.