Lá vem o tal de Halloween encher o saco da gente outra vez. Todo ano é a mesma história: uma criançada infernal tocando a campainha e exigindo doces. Aqui, quem não atende a porta, arrisca a vê-la lambuzada com gemada. Os monstrinhos tascam ovos na casa dos ausentes. E desenrolam quilômetros de papel higiênico nos jardins, deixando as árvores parecidas com múmias. O jeito é encher um cocho com chocolate e esperar que os donos das mãozinhas afoitas sejam breves. Com sorte, terão urticária no primeiro dia de novembro.

Quem foi que bolou essa trama diabólica? E o pior é que, com a globalização, o martírio espalhou-se pelo mundo. Fiquei surpreso quando soube que macaquearam a festa no Brasil. Afinal, a gente já tem carnaval, festa caipira, dia de Cosme e Damião, e outras oportunidades para se fantasiar e comer guloseimas. Dizem que aí – ao contrário daqui – a coisa é menos punk. Não tem essa de fazer omelete na entrada da casa dos outros. Garanto que é só uma questão de tempo para algum espírito de porco importar o método americano.

Mas se é para seguir todos os costumes do Halloween original, o justo é que se incentive também a participação de mocinhas bem fornidas. Aqui, as jovens vêm atrás de docinhos. Chegam vestidas de enfermeiras com sainhas curtas, empregadas francesas de fotos pornográficas, diabinhas a la pomba-gira, dominatrix, e toda sorte de fantasias sexuais. Algumas mamães que acompanham os filhinhos menores também entram na balada. É de se pensar em dar milk shake para o moleque e oferecer um martini à sua progenitora. As meninas menores são isca de polícia, mas as coroas estão no baile, não é mesmo?

Neste ano, a moda do vampiro atingiu paroxismos. A fantasia sempre esteve entre as mais vendidas, mas agora a coisa entrou em escala de indústria chinesa. Não sei o que provoca essa mania com sanguessugas. Na televisão, tem dúzias de seriados com homens-morcegos, crianças em dieta hematológica e animais domésticos híbridos filostomídeos. Chegou-se a um ponto em que se Drácula pintasse no pedaço, seria declarado rei dos Estados Unidos. Em Nova York, pelo menos, a gente está acostumado: todo mundo anda de preto e tem olheiras. Mas o que dizer daqueles manequins de funerária perambulando pela ensolarada Miami?

Acho que o Halloween tem muito a ver com esse espírito mórbido. A tigrada sai fantasiada, come doces, e aí não quer mais parar. Em dezembro, ainda se verá Manés usando máscaras do Bernie Madoff e do Dick Cheney – as campeãs de vendas em 2009. Dick, diga-se, vem liderando a tabela há nove anos e, ao que tudo indica, sua carantonha seguirá saindo bem. Ele, sabe-se, não morre nunca. Fica lá no tal local secreto habitual, tocando órgão e afogando uns pobres diabos na banheira. Pensando bem, deve ter sido o ex-vice-presidente quem inventou o Dia das Bruxas. Só que, a princípio, distribuía maçãs envenenadas. Hoje, quem o achar, receberá choques elétricos.

Assim como o velho Dick, vou me preparar para a festa. Já colei uma foto de meu sogro na porta. Isso deterá os pequenos glutões. Vestirei um smoking, numa tentativa de fantasia de James Bond. Terei uma coqueteleira na mão, para oferecer martinis às mamães. Shaken, not stirred.


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