Inventaram em Nova York a “Lavagem da Rua 46”. Não, a tal lavagem não se refere aos alimentos servidos por alguns restaurantes da famosa via. Trata-se de evento inspirado pela tradicional “lavagem das escadas da Igreja de Nosso Senhor do Bonfim”, a festa baiana. Lá, como cá, umas mulheres vestidas de mães-de-santo jogam água-de-cheiro no piso e esfregam com gosto. O evento soteropolitano homenageia Jesus. O americano, que precede o Brazilian Day, em setembro, é laico. É claro que algum espertinho já deve ter estoques de fitinhas Memory of Our Lord of 46th Street. Algo à imagem e semelhança do amuleto “Lembrança de Nosso Senhor do Bonfim”. A cópia, aposto, será feita de plástico, na China. Mas o que importa mesmo são as intenções de purificação.
E a Rua 46 precisa mesmo disso. Para começo de conversa, foi rebatizada de Little Brazil, nome adotado por exatos 46 brasileiros que por ali fazem seu ponto. Ninguém mais chama de Little Brazil o corredor entre a 5th Avenue e a 6th Avenue (que tem um apelido que não pegou: Avenue of Américas). Quem sabe os bons eflúvios da faxina inspirem os nova-iorquinos a reconhecer a mudança da denominação do endereço. Porém o mais importante é mesmo a questão de higiene do território. Como todas as calçadas de Midtown Manhattan, aquelas da 46 são mais imundas do que trilha de porco. A primeira impressão visual é a de que se está caminhando sobre uma tela do pintor Jackson Pollock. O que tem de manchas e pintas, não está no gibi. É que os transeuntes mascam chiclete e cospem a gosma no pavimento. O produto imediatamente é pisoteado, grudando nas solas de sapato de incautos e no chão. Para limpar aquilo, será preciso que a ala das baianas use espátulas, muito Omo, cândida, 2.500 vassouras e muita água. Lembre-se de que o uso da água está controlado pela turma ecologicamente correta. A coisa pode dar em protesto do Greenpeace.
Como parte do evento Brazilian Day – um festival de fim de semana com música, barracas de alimentos e muita dança – a “Lavagem” está mais para prévia de um Dia Lusitano. Ora, pois! Os gajos vão lavar a rua antes da festa, ó pá!. Depois dizem que os portugueses é que são parvos. A baianada deixa tudo limpinho e vem o povão emporcalhar o território. O justo seria que Nosso Senhor da Rua 46 mandasse graças divinas para os garis do New York Department of Sanitation – os lixeiros locais. São eles que vão fazer a verdadeira faxina. O melhor é já ir chamando o Departamento de Vias Públicas, pois o arrasta-pé – a exemplo do que se viu no passado – gastará o chão. Terão de cimentar as calçadas novamente. Sabe lá o que são mais de um milhão de brasucas e afins dançando axé das nove da matina até as nove da noite? Até os policiais destacados para a segurança do reboliço – irlandeses de cintura duríssima – mexem, remexem, sacodem as cadeiras, reviram os olhinhos dizendo: “Eu sou filha de São Salvador”.
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