Estou fora do Facebook

Costumo dizer que “de graça, não escrevo nem obscenidades em porta de mictório público”. Afinal, até Shakespeare escrevia por dinheiro. Não que me compare ao bardo, mas acredito em seu modelo econômico. Esta coluna, por exemplo, está sendo paga – e muito bem paga – pelo departamento financeiro da Brasileiros. Do contrário, eu estaria passando meu tempo na procura de carros clássicos e exóticos, nos classificados da internet. Atividade, aliás, que é minha verdadeira vocação. Não tenho grandes gastos com isso, uma vez que nem sonho em comprar os veículos que descubro. Por mais que esta publicação me recompense, hoje em dia não dá para arrebatar “Clássicos & Exóticos” de qualquer espécie, com salário de jornalista.

É claro que não sou radical: já escrevi a troco de nada para publicações de amigos. A intenção era dar uma força na empreitada de malucos que arriscam o próprio dinheiro em tentativas de criação de veículos de imprensa. Mas, caso essa colaboração ameaçasse ganhar caráter constante, eu mandava a conta. Uma ajuda, quando envereda pela assiduidade, vira trabalho que merece remuneração. Aí, são outros 500, ou 250, ou 100, ou quanto der para arrancar.

Essa ladainha acima deve servir de explicação para todos aqueles que me enchem o patuá recomendando minha entrada no Facebook. Àqueles que dizem: “O Facebook é uma ótima ferramenta”. Para mim, “ferramenta” é martelo, alicate e chave de fenda. Não vou ficar dando detalhes de minha vida para gente que não conheço, ou para amigos com quem mantenho correspondência ou conversas telefônicas. Note-se a inocuidade dos chamados “perfis” contidos nas páginas de indivíduos. A que me serviriam? As pessoas que me conhecem já sabem do meu currículo. Já aqueles aos quais não tive o prazer de ser apresentado, serão informados de minha ficha pregressa quando nos encararmos no mundo real.

Além disso, o que eu diria em minha página? Que tem um Porsche 914, ano 1975, com motor 2.0 e sem muita ferrugem, em Tucson, no Arizona? Ou que é impossível encontrar um Barracuda 1973 em bom estado, por menos de US$ 40 mil? Por que cargas d’água esses meus conhecimentos, duramente conquistados, deveriam ser repartidos gratuitamente?

“Ah! Mas na era da internet, a informação tem de ser livre”, dirão asnos de diversas colorações. Trata-se de uma confusão criada propositadamante por gente que não quer pagar pelo trabalho alheio. A palavra free, em inglês, tanto pode significar “livre” como “gratuito”. Originalmente, o free da informação tinha o sentido de “sem censura”- conceito esse que já vimos ruir em vários países, como a China e mesmo o Brasil. Não era para evocar gratuidade. Atente-se para o detalhe de que a conexão da rede não é de graça, já que as pessoas pagam contas de luz e de acesso.

Vão dizer que a filiação e as atividades do Facebook são gratuitas. Estão errados. Leiam (de graça) a matéria de Daniel Lyons na revista Newsweek (www.newsweek.com/id/238371). Sob o título “Who Need Friends Like Facebook” (Quem Precisa de Amigos como o Facebook), ele destrincha o modus operandi da empresa. Trata-se de um tremendo conto do vigário, em que a privacidade das pessoas é mandada às favas. A empresa vende seus dados pessoais – que mentirosamente diz manter sigilosos – para anunciantes que pagam fortunas para saber que tipo de pasta de dentes, calcinha, relógio, carro, e outros bens de consumo, você prefere. E Daniel dá tiro certeiro ao dizer: “Você não é um freguês do Facebook, você é inventario”.

Tem gente que não se importa em ter sua privacidade exposta à curiosidade de empresas. Parece haver uma busca desenfreada por reconhecimento, pela saída do anonimato. Talvez seja por isso que escrevem gratuitamente. (O que me leva a sempre perguntar: “De que vive essa gente? Como fazem para ganhar dinheiro ?”). Entenda-se que a turma de blogueiros, por exemplo, deve sua existência à grana preta que as empresas da imprensa pagam para colher informações. Segundo o instituto americano de pesquisas Pew Research Center: “99% das redes sociais, dos blogs ao Twitter, são dependentes do material produzido pelas mídias tradicionais, como jornais e emissoras de televisão”, como publicou a Folha de S.Paulo, em 25 de maio.

Ou seja: uma relação parasitária que, no entanto, não caracteriza “jornalismo”, já que essa atividade é resultado, fundamentalmente, de reportagens. O resto é palpite. Como, aliás, esta coluna.


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