A roupa faz o rei. Sabe-se disso, desde que o dinamarquês Hans Christian Andersen escreveu o conto sobre os trajes invisíveis de um presunçoso monarca e seus súditos idióticos, em “O Rei Nu”. As indumentárias do Poder são, portanto, reveladoras. Não é para menos que já foram usados oceanos de tinta nas crônicas sobre guarda-roupas de governantes. E os Estados Unidos, claro, estão na linha de frente desta crítica de moda – superados apenas por franceses e italianos, para quem estes assuntos são considerados questões de segurança nacional.
Causa pouca espécie, portanto, o fato de que aquilo que cobre os corpos dos candidatos Barack Obama, John McCain, Joe Biden e, principalmente, Sarah Palin mereça atenção parelha com as questões sobre a Economia, por exemplo. Os óculos japoneses de Palin são, agora, assessórios du jur entre americanas de carteiras esvaziadas. Os vestidos de Michelle Obama – a esposa do democrata – também estavam saindo mais do que pão quente dos cabides de lojas de departamentos baratas.
Finalmente, depois do terceiro e último debate presidencial, entrou-se na análise dos nós de gravatas – de perfis tão distintos entre os rivais, quanto seus princípios ideológicos. O especialista em fashion da revista Newsweek, Tony Dokoupil (nome, diga-se, apropriadíssimo para quem milita na área), postou no site do semanário, comentários sobre o assunto, sob o título “Political Ties”(veja aqui). Apontou, corretamente, que McCain manipula um nó Duke de Windsor – o qual aperta com gusto para torná-lo menor, implicando ares de rebeldia. Também notou que Obama foi ao encontro envergando – e geralmente prefere – o nó Four-In-Hand, velha amarração popularesca inventada por um condutor de carruagem britânico.
O texto de Tony esgota o assunto dos nós e é leitura recomendada para quem, como eu, ainda acredita que a gravata é indispensável ao cavalheiro. Mas, nada se falou sobre a estamparia, por exemplo. De que adianta um perfeito Windsor – com direito à covinha – se ele é dado numa faixa de pano que tem como motivos caretas do Mickey Mouse? Ambos candidatos, espertamente, preferiram as listras abaixo dos respectivos colarinhos. As riscas costumam ser menos insossas que a ausência completa de grafias, e mais circunspectas do que as “polka dots”- as pintas múltiplas.
McCain teve menos sorte em sua escolha: agrupamentos irregulares de listras brancas sobre fundo azul marinho. Trata-se, a princípio, de uma corruptela do padrão chamado de Regimental (adotado entre militares do Reino Unido como indicativo do regimento a que o portador pertenceu). Teria sido boa escolha, para um homem que serviu à Marinha americana, não fosse o fato de que os traços nada têm a ver com qualquer armada. Ou melhor: parecia mais com a estamparia de gravatas ostentadas por mafiosos dos anos 30, 40, e 50.
E aí complica-se o quadro. Todo o traje de McCain, desconfia-se, foi arrancado do guarda-roupa de um filme de gangster da época. Seu rosto deformado pelas torturas sofridas no Vietnã, e os ataques do câncer, sobrepostos ao terno escuro “risca de giz”, e a assessoria do anelão na mão esquerda, o transformaram numa caricatura de Al Capone. Os esgares, piques de fúria notória, em sua fisionomia, reviveram a figura do “Scarface”. É uma pena, pois o homem não é um monstro, nem bandido – ainda que cause medo. Obama é quem fez política em Chicago, mas foi McCain aquele que mais incorporou o espírito dos malfeitores locais. No debate de quarta-feira, 15, teria sido melhor se o candidato estivesse nu.
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