
No comando do pelotão de fuzilamento, o oficial francês se aproximou das duas freiras que ladeavam Mata Hari, a dançarina que colecionara admiradores e tinha sido condenada por espionagem a favor da Alemanha. Ele levava um pano branco nas mãos. “A venda”, disse às freiras.
Mata Hari perguntou de imediato: “Preciso usar isso?”. O oficial francês respondeu secamente: “Se madame prefere não usar, não faz diferença”. Pouco depois, olhando fixamente para os 12 militares que dispararam em sua direção, a dançarina cambaleou e dobrou-se sobre os joelhos dobrados.
A descrição é do jornalista britânico Henry Wales, que cobriu o fuzilamento em Vincennes, no entorno de Paris, pela agência americana International News Service. Segundo Wales, Mata Hary não caiu diretamente para frente ou para trás, como “atores e estrelas de cinema em movimento” costumam interpretar pessoas baleadas.

Mata Hari era, na realidade, Margaretha Gertruida Zelle. Filha de um comerciante, nasceu em 1876 na cidade holandesa de Leeuwarden. Depois de casar-se com um capitão do Exército, ela viajou para o sudeste asiático com o marido, destacado para servir em Java, a principal ilha da Indonésia.
Na época, Java integrava o império holandês e Margaretha não demorou a mergulhar na cultura da ilha, repleta por templos hindus. O casamento desandou poucos anos depois e, ao embarcar de volta para a Europa, Margaretha se reinventou como Mata Hari, dançarina javanesa.
Nos palcos, ela fez sucesso desde a estreia em Paris, em 1905, quando apresentou o exotismo oriental à Europa. Nas altas rodas, ficou conhecida por envolver-se com homens poderosos, de diferentes países. Durante a I Guerra Mundial, acabou acusada pela França – a cujo serviço de inteligência chegou a se engajar –, de espionar para a Alemanha.
Até hoje o julgamento é considerado controverso. A antropóloga americana Pat Shipman, autora do livro Femme Fatale, publicado em 2007, se alinha entre os pesquisadores que questionam a condenação, divulgada com estardalhaço pela imprensa da época.
Shipman defende que Mata Hari foi usada como bode expiatório, para desviar o foco da opinião pública sobre as derrotas do Exército francês no front. Faz sentido.
