Façam suas apostas

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Svetlana Alexievich – Foto: Reprodução

Não deixa de ser engraçado pensar que alguém pode ficar rico à custa de uma obra literária que não escreveu ou sequer leu. Pois todo ano isso acontece, especialmente na Inglaterra, onde se aposta até em qual vai ser a cor dos olhos do filho da princesa.

No caso do Nobel de Literatura, cujo anúncio se dá nesta quinta, o ranking das apostas acaba sendo um termômetro mais ou menos confiável de quem são os favoritos. Um pouco como é o Globo de Ouro para o Oscar, mas menos, já que o Nobel tende a idiossincrasias. Proust, Kafka, Joyce, Guimarães Rosa e Borges, por exemplo, não o ganharam. Pode-se argumentar, em defesa do Nobel, que nem sempre é fácil reconhecer uma obra-prima que vai mudar a cara da literatura no momento em que ela é lançada, ou mesmo nos anos seguintes.

Outra dificuldade na auscultação do pulso do Nobel de literatura, é que às vezes ele vai parar em mãos menos conhecidas (e não, necessariamente, menos talentosas),o que é salutar, pois corrige, ao menos em parte, a distorção de vivermos num mundo anglocentrado, no qual apenas autores de língua inglesa são mundialmente famosos (Octavio Paz e Mario Vargas Llosa são exceções que confirmam a regra). De que outro modo conheceríamos a sensacional Wislawa Szymborska, poeta polonesa, vencedora em 1996? Ou mesmo o sueco Tranströmer, laureado em 2011?

E ainda há o aspecto político, que às vezes direciona a escolha do prêmio, no sentido do “correto”. Mas vamos aos favoritos, de acordo com a Ladbrokes, conhecida casa inglesa de apostas. Lembrando que a Academia Sueca recebe indicações de intelectuais e instituições do mundo todo, tendo feito uma seleção preliminar de 198 candidatos, a qual reduziu para cinco. E o segredo em torno destes cinco nomes é sepulcral; dizem que dá até morte para quem o revele.

1 – Svetlana Alexievich. A maior favorita é uma jornalista bielorrussa de 67 anos sem livros lançados no Brasil. Ela é conhecida por reportagens bastante pessoais de momentos críticos na história soviética, como em  Zinky Boys, sobre a guerra no Afeganistão, e Voices from Chernobyl. Apenas sete mulheres ganharam nos últimos 25 anos. Nesse mesmo período, nenhum prêmio foi para algum autor da Rússia ou países da antiga URSS. São circunstâncias que explicam, em parte, seu favoritismo. Ano passado, a New Yorker fez um bom texto defendo autores de não-ficção, em especial Svetlana. 

2 – Haruki Murakami. Essa seria uma escolha pop, que agradaria o mercado e os milhares de fãs do autor japonês. Mas popularidade nunca foi um fator decisivo para  Academia Sueca – um bom exemplo é o vencedor do ano passado; ainda que famoso na França, Patrick Modiano é bem pouco conhecido nos EUA, principal centro editorial no mundo.

3 – Ngugi Wa Thiong’o. Torço por ele. Não apenas por ser negro e africano, algo raríssimo entre os vencedores do Nobel de literatura (o nigeriano Wole Soyinka ganhou em 1986), mas porque sua prosa é fortíssima, como atestam os dois livros recentemente lançados no Brasil, Um Grão de Trigo e Sonhos em Tempo de Guerra (ambos pela Biblioteca Azul), após sua passagem simpática na última Flip.

4 – Philip Roth Supermedalhão, está sempre entre os favoritos. Provavelmente vai ganhar em algum momento. Pode ser agora. Merece. A seu favor, além do talento indiscutível, está o fato de que os EUA não emplacam um autor no Nobel desde Toni Morrison, há 22 anos.  

5 – Joyce Carol Oates. Gosto muito dela, mas seria uma surpresa se ganhasse. Está mais ou menos na mesma categoria “pop” do Murakami, ainda que eu ache ela melhor.

6 – John Banville. Grande estilista, também sempre lembrado, é irlandês como os poetas Seamus Heaney (vencedor em 1995) e W.B.Yeats (vencedor em 1923), Bernard Shaw (em 1925) e Samuel Beckett (em 1969), e outros que nunca ganharam o Nobel e mais que mereciam, como Joyce, Synge e Oscar Wilde.

7 – Jon Fosse. Dramaturgo norueguês desconhecido do público brasileiros, assim como Alexievich. Também como ela, parece muito interessante. Estão pagando 14 por 1, caso vença (pela favorita a relação é de 5/1).

8 – Adonis. Essa seria uma bela escolha, pois uniria enorme talento e circunstância política. Sírio, ele é tido como o maior poeta de língua árabe – e realmente seu poemas, lançados aqui numa coletânea pela Companhia das Letras, são belíssimos.

9 – Ismail Kadaré – Surpreendentemente, o romancista albanês tem muitos de seus livros editados por aqui (Companhia das Letras). E há tempos. É excelente! Como o turco Pamuk (vencedor em 2006), combina história e ficção de maneira cativante.

10 – Ko Un. Uma incógnita (e como toda incógnita, muito interessante). É poeta sul-coreano.

Em 15º, pagando 25/1, está o húngaro Laszlo Krasznahorkai, que venceu recentemente o Man Booker International Prize. Seria muito legal se ganhasse. Dele, li Satantango, ainda sem tradução. Foi uma experiência marcante.


Comentários

2 respostas para “Façam suas apostas”

  1. Uma lista interessante. Acho que pode mesmo ser o ano do Adonis – até pela questão política e tudo mais.
    É uma breve correção: o Fosse é norueguês, não russo.

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