Coluna_header_ topo Auro Danny Lecher
Neil Armstrong, 38 anos, comandante da missão Apollo 11, pousa suavemente a pequena nave Eagle às 16 horas e 17 minutos do dia 20 de julho de 1969 no Mar da Tranquilidade. Praticamente um beijo, um selinho entre o homem e o universo. Esta cratera nupcial de sugestivo nome está localizada nas coordenadas 0,8 N, 23,5 E da única face que nos é visível da Lua.

Muito intrigante: por que ela sempre nos mostra apenas um lado do seu corpo? Teria algo a nos esconder? Sempre foi assim desde que a Terra e a Lua existem. E pelo jeito, parece que continuará sendo assim para sempre. Os astronautas precisam nos contar o que afinal existe no Reino de Lilith, quando orbitam The Dark Side of the Moon. O que eles viram e não falam?

Mais de 6 horas depois, às 22:56, Neil abre a escotilha da Eagle e vislumbra a luz do Sol insinuando-se no horizonte lunar. Ao botar a sua cabeça para fora da nave ele entra de corpo e alma no universo infinito, prenhe de múltiplos versos. Uma epifania capaz de entusiasmar qualquer um a fazer poesia ou a brincar como uma criança galopando na Lua. Dizem as boas línguas que aquela frase tão vigorosa foi criada enquanto ele descia os 6 degraus da escada, imediatamente antes de tocar as suas botas no chão de finas partículas como um talco marrom: “É um pequeno passo para um homem e um gigantesco salto para a humanidade”.

Estava indo tudo muito bem até o protocolo do marketing político tomar a cena. Às 23:15 o Sr Braçoforte finca no solo, convicto, uma bandeira molenga dos Estados Unidos, mudando totalmente a atmosfera da história (irresistível trocadilho).

Faltou coerência! Ele manteria o encantamento se tirasse do bolso um pano com uma foto bonita da Terra.

Assim como os telhados das casas pertencem aos gatos e as árvores do meu jardim aos pássaros, talvez fosse interessante pensarmos qual outro coletivo poderia ser mais representativo. A bandeira americana é muito datada e restritiva. Um grupo de crianças brincando na praia, ao pôr do sol, com ela ao fundo, cheia, redonda, iluminada? Um selfie da Lua? A imagem de um bebê mamando no colo da mãe?

Pessoalmente eu escolheria uma bandeirola branca com a palavra LUAR bordada bem grande com linhas coloridas no seu centro. Seria uma homenagem aos 230 milhões de terrestres, pertencentes a uma mesma comunidade linguística, que com apenas uma palavra conseguem designar a majestosa luz que emana da Lua.

Uma vantagem em economia e exatidão em relação a outras comunidades: moonlight, clair de lune, mondschein, claro de luna, chiaro di luna. O substantivo é simples e o verbo, intransitivo: Eu Luo, Tu Luas, Ele Lua, Nós Luamos…

Se mesmo assim não chegarmos a um consenso sobre qual coletivo deveríamos escolher, restam ainda aqueles clássicos: os loucos, que já vivem no seu mundo, os lobos, as sereias ou o mar.

*Psiquiatra da Universidade Federal de São Paulo, psicoterapeuta e coordenador do Projeto Quixote (aurolescher@gmail.com).


Comentários

Uma resposta para “Luar”

  1. Avatar de Antonio Cintra
    Antonio Cintra

    Numa tradução livre e seguindo luar e braçoforte, sugiro (palavra japonesa que quer dizer “que tal”?) traduzir Apollo 11 por Trem das 11. Gostei muito da crônica amigo.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.