Você gosta da palavra “suposto”, muito apreciada pelos grandes jornais brasileiros quando se referem à crise política que eles mesmos criaram e alimentam diariamente?
A Folha de S. Paulo adora essa expressão, que aplica cuidadosamente para diferenciar aquilo que considera verdade absoluta das notícias que se vê obrigada a publicar, mas não quer que você acredite.
Por exemplo, nesta sexta-feira proliferam referências a manifestações contra o “suposto golpe” representado pelo processo de impeachment da presidente da República.
Na quinta-feira, noticiando uma declaração da presidente, que definiu o movimento como “golpe”, O Estado de S. Paulo acrescenta à manchete a ressalva: “(…) para juristas, sobram crimes”.
E dá-lhe “análises” de juristas alinhados historicamente com o que há de mais conservador e reacionário na longa história da Ordem dos Advogados do Brasil.
A chamada mídia tradicional cobriu diligentemente as manifestações contra o que a Folha chama de “suposto” golpe e que milhares de outros juristas qualificam como um sórdido jogo de poder fascista disfarçado de processo judicial.
O portal do Estado de S. Paulo escolheu apenas fotografias cortadas na vertical para mostrar as concentrações pelo País afora.
O midiota não se pergunta por quê, mas este blogueiro impertinente explica: porque com fotos horizontais é mais difícil esconder o tamanho das multidões – depois o Datafolha usa aquela técnica científica de reduzir o número de pessoas que defendem o governo e multiplicar o dos que se manifestam a favor do golpe.
Os advogados que se opõem a essa aventura perigosa nunca aparecem no noticiário e jamais são convidados a opinar nos intensos “debates” que se realizam no rádio e na televisão. Quando, inadvertidamente, um deles é ouvido, o apresentador trata de cortar rapidamente a entrevista, evitando que contamine o discurso predominante.
Vou contar um segredo da profissão: quando um jornalista simpatiza com alguém que está sendo acusado de qualquer malfeito, costuma publicar suas declarações e acrescentar: “explica fulano”.
Quando a intenção é condenar previamente o entrevistado, o que vem depois de sua declaração é: “alega fulano”.
Você sabe: quem está certo “explica”, e quem tem culpa no cartório “alega”.
Dá pra entender como funciona a máquina de fabricar midiotas?
Esse sistema tem como objetivo retardar ou impossibilitar a criação de uma sociedade de cidadãos aptos a decifrar as intenções da imprensa.
Nos países de língua inglesa, essa capacidade é chamada de “media literacy”.
Essa questão se insere no conceito chamado pelo filósofo e sociólogo alemão Jürgen Habermas de “ação comunicativa”, o processo pelo qual o indivíduo desenvolve e consolida sua identidade na sociedade moderna.
Para simplificar, basta entender que a evolução moral do indivíduo e, por consequência, da sociedade, acontece por uma vivência comunicativa evoluída, livre de manipulações e favorável à construção de identidades sociais mais críticas e livres.
Portanto, uma sociedade é mais evoluída quanto menos midiotas ela possui, em comparação com a quantidade de cidadãos que aprende a pensar livremente.
Você vai encontrar aqui uma dica de leitura sobre esse assunto. Trate de ler sem preconceito, e você vai poder se situar mais claramente no largo espectro que define os variados graus de midiota.
Para ler: Teoria da Ação Comunicativa e o exército de alienados.
*Jornalista, mestre em Comunicação, com formação em gestão de qualidade e liderança e especialização em sustentabilidade. Autor dos livros “O Mal-Estar na Globalização”,”Satie”, “As Razões do Lobo”, “Escrever com Criatividade”, “O Diabo na Mídia” e “Histórias sem Salvaguardas”
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