O balanço da semana traz uma lição interessante para entender como a mídia tradicional carrega a opinião do público para lá e para cá, conforme suas conveniências.
Comecemos pela pesquisa IBOPE sobre a popularidade do vice-presidente em exercício enterino do poder executivo: os chamados jornais de circulação nacional trazem comentários sobre a baixa aprovação do sr. Temer, e comparam com a última avaliação da presidente constitucional, Dilma Rousseff.
Mas há um elemento que a imprensa conservadora omite: as avaliações da sra. Rousseff foram feitas sob o bombardeio incessante da própria mídia hegemônica, e as consultas foram cuidadosamente planejadas para a coleta de opiniões mostrar a influência do noticiário negativo sobre a sua imagem.
No caso do vice-presidente em cargo provisório, há, ao contrário, uma indisfarçável tentativa de poupá-lo da enxurrada de acusações que atingem seus parceiros de golpe, o presidente afastado da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, e o presidente sempre oscilante do Senado, Renan Calheiros.
No entanto, os cuidados da imprensa não conseguem esconder o fato de que a aliança que tomou o poder com o afastamento da presidente representa o que há de pior na política nacional.
O caso do sr. Cunha já ultrapassou todos os limites do aceitável, e até mesmo o sombrio ministro Gilmar Mendes, figura destoante entre seus pares do Supremo Tribunal Federal pela ambiguidade de suas posições, tem evitado sair em sua defesa.
Mendes não se furta, porém, de justificar a tentativa do presidente do Senado de desengavetar um projeto de lei de 2009 que, na prática, coloca empecilhos a investigações de políticos, empresários e outras figuras de proa da nossa sociedade.
Com essa manobra, Renan Calheiros claramente busca legislar em causa própria, uma vez que as recentes revelações garimpadas nas delações premiadas da Operação Lava-Jato apontam para seu nome.
Também seria beneficiado o presidente da Câmara: Eduardo Cunha está sendo acusado de ser destinatário de 80% dos recursos desviados do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, por meio de um esquema que agia na Caixa Econômica Federal.
Nem mesmo o mais perfeito entre os midiotas deve acreditar, a esta altura, que o afastamento da presidente Rousseff resolveria a crise política que se instalou logo após a eleição de 2014.
Mas o grupo no poder não parece preocupado com a questão da governança: a confusão reinante ajuda a passar certa agenda perigosa sem que a sociedade brasileira seja consultada a seu respeito.
Enquanto a mídia espalha fumaça, o crime organizado se move nos bastidores do Congresso: por exemplo, está para ser votado em comissão especial da Câmara dos Deputados um projeto que libera os jogos de azar, extingue todos os processos judiciais contra bicheiros e agentes da máfia da jogatina e anistia todos os que foram acusados pela operação clandestina de bingos e cassinos.
O presidente do Senado manifesta interesse em apressar o trâmite desse trambique, mas adivinhe quem tem longa e amistosa relação com os bicheiros? – Ninguém menos que o vice-presidente em exercício. Desde pelo menos 1985, o sr. Temer tem se manifestado a favor da liberação do jogo, e atuou como advogado na defesa dos empresários do azar.
Seria muito esperar que o midiota faça a ligação de lé com cré?
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