As trombetas voltam a convocar para novas manifestações, e o Brasil corre o risco de acordar com as instituições irremediavelmente fragmentadas.
Esse é o resultado da operação que rompeu a ordem democrática ao desfazer a decisão tomada nas urnas em 2014 pela maioria dos brasileiros.
Os últimos dias registraram um embate inglório entre o Congresso Nacional e os integrantes da força-tarefa que tocam a Operação Lava-Jato.
Inglório, porque ambos os lados têm razão ao acusar os desafetos de desonestidade – e neste caso nenhum deles está com a verdade.
Embora a causa matriz da desavença seja absolutamente defensável, por se tratar de uma necessária atualização da lei de 1965 que coíbe o abuso de autoridade, há nessa iniciativa apressada um indisfarçado objetivo de blindar certas autoridades que estão na mira das investigações.
As mais reluzentes delas são o presidente do Senado e o presidente transitório da República.
Por outro lado, não se justifica que também sejam blindados os operadores da Justiça: nenhum juiz, procurador ou integrante da Polícia Federal pode se colocar acima das demais instituições em sua missão de apurar crimes de corrupção.
Acontece que os abusos nunca foram denunciados ou sequer considerados como tais enquanto a ousadia dos agentes públicos ajudava a derrubar o governo eleito nas urnas.
Apenas três meses depois de tomar posse, com a promessa de “resgatar a força da economia e recolocar o Brasil nos trilhos”, o inquilino do Planalto se vê sitiado pelos antigos aliados e vai sendo arrastado pela sucessão de escândalos rumo ao seu lugar na História: a “cesta” seção.
A mídia tradicional lança combustível na fogueira das vaidades, de olho na chance de trocar Michel Temer por alguém mais palatável e mais confiável: um prócer do PSDB paulista, por exemplo, ou, num caso extremo, o senador cearense Tasso Ribeiro Jereissati.
Há uma clara tendência dos principais jornais do País a considerar, como o juiz Sérgio Moro, que o projeto que pune o abuso de autoridades foi proposto com o objetivo de bloquear as ações da Lava-Jato.
A arriscada jogada do magistrado, ameaçando demitir-se de sua função juntamente com seus companheiros de empreitada, foi levada a sério pela mídia e serve de combustível para movimentos radicais.
Pode-se afirmar que grande parte das opiniões divulgadas nasce enviesada pelo processo de criminalização da política, que cresce como um tsunami no rastro das denúncias de corrupção.
A leitura do projeto recomenda cautela: não há sinais de incoerência no texto que prevê punições para magistrados e integrantes do Ministério Público quando suas condutas forem incompatíveis com o cargo.
Porém, pode-se interpretar a letra da proposta como uma ameaça a juízes e procuradores que extrapolam de suas funções e usam dois pesos e duas medidas conforme a ideologia ou a posição político-partidária do acusado.
Pode-se apostar que 9 entre dez leitores de jornais e telespectadores dos noticiários da TV estão opinando sem ter lido o texto, mas é certo que muitos deles sairão às ruas de verde e amarelo. Quem quiser pensar por si, leia abaixo.
Até mesmo advogados, que sofrem o risco de se tornarem irrelevantes diante das alianças entre promotoria e magistratura, têm aderido aos protestos.
O caos está instalado.
À sombra do edifício da Fiesp, na Avenida Paulista, os defensores da volta da ditadura tomam carona outra vez no carro de som dos indignados.
Para ler: O Projeto de Lei 4.850/16, onde se incluiu a punição para o abuso de autoridade.
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