Depois da política econômica, o tema sobre o qual o governo interino tem jogado mais luzes é o da política externa.
Não se trata, no entanto, de alguma ambição renovada, de alguma vontade de poder. Trata-se mais de limitação, de um redesenho tendente para o menos.
A retórica que vem justificar as novas escolhas traz variações sobre a mesma acusação fundamental ao que havia antes: a política externa de Lula e Dilma era aquela de um partido, no máximo de um governo, e nunca do Estado brasileiro.
O argumento é frágil. Deixa de explicar, por exemplo, como uma nova política externa decidida por um novo governo está livre das preferências dos novos detentores do poder e simplesmente traduz as vontades e as necessidades do Estado.
Mais inteligente, ou mais honesto, seria dizer que diferentes governos enxergam de modos diversos o interesse nacional e os caminhos de sua realização na esfera internacional.
Apenas se fossemos um país mais maduro teríamos uma percepção clara dos nossos interesses que independem de opções partidárias e que se impõem a qualquer governo. Ainda discordamos sobre o Brasil que queremos e sobre o nosso lugar no mundo.
Muito resumidamente, pode-se dizer que os governos de Lula e de Dilma queriam mais em termos de política externa. O novo governo, adotando a visão e o programa derrotados nas últimas eleições presidenciais, quer menos.
Quer menos porque praticamente restringe sua agenda ao comércio e à economia. A importância desses temas não está em disputa, e muito do que será realizado em relação a eles nos próximos tempos vinha sendo gestado nas administrações anteriores. Mas eles não podem consistir na totalidade da política externa.
Quer menos porque insiste no discurso de que ao longo dos últimos 13 anos o Brasil insistiu na integração regional, aprofundou a opção prioritária pela diplomacia sul-sul, voltou-se para a África e para o Oriente Médio e conversou com quem em princípio não é boa companhia.
Esse conjunto de críticas não decorre apenas de escolhas ideológicas diferentes das que vigiam antes, mas está profundamente marcado por uma visão do que o Brasil pode e deve ser e das possibilidades de ver o mundo e agir de modo autônomo.
E a visão é de um Brasil menor, cujo lugar no mundo depende de um alinhamento quase automático com os Estados Unidos e seus aliados e que renuncia a qualquer medida relevante de poder próprio.
O que se pode ler em algumas linhas, e em muitas entrelinhas, do novo discurso é um argumento antigo segundo o qual o nosso papel não deve ir além daquilo que nos é alocado e do que é permitido por nossas possibilidades, sempre avaliadas modestamente. Não se concebe a hipótese de ampliar as próprias possibilidades.
Isso tudo tendo sido dito, é preciso reconhecer que a opção pelo caminho alternativo, de força e de independência, ficou prejudicada sob a presidência de Dilma Rousseff por uma execução pobre, em que os meios postos à disposição ficaram aquém dos fins declarados.
Mesmo sob Lula algo da implementação daquela política externa “ativa e altiva” colocava em evidência a dificuldade do exercício. Mas era possível ousar.
Agora talvez gerenciemos com maior competência a ausência de sonho.
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